Novo Amor - São Paulo 2022

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A noite estava abafada. Marcando 26 °C, a cidade de São Paulo, como de costume, estava a todo o vapor no final da tarde da sexta-feira, 09/09, como um tradicional esquenta para o final de semana. Nas redondezas do metrô Barra Funda, o Fabrique Club abria suas portas às 19h para a entrada do público de Novo Amor, multi-instrumentista galês. Ao mesmo tempo, não muito longe dali, o Espaço Unimed, antigo Espaço das Américas, abrigava um irrisório número de pessoas no aguardo do show do Måneskin.


Com os relógios marcando 19h50, o Fabrique, com sua lotação máxima de 1.200 pessoas, já estava com seu espaço visivelmente congestionado. Nesse momento, os olhares das pessoas na plateia se cruzavam em plena ansiedade para o início do show. Entre esticadas de pescoço e fotos descompromissadas na tentativa de enxergar algo diferente no palco, a tensão aumentava conforme o horário previsto para o começo do espetáculo ia se aproximando.


Exatas 20h, uma luz vermelha acende e aciona o som de sirene. As luzes do local se apagam, ficando apenas os contornos do cenário do palco reluzentes. Então, um, dois, três indivíduos iam aparecendo no palanque assumindo suas posições. Com gritos alvoroçados de uma plateia sedenta por diversão, Ali John Meredith-Lacey enfim entra no ambiente e se posiciona ao piano elétrico no centro do palanque.


Seguido pelos gritos constantes da plateia e entre sorrisos de canto de boca mostrando estar envergonhado com a reação do público, Lacey toca as primeiras notas de Opaline e alimenta ainda mais o alvoroço dos pagantes, extasiados pelo fato de o show do Novo Amor estar finalmente começando.


Transformando o ambiente em algo romântico e sereno graças à iluminação poente assumida pelo palco, Lacey foi acompanhado por luzes de celulares pinceladas na plateia, que se dividia entre fotografias e gravações desesperadas como forma de registrar o momento. Comportamento das pessoas seguiu até a duração de Utican, a faixa seguinte.


Apesar disso, o show for marcado por um comportamento majoritariamente introspectivo do público, que fora o início e o término das faixas, assumia uma postura de nítida admiração não apenas pela figura de Meredith-Lacey, mas pelas melodias que iam sendo executadas. Com brilhos nos olhares, cada pessoa aproveitava o momento da sua maneira, fosse dançando em sintonia com as músicas, gravando ou fotografando as performances, ou simplesmente namorando o palco e sentindo a experiência.


Decimal, porém, foi a primeira música a ser ovacionada pelo público de maneira diferenciada até mesmo em relação às aberturas Opaline e Utican. Entre gritos constantes vindos do público, cartazes de admiração sendo estendidos na esperança de serem lidos pelos integrantes do grupo e uma multidão balançando amaciadamente o corpo para trás e para frente, Meredith-Lacey se posicionou, de pé, afrente até mesmo do piano para executar a canção.


Com formação contando com cinco integrantes, que se dividiam entre elementos percussivos, guitarra, baixo, violão e guitarra, o show do Novo Amor contou com outros capítulos de interessante receptividade por parte dos fãs que foram muito além da performance de State Lines.


Em Carry You, houve boa resposta, mas Meredith-Lacey teve problemas com o retorno e o engenheiro de som acabou deixando os instrumentos soarem mais altos de maneira a ficarem estridentes e se sobreporem às linhas vocais. Já Keep Me foi a mais admirada em silêncio pelos fãs, que estavam com olhares apaixonados e cantarolando timidamente as frases líricas.


I Feel Better contou com um instrumental mais explosivo que, apesar de ainda ser manso, foi mais grandioso em harmonia em relação às outras músicas até então apresentadas. Repeat Until Death, por sua vez, foi marcada por um coro consistente do público e uma plateia bastante iluminada graças às marolas criadas pelas luzes de celulares que se movimentavam amaciadamente no compasso da melodia.


From Gold, uma das surpresas no set, encerrou a sequência principal de uma forma que, talvez, nem Meredith-Lacey imaginava. Com cantorias altas e bateção de palmas, o público fez da performance da faixa o momento mais memorável do show, que, dali, seguiu para o bis da apresentação.


Do álbum conjunto com Ed Tullett, o qual participou ativamente do encerramento do show, o encore foi preenchido por Alps, outra novidade do set, e Terraform, a carimbada saideira da atual turnê do galês. Foi assim, tímido, tal como no início do show, que o cantor e multi-instrumentista galês Ali John Meredith-Lacey deu por encerrada, às 21h21, a apresentação paulistana da pernada brasileira da turnê de divulgação de Cannot Be, Whatsoever, o sexto lançamento de Meredith-Lacey assinado como Novo Amor.

Apesar de ter iniciado de maneira britanicamente pontual, a performance, por parte de Meredith-Lacey, foi arrasadoramente morna. Não houve muita interação com os fãs e, nos momentos em que ocorreram, foram rápidas e sempre marcadas pela timidez do frontman e suas incessantes confissões de “I don’t understand portuguese”.


Outro importante e curioso momento foi quando o cantor se posicionou ao microfone e iniciou um rápido monólogo: “why Novo Amor, why Novo Amor? Well, I think you’ll never know” para então puxar a balada Anchor. Curioso o frontman ter questionado isso, afinal, toda a base de fãs ali presente conhecia bem as razões da adoção do nome ‘Novo Amor.


Ainda assim, verdade seja dita: Ali John Meredith-Lacey é de uma afinação e consistência vocais admiráveis. Sempre imprimindo falsetes em notas extremamente agudas, ele não se deu ao luxo de titubear ou desafinar em momento algum e se dividiu entre o piano elétrico e o violão em diversos momentos.


Outra verdade é que, apesar de todas as considerações anteriores, o Novo Amor deu a São Paulo uma performance com 19 músicas, uma faixa a mais que o habitual, e desenhou o setlist com surpresas como From Gold e Alps, faixas que levantaram ainda mais a sede do público.


Uma última, e importante, verdade, é que a banda de apoio, não apresentada, foi peça mais que importante na regimentação da engrenagem da apresentação. Sempre afiado, grandioso, dramático e, principalmente, consistente, o instrumental era de evidente e contagiante harmonia que fazia arrepiar até os ouvidos mais desavisados.


Mesmo com a maturidade e sincronia emocional dos músicos, porém, o show não teria acontecido como aconteceu se dependesse apenas da performance do frontman e de sua escassa interação com a plateia. Nesse ponto, é indiscutível o fato de que quem fez o show foi, de fato, o público.


Com faces de gratidão por estar vivenciando o momento, cada pessoa presente foi responsável por arrancar cantorias, danças e palmas que eram suficientes para mostrar a Meredith-Lacey e banda que a plateia sabia bem de sua função como peça de troca de energia. Afinal, de tantos sorrisos, olhares românticos, e cantos viscerais, o sexteto não poderia sentir outra coisa se não plenitude.


Na segunda passagem de Novo Amor pelo Brasil, no que tange a performance paulistana, a sincronia frontman-músicos estava afiada. Contudo, quem de fato fez o show foi a plateia, um amontoado de pessoas que, a todo momento, assumia olhares de admiração misturados à sua mudez apaixonada por Meredith-Lacey, o Novo Amor dos quase 1.200 indivíduos que preencheram, naquela noite abafada de setembro, o chão do Fabrique Club.


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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.