Indira Castillo - Êxtase

NOTA DO CRÍTICO
Nota do Público 5 (1 Votos)

Ela é tida como uma das grandes promessas da nova geração de expoentes do rock no Brasil. Indira Castillo, cantora que teve destaque no programa Canta Comigo e que agora assume o microfone da banda Malvada, anuncia, no fim do terceiro trimestre do ano, seu primeiro EP. Intitulado Êxtase, o material foi completamente captado e produzido no estúdio da Canil Recrods.


É como se sentir em um bar de blues no centro de Nova Orleans. O frescor da mobiliária de madeira, as bebidas dispostas no balcão e um piano esfarrapado em um palco no centro do salão são fatores subjetivos, mas a partir dos dedilhares nas teclas do instrumento, feitos por Geovanni Leite, são sentidos e criados no imaginário do ouvinte. Curiosamente, o piano em si é apresentado como um coadjuvante que abrilhanta a harmonia de uma sonoridade já solidificada pela dupla maciez da guitarra de Victor Guilherme e da bateria de Ian Bueno. Com um blues padrão, swingado em seu intenso veludo, a faixa-título apresenta, como narradora lírica, uma voz cheia de melismas e drives que dá, ao mesmo tempo, diferentes texturas à melodia. É Indira Castillo sendo provocante, consistente e precisa, tornando a faixa-título um produto perigosamente sedutor e potente que, com surpreendentes quebras rítmicas que transitam livremente entre um embrionário metal transfigurado em rock alternativo e um sexy hard rock, consegue ainda parafrasear, sonora e liricamente, com a Puro Êxtase, single do Frejat. A faixa-título, com requintes psicodélicos proporcionados pelo sonar hipnótico do mellotron trazido pelo teclado e com uma corpulência vocal oferecida pelo auxílio de Igor Godoi na ponte e na fase de encerramento, evidencia que todos temos problemas a serem enfrentados durante a vida, mas que se nos apoiarmos em nossa essência e, nas palavras da própria Indira, nas nossas verdades e razões, tudo ficará bem. Ainda assim, seus ápices melódicos sustentam que o principal legado da canção é simplesmente seguir sua identidade, seja ela intensa, louca ou controlada. Seja você mesmo é o principal resumo da música.


Fresca, praiana e apresentando um céu de um entardecer de verão, a presente canção já traz um soft rock que relembra aquele executado por nomes como Cali e Red Hot Chili Peppers. Com protagonismo da maciez da guitarra, a canção não esconde a pressão vinda de sua base melódica que, graças a Henrique Nunes, o baixo faz com que a presente faixa soe mais firme e com uma consistência superior àquela da faixa-título. De flertes bem tímidos com a proposta do reggae, Tempo explode em um refrão hardcore vivaz, intenso e elétrico que dá embasamento para um enredo que trata da superação de um relacionamento baseado em incertezas e razões controversas.


Uma atmosfera completamente diferente daquelas experienciadas até então. Ela é clássica, densa, dramática, valsante e grave pela união entre a tímida leveza do piano, a acidez do hammond proferida pelo teclado, a intensidade do violoncelo e o choroso valsante do violino de Custella. De influências nítidas de nomes como Cazuza e Cássia Eller, Delírio retrata a busca do personagem pelo diferente, pelo desafiador, mas principalmente, pela fuga da rotina e do senso de comodismo.


O trabalho é curto, mas de simples, é só sua duração. Êxtase é um EP que faz o inimaginável com apenas três faixas. Ele traz frescor, maciez, intensidade, provocação, sensualidade e drama com tamanha consistência que chega a arrepiar o último fio. Porém, o principal é que o material evidencia a versatilidade e a potência de Indira Castillo.


No presente trabalho, a cantora consegue ser delicada como uma cantora de MPB, mas, de súbito, ela se transforma em uma leoa com força, presença e consistência de uma frontgirl do rock and roll. Nesses momentos, ela se transfigura em algo que soa como a fusão entre Amy Winehouse, com Rita Lee​Janis Joplin e Cássia Eller.


Tratando de autoconhecimento, busca por liberdade e o desconhecido, bem como o afastamento daquilo que não faz bem, o trabalho de Indira Castillo em Êxtase é fazer o ouvinte se conhecer, ter orgulho e extravasar a própria essência como forma de ter força e coragem para romper a cega tradição e buscar pelo novo. Sem dúvida, é um trabalho empoderado que visa a exortação da liberdade.


Nesse caminho, o EP traz a presença de Rodrigo Cunha na mixagem, uma figura indispensável para a regimentação da melodia apresentada no trabalho. Com ele, cada música soou como produtos únicos. Limpas, equalizadas e precisas, elas foram agraciadas com todos os instrumentos em perfeita audição, proporcionando ao ouvinte a identificação de gêneros musicais como blues, soft rock, hardcore, hard rock, rock alternativo, psicodelia e flertes com o reggae.


Fechando o escopo técnico, vem a arte de capa. Assinada por Ricardo Bancalero, ela traz um quê de misticismo ao apresentar o coração, ao centro, como única figura colorida em meio à hipnótica junção do padrão preto e branco. Uma figura que se apresenta como o carpelo de uma flor. Tal estratégia permite ao ouvinte entender que o coração é o artifício que ajuda cada indivíduo a encontrar o seu eu. E no caso do EP, está totalmente à mostra porque sua flor desabrochou pela força de vontade que transpirou de Indira.


Lançado em 01 de setembro de 2023 via Canil Records, Êxtase é um EP de cunho teatral que é versátil, sensual, eletrizante e, ao mesmo tempo, delicado. É um trabalho que, mais que incentivar a busca pelo autoconhecimento, mostra o processo de uma mulher em se encontrar. Êxtase é simplesmente o transpirar da liberdade e o grito da emancipação da insegurança.

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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.