NOTA DO CRÍTICO
Ele é de Blumenau (SC). Formado em 2015, o trio Morning Storm, que possui uma discografia com apenas um EP, segue a premissa de lançar um single por ano. Desde sua formação, foram seis anunciados. Agora, passada a pandemia, o grupo enfim anuncia Failed Attempt To Do Something Good, o sucessor de Dark Side, seu EP de estreia.
Sussurros arrepiantes. Um clima de tensão chega a arrepiar os pelos de todo o corpo em um nítido sinal de alerta. O som da distorção rompe esse burburinho que, pela constância, acaba sendo recebido como uma espécie de silêncio. Quando o chimbau da bateria de Danilo Fagundes entra aberto e com um som sujo, a guitarra de Rian Rau a acompanha na mesma sintonia, mas com a adesão de pronunciar um riff grave e levemente sínico. Com uma equalização que faz parecer que o som está longe, The Witch Has Saw soa como um blend de grunge, punk e doom metal de garagem. Crua, a faixa tem uma agressividade penetrante regida por um vocal de timbre suave quando limpo, mas que possui capacidade para pronunciar drives consistentes e que, curiosamente, possui até mesmo sutis semelhanças com aquele de Jeff Scott Soto. É Rau apresentando outra habilidade no decorrer da faixa. The Witch Has Saw, com seu refrão sombrio, mas ao mesmo tempo explosivo, dialoga sobre desconfiança que caminha ao lado de um senso desmedido de liberdade para poder construir o próprio caminho. Apesar de densa, a canção é apenas um grito por independência.
Um despertar crescente e hipnótico. Uma melodia melancólica e dolorida exala das profundezas sonoras de uma sinergia instrumental visceral e chorosa. Com sobreposições de guitarras de riffs ásperos e estridentes e, apesar do andamento ainda mais lento que o da canção anterior, Bizarre Love Story tem uma veia stoner indiscutivelmente evidente de maneira a rememorar até mesmo aquele som mais cru do Soundgarden. Seguindo esse viés, Rau entra em cena com uma interpretação lancinante que acaba deixando a melodia ainda mais dolorosa. Com pitadas de um metalcore melodramático, Bizarre Love Story acaba criando um parentesco estilístico com Dead Hearts (Love Thy Enemy), single de Dee Snider ft. Alissa White-Gluz, enquanto trata de sofrimento. Convivendo com a dor da separação, ele tenta ficar perto ao menos da sensação de presença de um alguém que um dia esteve ao seu lado. De cunho até mesmo mórbido, a canção esconde a beleza do amor eterno ao mostrar que, mesmo após a partida, ele continua existente e sendo, mesmo que de uma maneira controversa, cultivado.
Seu despertar metalizado e levemente sombrio oferece raspas de um metal alternativo que flerta com a estética sonora adotada pelo The Pretty Reckless. Sendo antecipada por uma voz propagada por um alto-falante, aqui tendo uma transparente influência de Scott Weiland, Anymore se mostra, desde o início, explosiva e enérgica. Em tom de levante, ela recria a ambiência contestadora de Riot, single do Sugarcult, enquanto amadurece com uma notável imponência. Com uma quebra rítmica surpreendente que a faz mergulhar no campo do doom metal, Anymore ainda é agraciada por um trecho de típica jam session bluesada, um momento em que o baixo de Guilherme Pino é devidamente degustado através de sua linha ácida que mistura, nessa macia melodia blues, a estridência do stoner. Anymore é a libertação do negativismo. É quase como uma música que, apesar da sonoridade agressiva, surge em prol da redenção. Da superação. Diferente de Bizarre Love Story, em que o personagem conviveu com a dor de forma a romantizar a morte, o eu-lírico de Anymore encontra-se em um polo oposto. Um ponto em que quer se ver livre das amarras do negativismo e longe da violência.
É de fato um EP rápido, mas que mostra a sede de crescimento de um trio vindo de Santa Catarina. Sujo, ácido, melancólico e lancinante, Failed Attempt To Do Something Good é um material de múltiplas texturas, mas que caminha majoritariamente por um terreno denso e melancólico.
Entre rompantes explosivos e melodias que misturam o brilho e a escuridão, o Morning Storm conseguiu materializar, por uma miscelânea de influências, sua veia áspera, sombria e melódica. Porém, mesmo sendo possível notar a incorporação de subgêneros como stoner rock, doom metal, grunge, punk, metalcore e o metal alternativo, o EP teve um produto final, no que se refere ao som, inferior à sua entrega.
Executada por Victor Nunes, a mixagem deixou a desejar, pois fez com que a sonoridade de Failed Attempt To Do Something Good soasse longe e abafada, impossibilitando o aproveitamento máximo dos nutrientes melódicos que o EP buscou oferecer. Curiosamente, porém, Nunes, na função de produtor, foi mais feliz.
Ele conseguiu imprimir as influências dolorosas e melancólicas que o Morning Storm consome do doom metal e a fundiu com a estridência e a acidez do stoner rock. Além disso, Nunes possibilitou ao ouvinte inclusive a percepção de um lado mais melódico do trio entre as quebras rítmicas de Anymore.
Fechando o escopo técnico de Failed Attempt To Do Something Good, vem a arte de capa. Sem autor definida, a fotografia que compõe a arte comunica, paradoxalmente, algo cômico ao ser observado após a leitura do título do EP, uma característica que não casa com as temáticas oferecidas no trabalho. Ainda assim, a construção que está evidente na imagem traduz crueza e esta, sim, domina todo o conteúdo melódico do material.
Lançado em 27 de janeiro de 2023 de maneira independente, Failed Attempt To Do Something Good é lancinante, é visceral. É o mergulho no sombrio com sonares estridentes e texturas sujas. É como o início da formação de um feto chamado Morning Storm que, mesmo ainda no útero, já mostra seu posicionamento imponente, melancólico e ácido.