EfiKa - Entre o Céu e o Inferno

NOTA DO CRÍTICO
Nota do Público 5 (1 Votos)

Não é apenas porque já se estava no final do segundo tempo de 2020 que não se podia contar com lançamentos. Muito pelo contrário. Afinal, foi nesse momento que Fernando Oliveira, ou EfiKa, como é conhecido, escolheu anunciar Entre o Céu e o Inferno, seu segundo EP.


Um som macabro se apresenta. Murmúrios e uma atmosfera sombria abraçam uma voz editada num tom excessivamente grave para aumentar o clima de suspense em Interlúdio, a faixa de abertura. A voz, creditada ao Anjo do Caos, se apresenta ao ouvinte expondo suas lamentações, anseios e estímulos. De fato, um interlúdio, ou melhor, um cartão de visita para dar um gosto do que será de fato Entre o Céu e o Inferno.


Uma calmaria nostálgica e inebriante se forma no despertar de DeCaído. Contudo, o vocal acelerado de EfiKa, junto a um beat regado em golpes repetitivos no chimbal, quebra essa monotonia e entra uma aceleração que, como um susto, desperta os ouvidos do espectador. Com o auxílio de rimas perfeitas e dos beats de Victor AL.N, EfiKa apresenta ao ouvinte um cenário em que expõe, com o rap, um eu-lírico sofrido e machucado pela vida. Aqui, esse mesmo eu-lírico quase tenta se justificar por um comportamento socialmente reprimido, mas ao mesmo tempo mostra como essa mesma sociedade é quem alimenta e matura esses mesmos comportamentos.


Uma mescla de sensações se forma com a introdução de Versículo Se7e. Enquanto um som de piano surge em notas melódicas, mas mesclando com uma melancolia sombria, o sintetizador de Nicolas Carvalho lança ao vento um som azedo que funciona quase como um riff e cria uma sensação excitante e ao mesmo tempo tensa por descobrir o que a música de fato apresentará. O que se segue é um rap acompanhado do som de uma bateria acústica, a qual entrega um groove contagiante que estimula e empolga o ouvinte. Com uma letra que novamente se vê apoiada em rimas perfeitas, EfiKa caminha por um cenário de confissões e de estímulos para que o ouvinte siga sempre em frente com o intuito de realizar seus respectivos planos. 


Com a ajuda do som groovado do baixo e de um vocal que entoa ‘EfiKa’ de forma quase onipresente no ambiente, Judas é uma música que apresenta ao ouvinte um lirismo que aborda o universo do interesse, do não afetivo. Com o som do teclado em apenas uma nota, o que se tem é um ambiente extasiante que mistura analogias bíblicas com a realidade.


De influências nítidas com o rap estadunidense, Babilônia tem um som oco que vem acompanhado de um lirismo cuja abordagem se centra na sensação do não pertencimento, desestímulo e em uma sociedade carniceira. Curiosamente, apesar da letra forte e o som estridente do piano, o beat segue mantendo seu estímulo e continua envolvendo o ouvinte.


O som em estilo sci fi toma conta da introdução de Lilith e cria uma sensação de suspense e agitação no ouvinte para saber o que virá em seguida. A partir de uma melodia mais sombria, EfiKa narra, em meio aos beats bem marcados, a história de uma mulher humilde que viveu infelicidades em sua trajetória, mas que não cedeu à tristeza e continuou seu caminho. Claro que esse é um retrato comum em extensas partes do Brasil, mas com o auxílio da melodia, a realidade apresentada aqui ganha maior dramaticidade.


Entre o Céu e o Inferno é um trabalho que caminha homogeneamente por músicas de lirismos relacionados. Na maior parte do tempo fazendo analogias à Bíblia, seja pela nomenclatura das músicas ou por situações narradas durante as composições, o EP expõe não só a realidade de uma sociedade que não mudou seu jeito de ser, mas que aumentou seu modo agressivo-interesseiro de funcionar.


Por isso, o que EfiKa expõe aqui é uma clara crítica à sociedade moderna. Suas letras dramático-lamentosas e agressivas representam a realidade de muitos, a qual, por meio do minimalismo sonoro presente no EP, ganha mais drama e uma maior identificação por parte do ouvinte.


Lançado em 21 de dezembro de 2020 de forma independente e produzido por Carvalho e Paulo Jr., Entre o Céu e Inferno pode muito bem ser considerado um EP conceitual. Afinal, além das letras e das nomenclaturas das faixas, a arte de capa também comunica, mesmo que de forma bem caseira, a mesma informação: a de que não só EfiKa, mas todos, inconscientemente ou não, caminhamos entre o céu e o inferno.


















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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.