Arthus Fochi - Quadrados Na Bola

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Poucos meses depois de participar de Ensaios Férteis, primeiro EP do Cajupitanga, o cantor e compositor carioca Arthus Fochi volta ao estúdio para produzir e, enfim, apresentar Quadrados Na Bola. O Extended Play, gravado em takes únicos, serve de sequência para Ano Sabático, até então o último trabalho lançado por Fochi em sua carreira solo.


O exoterismo avança com uma agressividade singular. O violão de Artus Fochi adocicado e suave como vento, vem acompanhado de sopros igualmente amenos do saxofone alto de Scott Hill. Tal união sonora cria uma atmosfera natural que, intuitivamente, faz com que o ouvinte passe a ouvir o som de quedas d’água, tranquilizando seu espírito e relaxando os músculos. Somente com a introdução, Quadrados Na Bola (A Coisa Toda) - Suíte se apresenta como um perfeito mantra. Com uma sensualidade reconfortante, conforme a melodia vai amadurecendo, a canção vai ambientando o ouvinte em cafés parisienses enquanto Fochi entra com um vocal ameno entregando toques aveludados de MPB em um lirismo que soa como o sentimento de desajuste, falta de pertencimento. Um patinho feio na homogeneidade da forma. O curioso é ver que, adiante, ocorre uma dissonância caótica que parece enfim ilustrar em sons esse desconforto, algo que persiste em Quadrados Na Bola (A Coisa Toda) - Suíte até pouco depois de sua metade, quando recobra a consciência e a conformação com a doçura da qual foi inicialmente apresentada ao ouvinte. Dessa forma, a faixa aparece com um interessante looping narrativo.


Na faixa-título, o grave do violão e o choroso esvoaçar do sax amplificam aquela sensação de desolamento. Sobressaindo com uma densidade ainda mais dramática, ao contrário de Quadrados Na Bola (A Coisa Toda) - Suíte, a faixa-título não possui o caos, a agonia e a dissonância. A morfina da exclusão da dor da negação é o que encaminha suavemente o ouvinte até seu entorpecente fim.


Com um leve suspense em suas notas, o violão surte um efeito de alerta, de uma expectativa masoquista no ouvinte, que se pega atento pela incerteza dos próximos passos melódicos. E de fato, o ouvinte é levado para um sorrateiro caos. Não existem linhas líricas para uma maior linearidade. Ponte Para O Nada é quase como uma poeira espacial. É a união de sons ardentes e estridentes em contatos com sobreposições dissonantes de instrumentos de sopro que não se completam, apenas surtem o efeito de poluição sonora. Proposital ou não, essa desarmonia chega até mesmo a incomodar os ouvidos mais desavisados, tornando Ponte Para O Nada um verdadeiro enigma.


Deixando aquele caos melódico, o novo alvorecer retoma a maciez e a calmaria com doçura e leveza. Tendo como protagonismo absoluto o sax alto, que vai e vem entre diálogos alegres e introspectivos, De Pedra E Pó traz um Fochi regado em falsetes agudos em cuja interpretação lírica sugere agonia e raspas de uma loucura nascente. Aqui, o diálogo sugerido é, metaforicamente, o consumo de entorpecentes como forma de fugir da realidade, do presente, dos problemas. O vício é o ponto principal, um assunto recorrente nos veículos noticiosos que, para alguns, como o próprio personagem, chega a ser um trunfo quando é inserido no agenda setting jornalístico.


Leveza e suavidade como uma música ambiente. Com base na melodia MPB, Purpurina vem com a proposta de oferecer ao ouvinte uma reflexão sobre prioridades, sobre a rotina, sobre o tempo. Sobre a felicidade. Mais do que qualquer coisa, Purpurina causa um choque de realidade quando o espectador percebe as entrelinhas da crítica à falsidade com que o indivíduo age consigo. O principal pensar em Purpurina é a busca pela razão e pelo local em que o indivíduo encontrou o direito de se sabotar e de não respeitar suas próprias emoções.


É quase como um trabalho instrumental. Curiosamente, com sua aparente leveza e maciez, Quadrados Na Bola é um EP que, por meio da camada swingada superficial de sua melodia, esconde, propositadamente, as críticas sociais que propõe em torno de seus diálogos lírico-rítmicos. 


Por meio da união sincrônica com o saxofonista estadunidense Hill, o carioca apresenta dissonâncias e poluições sonoras propositais que, ao encontro dos enredos, promovem uma miscelânea de emoções que vão desde agonia ao desolamento. E o curioso nisso é que as melodias, mesmo quando caóticas, guardam bases amenas.


Isso pode ser um feito de Guilherme Marques, que, por meio de sua mixagem equalizada, faz com que o ouvinte consiga perceber as nuances entre o folk francês e a MPB. Nesse processo, ainda, fica claro para o espectador a influência forte de Caetano Veloso sobre Arthus Fochi.


Fechando o escopo técnico de Quadrados Na Bola, vem a arte de capa. Assinada por Candioco, ela traz uma espécie de arte povera, simplória e, por que não, amadora. Porém, em seus poucos elementos e traços aparentemente desnecessários, o autor comunica a confusão, a desarmonia e o caos. Essas emoções, por mais que sejam gritantes, sugerem, inclusive, que existe a necessidade e a vontade pela cura, pela reparação. É a consciência da fragilidade.


Lançado em 09 de fevereiro de 2023 via Cantores Del Mundo, Quadrados Na Bola é como um desafio para que o próprio ouvinte o disseque e encontre o que de fato está querendo dizer. E quando isso acontece, vem o choque de realidade que obriga o espectador a pensar sobre respeito, prioridades e, principalmente, amor-próprio.











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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.