Cali - Cali (Honey Club - São José dos Campos 12/05)

NOTA DO CRÍTICO
Nota do Público 0.00 (0 Votos)

O relógio marcava 22h17. As ruas estavam vazias, banhadas apenas pela iluminação dos postes. Contornando as paredes do Honey Club, uma pequena fila de pessoas se formava. Não havia agitação ou qualquer tipo de frenesi. Era uma calma linearidade de pessoas percebida apenas pelos burburinhos das conversas vindas das panelinhas que se constituíam.


Às 22h25 a fila ganha um tímido movimento que fluía para dentro da casa de show. Lá dentro, um amplo salão começava a ganhar vida com a presença dos pagantes enquanto o DJ Kastro evidenciava sua discoteca pop, eletrônica e, principalmente, do rap do início dos anos 00’.


Com a casa já cheia, mas com espaços ainda vazios pedindo para serem preenchidos, Kastro inova a sonorização ambiente tocando músicas mais conexas com o estilo da banda que, dali a pouco, iria se apresentar. Uma longa sequência de hardcore nacional serviu para aquecer os motores e despejar adrenalina nos corpos de todos os presentes enquanto o palco recebeu vida com os roadies indo e vindo ajeitando os instrumentos musicais.


Ao fim de Reggae do Manero, a hora enfim tinha chegado. Exatamente às 00h30, 2h30 depois do horário informado pela organização, a Cali estava no palco assumindo presença com uma introdução para Sobre Nós, faixa que abriu a apresentação. Preenchendo o ambiente com groove e swing, a canção fez com que a plateia se mantivesse em pose de êxtase observando a banda performar com vivacidade.


De lá, a banda seguiu com Cidade dos Anjos, seu primeiro single lançado. Durante sua execução, os gargalos que ainda persistiam existir próximos à grade foram diminuindo consideravelmente. Parte do público já se ousava, inclusive, a cantar os versos do refrão. 


Quando os últimos acordes foram ressoados, Egypcio assumiu novamente o microfone para fazer a primeira interação direta com a plateia. “A Cali é uma banda nova e ver a galera cantando nossas músicas é muito bom!”, falou levemente tímido e dando a deixa para a execução do primeiro single divulgado do próximo disco: a reggae rock Lifestyle.


Pegando novamente o microfone, Egypcio alertou como se estivesse dando continuidade ao discurso anteriormente iniciado. “Só pra avisar: a gente é uma banda autoral que veio pra divulgar o novo pop rock nacional”, estimulou.


Recebido pelos gritos de aprovação da plateia, o cantor deu a deixa para que Leo Rota puxasse a introdução de Sigo Na Promessa. Com direito a uma parte da plateia pulando e cantando a plenos pulmões os versos e os refrões, a canção foi o primeiro ponto alto da noite.


De praxe, Egypcio então seguiu, antes de emendar a próxima canção, apresentando os integrantes da banda: Bruno Graveto, baterista, Fouad Khayat, percussionista, Junior Slap Bass, baixista, e Leo Rota, guitarrista. “O Leo é o cara mais novo da banda. Pra vocês terem uma ideia, enquanto a gente estava lá atrás tomando chá ele ficou chupando pirulito”, contou aos risos.


Longa Estrada, a próxima faixa, foi outro momento importante do show no que se refere ao entrosamento banda-público com a plateia batendo palmas no compasso da percussão. Mas nada se compara com a energia reflexiva despejada por Honra. De certa forma, a mensagem lírica é tão profunda que, combinada com a melodia melancólica, arrancou lágrimas da plateia.


Haviam mais cinco faixas programadas no setlist antes do bis. E foi nesse ínterim que momentos memoráveis de mútua cumplicidade aconteceram. É verdade que Guitar Song deu ainda mais energia no público com seu instrumental hardcore, mas as surpresas foram as duas músicas inéditas tocadas pela primeira vez ao público.


A Vida É Uma Lição e Tudo Que Eu Sempre Quis reconstruíram o torpor extasiado na plateia. Como eram novas e, segundo o próprio Egypcio, ainda nem tinham sido tocadas na rádio, a plateia se posicionou atenta para assimilar cada nota das músicas indicadas a compor o segundo disco de estúdio da Cali.


Depois do reggae amaciado Todo Mundo Chora, Egypcio novamente pegou o microfone. “Vocês aí conhecem aquela série La Casa de Papel? Então, porque a pedidos, a gente fez uma releitura da música tema”, disse ao puxar uma versão hardcore de Bella Ciao tirando a plateia do chão e dando início a trinca final de músicas.



Hardcore E Festa foi outra grande surpresa da noite. Assim como A Vida É Uma Lição e Tudo Que Eu Sempre Quis, a música era outra composição do próximo disco a ser divulgada pela primeira vez e que surpreendentemente, foi composta em parceria com Badauí. Não por menos, a faixa tem um forte punch hardcore que muito lembra as melodias do CPM 22.


Encerrando a noite, a Cali se apoiou na opção de reapresentar Lifestyle. Agora com o público já conhecedor da letra, o grupo pôde contar com uma participação mais ativa, o que levou o show a um fechamento de sincronia recíproca. Às 01h37, com direito a foto da banda com a plateia atrás, a apresentação foi oficialmente terminada.


Era visível as feições de satisfação e empolgação que se formavam entre os integrantes da Cali. Havia, claro, certa tensão em saber se a banda seria bem recebida ou mesmo se a plateia conhecia as canções. Mas definitivamente, como primeiro show fora de São Paulo, ou seja, longe de casa, o grupo foi tratado não como um forasteiro, mas como um joseense.


Primeiramente, o Honey Club ofereceu um espaço suficiente para abrigar uma plateia curiosa pela novidade que a Cali representava para aquela noite de 12 de maio. Além disso, a estrutura da casa, em união aos engenheiros de som, forneceram uma acústica e uma equalização que proporcionaram à banda um som limpo e audível em todas as suas camadas. Não era excessivamente alto. Não havia chiados. Só a sincronia.


E por falar em sincronia, Egypcio, Graveto, Rota e Fouad mostraram um entrosamento afiado com Junior Slap Bass. Como último integrante a formar o line up da Cali, Junior teve duplo desafio: criar a química e honrar o legado deixado pela Lena Papini. O resultado não poderia ter sido outro.


O baixista entregou peso e um groove marcante em cada uma das 16 músicas do set list. Dedilhou, improvisou. Ele colocou sua assinatura nas músicas. Em seu caso particular, o baixista teve a comprovação de que conquistou seu lugar definitivo no quinteto com Lifestyle, a primeira música que compôs as linhas de baixo propriamente ditas.


No mais, a banda desfilou simpatia e musicalidade em um repertório repleto de influências mixadas em uma brasilidade estonteante. É a brisa do litoral com o asfalto. É o Sol caiçara com as nuvens acinzentadas. É sombra e luz. É leveza e força. Tudo na medida para dar ainda mais força à cena autoral independente brasileira.


Como segundo show da carreira e o primeiro fora de casa, a apresentação da Cali no Honey Club, apesar de deixar de lado músicas como O Tempo e Estamos Em Guerra, mostrou que a banda tem peso, tem swing, tem groove. Tem brasilidade, tem originalidade e tem entrosamento. Isso é Cali: uma banda família e de caráter que bagunçou o mar.


Compartilhe:

Cadastre-se e recebe as novidades!

* campo obrigatório
Seja o primeiro a comentar
Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.