Um breve chiado serve como o primeiro elemento a proporcionar a receptividade do ouvinte para um cenário em processo de nascimento. Não há, necessariamente, crueza, mas, sim, um toque acústico que invade o ambiente por meio de um violão macio e capaz, inclusive, de incitar os sensos de melancolia e nostalgia em um espectador já tocado pela delicadeza estética experimentada.
Delicada e aveludada em virtude do teclado, mas capaz de ser igualmente dramática graças ao rápido rugido de um sonar grave que parece ser proveniente do violoncelo, a canção entra em seu primeiro verso mergulhando em meio a uma atmosfera que, agora, se mostra inquestionavelmente intimista. É então que uma voz masculina aguda e afinada em seu toque açucarado entra em cena já fornecendo um questionamento que obriga o espectador a entrar em um processo de reflexão profundo.
Garantindo para si um aspecto tocante e definitivamente lacrimal em virtude da sensibilidade harmônico-melódica que se cria, Nuvens, despida de suas guitarras melodramáticas e de seu enredo sonoro emocore, agora se vê completamente nua e com o coração à vista sem nenhum elemento que o esconda.
Por meio de sua arquitetura acústica mixada por João Konzen, a canção propõe ao ouvinte um novo olhar perante o enredo lírico já conhecido. Através da união do violão, do teclado, do violino, do violoncelo e com os tilintares suaves do pandeiro assumindo a função do desenhar do aspecto rítmico de forma a fornecer agradáveis noções de um movimento mais racional, a visceralidade alcança novos patamares.
Ainda que o pandeiro, como já descrito, permita rompantes racionais, existe, no entremeio das vozes de Guto Gaelzer, Nick Motta, Guilherme Wildner, Gaba Wozniak e Rodrigo Koala que compõem o âmbito lírico interpretativo, uma de caráter rasgado que auxilia nesse processo. Afastando o espectador, ainda que brevemente, de seu torpor iminente, ela, ao mesmo tempo que emprega um novo tom ao sentimentalismo exacerbado da obra, permite ao ouvinte entender o sofrimento e não apenas divagar sobre ele.
É assim que a história de Nuvens, uma pungente narrativa que captura o duelo entre o consciente, o inconsciente, o desejo e a realidade no processo de superação do término de relacionamento. É a vontade de se ver amadurecido e já conformado com a nova perspectiva ao mesmo tempo em que o emocional ainda sofre e arde pela perda de um amor profundo. Um verdadeiro reviver do lirismo emo dos anos 2000.
O interessante é que a arte de capa assinada por Guilherme Krol imprime bem esse senso de melancolia. Apresentando um avião em sua forma semelhante ao icônico 14-Bis, a arte é adornada por um tom cinza espectral. Por meio dessa conjuntura, se percebe o anseio pela liberdade e a necessidade de superação. Contudo, evidencia-se também um estado emocional entristecido e ainda muito ligado às experiências de um passado lancinante.