NOTA DO CRÍTICO
Desde que a pandemia se instaurou no mundo, todos passaram, por períodos diferentes, a ter mais contato com aqueles que moram no mesmo ambiente melhorando ou não esse convívio. Esse é apenas um dos assuntos bases do novo EP do duo A Transe, chamado Bad Vibes de Casal.
Um ambiente em tons pastéis, como o amanhecer em um dia de verão, é trazido pela doçura do tom da guitarra e da suave voz de Fernando Zorzal em Pra Te Ver. Enquanto o baixo acompanha a melodia quase como um sopro onipresente, o vocal leve e igualmente doce de Francesca Pera surge dando novas cores de energias brandas a uma música que trata de como o tempo parece infinito quando na presença de duas pessoas que se amam e se observam na tentativa de se melhorarem individualmente e como casal. Com um turning point rítmico, a canção passa a ter um viés mais eletrônico quando o teor lírico fica mais tenso, expondo os conflitos vividos pelo casal e por casais durante períodos de longa convivência como o que está ocorrendo por conta da quarentena. Com um solo inebriante, o ouvinte se vê, como o próprio nome da banda sugere, em um estado de transe. Pra Te Ver, portanto, é uma faixa reflexiva, mas também de um ritmo sedutoramente colorido em sua estética.
Em A Transe, diferente de Pra Te Ver, quem puxa a melodia é a voz de Francesca, que narra novamente situações de conflito de casal ao mesmo tempo em que tenta assumir sua posição no mundo e reafirmar o que é amor. De melodia mais romântica, Domingo trata também do amar outra vez e da possibilidade de se apaixonar novamente pela pessoa com quem convive. Melodicamente falando, é como se a harmonia por si só criasse um ambiente de reconciliação, pois traz drama com uma pitada de raiva e desacordo trazida pela força das notas do piano em amizade com os elementos eletrônicos apresentados na canção.
Curto, mas sincero. Reflexivo, mas suave. Agressivo, mas honesto. Essas são algumas das características que definem Bad Vibes de Casal, um EP que tem uma comunicação harmônica entre todos os elementos. Desde o nome do trabalho, até a arte de capa feita por Henrique César, tudo está de acordo.
Sinalizando duas possibilidades, a capa do EP traz a possibilidade do afeto e do bloqueio. Do desejo da receptividade e da negação. Sua impressão de movimento causa a informação de diversas realidades dentro de cada situação proposta na sobreposição fotográfica, algo que ocorre na vida, mas se intensifica em momentos de tensão.
Melodicamente, apesar de conter uma complexidade instrumental, são apenas os instrumentos-chave que saltam aos ouvidos do ouvinte e criam um ambiente amplo de reflexão e desejo por mudança. Bad Vibes de Casal, portanto, é como um quadro e cada linha instrumental uma cor. Seus timbres e tons suaves criam tons pastéis, mas também são mesclados com cores quentes e vivas, retratando conflitos e obstáculos.
Por essa razão, é possível dizer que a mixagem de Alexandre Barcelos foi bem executada. Sim, é possível ouvir as notas dos instrumentos em conjunto, mas não em sua forma individual. Contudo, isso não interfere na conjuntura do trabalho do duo A Transe.
Lançado em 26 de outubro de 2020 de forma independente, Bad Vibes de Casal é um trabalho indie eletrônico que pede calma e tranquilidade. Que ensina a amar de novo e que a paixão pode ser reconquistada. Que destaca que o amor é forte e capaz de superar barreiras. Se em pandemia ou não, A Transe deu seu recado de que tudo é passageiro e que se tem apoio, tudo pode ser superado.
*Crítica originalmente publicada no Allmanaque.