A bateria surge solitária. A introdução é totalmente dela, com sua levada suja e de cadência mid-tempo. Assim que a instrumentação entra de forma completa a partir de uma brisa, a atmosfera é tomada por uma energia melancólica e, curiosamente, nostálgica. Por entre guitarras de riffs levemente borbulhantes em seus embrionários swings, a maneira como o cantor usa seu timbre adocicadamente ácido no emprego da narrativa lírica acaba dando à obra um interessante toque lúdico, infantil.
O que chama mais atenção nesse meio tempo é, de fato, o enredo. De início, ele parece ser apenas mais uma história que narra os anseios e as fantasias de criança. Porém, conforme vai se desenvolvendo, ele vai assumindo contornos mais sérios que chegam a ter conotação de realidade. E é aí que o ouvinte se choca. Afinal, escondido por entre um escopo rítmico-melódico brando, o torpor que dele transpira vem como um artifício para fazer o cantor se esquecer, ou, ao menos, superar eventos do passado.
The Boy Who Dreamed Of The Stars é onde o Extra Time aborda uma temática urgente, não apenas séria, sobre o abuso infantil, a pedofilia. Isso mostra não apenas um certo toque de ousadia do grupo, mas também uma consciência de mundo para chamar a atenção do espectador de algo que ocorre a todo o momento de forma escondida e que é colocado como tabu nas discussões sociais.
De caráter autobiográfico, o que mais emociona o ouvinte é a maneira como a harmonia da faixa dá a entender uma espécie de diálogo com o vocalista de hoje com aquele vocalista ainda criança que sofreu nas mãos de outro indivíduo. Um cantor, hoje maduro, que anseia por uma espécie de reviver da infância como forma de mostrar, para si mesmo, que não apenas conseguiu superar, mas, talvez, perdoar o seu agressor e passar a sua história para o mundo de forma a alertar que esse evento é mais comum do que o imaginado.