
Seu início, de imediato, e sem qualquer cerimônia, é marcado pela elaboração de uma atmosfera sonora pungente e dramática. Ainda que desfilando certo grau de delicadeza através de uma paisagem adocicadamente sintética, a canção, conforme se desenvolve, vai amadurecendo uma postura lancinantemente sofrida. É justamente nesse ínterim que ela, através da entrada de uma guitarra de pronúncia suspirante, adquire uma energia densamente etérea.
De veia rascante visceral, a canção, no instante em que entra em seu primeiro verso, tem o seu caráter dramático amplificado em uma dosagem abundantemente generosa. E isso se deve não apenas à voz de timbre grave e afinada de Sara Diana, mas, sim, essencialmente, pela forma como a cantora interpreta o enredo lírico. Fazendo com que a atmosfera transpire uma energia soturna pegajosa, a cantora soa como se estivesse à beira de uma angústia insaciável. De uma lamúria incontrolável. De um senso de desolamento tão denso que é capaz de petrificar o ouvinte.
Embebida em melismas que fazem com que a harmonia da obra atinja nuances guturais, Sara vai desfilando um sentimentalismo cada vez mais rascante a ponto de tornar a canção em um produto sangrento pela simples razão de não conseguir estancar certas cicatrizes frequentemente reabertas. De caráter melodramático e até mesmo reflexivo, Vegas convida o espectador a repensar o papel da cidade de Las Vegas. Saindo de seu espectro multicultural, o município e colocado, aqui, como o polo da busca por escapismo e por uma certa necessidade de anulação do mundo real para se permitir imergir, por algum tempo, em uma paisagem que bebe do significado mais léxico de utopia, de devassidade e de libido.