A Nova Banda da Cidade - A Nova Banda da Cidade

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Fugindo do eixo Rio – São Paulo no que se refere à supremacia musical brasileira, mas ainda não se afastando desses grandes centros, a A Nova Banda da Cidade surge com seu disco autointitulado trazendo não apenas músicas reflexivas, mas pé no chão, como o asfalto que cria uma seriedade inconsciente para aqueles que por ele passam.


Essa noção logo se faz presente na faixa de abertura. Nomeada homonimamente aos nomes do disco e da banda, a faixa nada mais é do que um monólogo reflexivo que transita entre noções de movimento e de espaço tempo. Claro que, nesses casos, o que se fixa é a voz do eu-lírico, mas aqui, não apenas a narração e a interpretação de Rinas Francisco penetram no imaginário do ouvinte, mas o som do teclado, criando um ambiente quase alucinógeno, auxilia em grande escala a experiência da autoanálise e do pensar sobre as coisas.


O seu mundo acaba agora” é a última frase da canção de abertura e que, como uma provocação ao ouvinte, instiga o mesmo a querer se aventurar pelo que vem a seguir. E como um medley, a faixa-título se une com (De)Repente em um ar de suspense. Nesse ambiente, elementos percussivos dão uma coloração nordestina no escopo sonoro, o qual, acompanhado do baixo, ganha um groove acentuado e contagiante. Na presente canção, o vocal de interpretação extremamente informal e coloquial traz na mente do ouvinte bandas como Virgulóides e Mamonas Assassinas. Tal forma de se comunicar aproxima o ouvinte, que se vê representado em uma letra que escancara uma sociedade refém de uma agenda jornalística que exibe, com frequência, a mesma série de notícias. De outro lado, a canção guarda ainda um momento de explosão uníssona regada em distorção e pressão.


Puxada pelo baixo, Antena Paranoica amanhece com uma melodia levemente inclinada para o reggae que vem acompanhado de uma gravação como se viesse de um rádio. Com swing e leveza, a canção conquista o ouvinte sem grandes dificuldades com sua estética praiana do asfalto. Paradoxalmente, o lirismo aborda fortemente uma crítica não só às redes sociais e a forma como elas moldam a rotina de uma comunidade, mas também aos celulares e a dependência social por esses aparelhos.


De som sujo, Meu Irmão já começa com uma letra imersa em um humor leve e adolescente. Porém, após um acelerado repique da bateria de Daniel Abilio, ocorre uma quebra rítmica e a canção tem o seu ritmo tomado por uma estrutura rockabilly estimulante e contagiante. E com essa nova roupagem, o teor lírico ganha ainda mais graça e causa risos espontâneos no ouvinte.


Com uma sonoridade mais intrigante e madura criada pela dupla de guitarras formada por Lucas Morais e Andrade, Imortal tem um quê de sedução sombria e inquietante que se forma logo nos seus momentos iniciais. A faixa possui ainda uma ponte interessante. Ela é formada por um verso cantado quase como se tivesse sido inserido de supetão à melodia e é essa quebra o que levanta, de certa forma, o embalo da música. Pode-se até dizer que A Nova Banda da Cidade se baseou nessa artimanha feita pelo Detonautas na ponte de Outro Lugar.


Liberdade de Amar traz o que até então faltava em A Nova Banda da Cidade: a balada melancólica. Em tons mais tristes, o trio de cordas cria um ambiente levemente sofrido e até de certa forma, nostálgico. Nesta faixa, fica mais clara a semelhança entre o timbre de Francisco e aquele apresentado por Paulo Miklos. Fora isso, na faixa ocorre, também, um dueto entre Francisco e Andrade que cria um romantismo extasiante.


Se Liberdade de Amar já trazia melancolia, em Eu Não Ligo essa característica atinge as alturas com as notas aveludadamente tristes, mas também aconchegantes, do teclado. Junto com a precisão e a pontualidade das notas do baixo, a canção ganha uma dramaticidade que se expande conforme o lirismo vai tomando corpo. Cheia de frases de impacto, a letra da canção aborda temas delicados, como a depressão e o suicídio. Tais temas são mascarados pela base lírica que apresenta situações de coração partido e dependência amorosa.


Longe da fossa e levantando as energias, Não Seja Burro, Meu Amigo retoma a alegria a partir de uma melodia calcada no blues rock e naquele humor já tão característico de A Nova Banda da Cidade. Contágio, atração, envolvimento e sedução. Essas são algumas das características da canção e verbalizadas pelo ouvinte, que se vê em movimentos de headbanging involuntários.


É com ar psicodélico que Helena Ignez se apresenta ao ouvinte. Seu despertar é inebriante e faz com que o espectador se sinta em uma viagem semi-alucinógena. Mas não só isso. A faixa talvez tenha a letra mais macabra de todo A Nova Banda da Cidade, afinal, narra o fato posterior à morte da personagem da canção, e nela, o teclado aparece com uma melodia de lamento, de funeral.


Groovado é o que se pode dizer do início de Caos de Felicidade, a saideira do álbum. Notas alegres e pontuais da guitarra dão suas pinceladas de cores mornas que indicam que uma melodia envolvente e contagiante virá em seguida. E é exatamente isso o que acontece, mas com a adesão de um lirismo cujo humor sádico mostra que mesmo com um mínimo de privilégio, se vive as situações mais comuns da classe média. Claro que aqui existe crítica ao sistema e, claro, porque não, à política.


É bom ver que o cenário musical se expandiu para além de São Paulo e Rio. No caso, vinda de Poá, cidade do interior paulista, a A Nova Banda da Cidade trouxe com seu disco de estreia um frescor sonoro que é regado em críticas sociais, as quais estão intrínsecas em humores pastelão.


Com um rock leve e cativante, o grupo conseguiu entrar no mesmo campo de bandas como Ultraje A Rigor, Pedra Letícia e os já citados Mamonas Assassinas e Virgulóides. É verdade que, mesmo que haja uma semelhança estilística, a A Nova Banda da Cidade está em passos adiantados na busca por uma identidade sonora própria. E ela, pode se dizer, é uma mistura de Califórnia com São Paulo, política e praia, humor e crítica.


Esses detalhes são muito bem explorados no conteúdo lírico das canções. Mas não só nisso. Morais conseguiu imprimir tais informações também na arte de capa. Nela, a banda comunica, por meio dos corpos sem cabeça, a ideia do ato mecânico e da falta de capacidade do raciocínio crítico. E nesse sentido, a cor vermelha adotada pode surtir como uma crítica ao capitalismo, uma vez que essa tonalidade é frequentemente associada ao socialismo.


De volta às características sonoras, o que não se pode deixar de notar é que a mixagem feita por Gustavo Henrique erra pontualmente no volume das canções. Em alguns momentos, que é verdade, são poucos, cada detalhe instrumental e de canto de algumas canções são difíceis de serem percebidos devido à tonalidade um tanto mais baixa da gravação. Mas isso não atrapalha em nada a conjuntura da obra.


Lançado em 08 de janeiro de 2021 via Spectro, A Nova Banda da Cidade é um blend de estímulos, pois ao mesmo tempo em que relaxa, ele instiga o ouvinte a pensar e refletir. De fato, um trabalho bastante maduro liricamente falando para uma banda cuja estrada está apenas começando a ser pavimentada. Mas se essa pegada de composição continuar, A Nova Banda da Cidade será uma banda cujo caminho será repleto de conquistas.


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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.