Cordillera - Ruptura

NOTA DO CRÍTICO
Nota do Público 0.00 (0 Votos)

Rock progressivo. De todos os subgêneros do rock, talvez o mais complexo. Surgido na Inglaterra no final dos anos 1960, o estilo misturava elementos do jazz e da música clássica. Seus precursores foram grupos como Led ZeppelinThe Beatles e Frank Zappa. Dessa mesma fonte, mesmo passados 58 anos de sua origem, se nutre o grupo nacional Cordillera, que em 21 de junho deste ano lançou, de forma independente, Ruptura, seu trabalho de estreia de oito faixas.

Noumenon, música de abertura, chega como um susto. Contra os padrões de composição, a música não começa com uma introdução gradativa, em que os instrumentos vão tomando forma individualmente. Ela começa com um uníssono instrumental que é acompanhado da guitarra de Raphael Moretti, em destaque. Aos dez segundos entra o vocal de Victor Oliveira. Seu timbre suave e inglês bem pronunciado causam conforto aos ouvidos, remetendo a cantores de mesma característica, como Roger Waters e John Lennon. Se baseando por isso, não se esperaria grandes artimanhas vocais de Oliveira. Engano. Seu alcance é alto e possui rápidos momentos de drive. Diante de todas essas menções, Noumenon ainda guarda surpresas. Referências ao rock oriental, a presença de riffs distorcidos remetendo a era grunge, e a utilização do cowbell no balanço rítmico do baterista Matheus Vazquez, trazem originalidade à composição.

Referências ao jazz aparecem em seguida, com a introdução de Uneasiness. Sucedida pela presença da guitarra distorcida e uma base mais agressiva, a música traz na memória as primeiras composições do Black Sabbath, vista semelhança do corpo sonoro. Na música, os vocais vêm com efeitos de influência na psicodelia, uma vertente que se origina do rock progressivo. Se foi dito que o inglês de Victor Oliveira é bem pronunciado, a argumentação ganha mais força na música. Sua nitidez dificulta a não compreensão daquilo que está sendo cantado. Em Uneasiness, porém, o destaque fica com Matheus Vazquez. De nada adianta uma bateria bem equipada se quem a comanda não usa com precisão e conhecimento do equipamento que dispõe. Pratos como splash, de condução e ataque, fora as várias técnicas empregadas por Vazquez dão uma roupagem especial na música, a mais longa de toda Ruptura, com nada menos que sete minutos de duração. O tempo, apesar de parecer algo supérfluo, é outra identificação clássica do rock progressivo.

On The Top Of The Wall possui boas pontes. Sobressaindo o baixo de Pedro Ghoneim, a música acaba ganhando ares de blues, mesmo que em curtos intervalos de tempo. Fora o refrão, o contrabaixo é um instrumento que fica totalmente perceptível até aos ouvidos menos aguçados. Além da boa atuação de Ghoneim, a música possui um grande solo. Raphael Moretti imprimiu nele um típico blues estadunidense, melódico e harmônico. Claro que a base instrumental cooperou muito para o feito.

Também marcante, Molologue talvez tenha a introdução mais psicodélica de todo EP. Trechos épicos e grooves rápidos de bateria também compõem seu início. A música tem ainda um momento de grande semelhança com a música Black Night, do Deep Purple. Outro detalhe que não se passa despercebido é sua velocidade rítmica. Comparada com as demais músicas, Monologue, até o momento, é a mais acelerada. No entanto, o vocal entra para dar um balanço destoante. Ao passo que os instrumentos estão em compassos rápidos, que pedem efeitos vocais mais marcantes, Oliveira vem com a mesma técnica, não causando desconforto algum.

Swing. Essa é a palavra que define os momentos iniciais de Dialogue. O chamado head shake, o balanço de cabeça típico do rock, é inevitável. As características são fortemente retomadas ao longo da música, que contém grande presença de Tarcísio Barsalini, o guitarrista base do Cordillera.

A faixa-título traz aquilo que o EP mais fugia, uma introdução gradativa. A guitarra base tem seu momento curto de solidão que logo se perde na chegada explosiva de seus companheiros instrumentais. A exploração de grooves e extensões vocais com drive são outras características marcantes da música. Propositalmente ou não, Ruptura é a música que mais se aproxima de um material mercadológico. Pelo seu padrão, revistas especializadas como Roadie Crew poderia procurar pelo Cordillera para a realização de uma entrevista. Pelo seu som, a Rádio Kiss FM a tocaria em programas de sua programação, como o Gasômetro, por exemplo.

Eis que se encontra um conflito. Ruptura tem, sim, características que a tornem comercial. Mas Misplaced, a faixa seguinte, a vence nesse quesito. Tarcísio Barsalini executa uma base de metal de apenas dois acordes por vez. Raphael Moretti traz uma guitarra mais harmônica, típica do hard rock europeu. O head shake, outro ponto citado anteriormente, fica tão intenso que permanece durante toda a execução da música. Visto isso, Dialogue acaba ficando em segundo plano nesse quesito. Tais características levam Misplaced para mais longe do que Ruptura. As programações gerais da Kiss FM e 89FM facilmente a adotariam em seus setlists.

Com ar de suspense é chegada A New Beginning, última música de Ruptura. Nela, ambas as guitarras adotam comportamentos mais harmônicos, mesmo, claro, com a presença padrão da distorção em alguns momentos. Assim como MonologueA New Beginning traz grande semelhança com outra música. No caso, a igualdade está para com Stop This Madness, faixa dos alemães do Pink Cream 69.

Ruptura é um EP que, acima de tudo, nos obriga a reconhecer a maestria de todos os músicos, tanto individualmente quanto em conjunto. Nos obriga a enxergar que o rock nacional está cada vez mais tomando novo fôlego. Das novas bandas que estão surgindo atualmente no cenário fonográfico nacional, Cordillera acaba alcançando um posto de igualdade entre Armored Dawn e Gods & Punks.

Mesmo que o idioma adotado seja o inglês, ponto que tira parte da originalidade e ousadia do grupo, Cordillera apresenta um vocal com boas dicção e pronúncia. A mixagem de Victor Oliveira, também vocalista da banda, coopera com o detalhe. Todas essas características fazem com que Ruptura, apesar de ser um trabalho de estreia, já mostra muito do potencial que o Cordillera tem para entregar ao mercado fonográfico nacional.

Crítica postada originalmente no Allmanaque

Compartilhe:

Cadastre-se e recebe as novidades!

* campo obrigatório
Seja o primeiro a comentar
Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.