Gorillaz - Song Machine: Season One - Strange Timez

NOTA DO CRÍTICO
Nota do Público 3.5 (2 Votos)

Dois anos depois do anúncio de The Now Now, o grupo dub eletrônico inglês Gorillaz retorna à cena fonográfica para divulgar um novo trabalho. Dessa vez, o virtual abriu espaço para a chegada de Song Machine: Season One – Strange Timez, o mais recene e aguardado trabalho do grupo.


Um som caótico e desarmônico ecoa pelo ambiente. O piano em notas graves e tocadas quase que de forma solta e sem partitura aumenta a sensação de desconforto mesmo com a chegada da voz de 2D. De forma proposital, é a desarmonia do caos e da quase anti-melodia que o ouvinte possui em Strange Timez. Interessante notar que entre o forte compasso do baixo e do vaivém da escaleta a composição recebe a presença de Robert Smith, vocal do The Cure, em momentos de narração.


Muito diferente da anterior no quesito melodia está The Valley Of The Pagans. Murdoc Niccals imprime aqui linhas de baixo suavemente swingadas unidas em um compasso de bateria em estrutura 4x4 que contagia o ouvinte. A canção ganha contornos disco na chegada do refrão com estouros de notas agudas do teclado. A surpresa para o ouvinte, porém, está na chegada da ponte. Nela, o espectador se depara com uma voz levemente mais grave. É o cantor conterrâneo Beck dando sua assinatura à faixa.


Swing. É isso o que The Lost Chord traz ao ouvinte. Um baixo entrosado de compassos sensuais em harmonia com o teclado aveludado e uma bateria suave cria uma atmosfera sensual que ganha pontos altos com os falsetes afinados do convidado Leee John. Por isso, a canção tem características de uma melodia envolvente e contagiante.


De estética inclinada para o eletrorapp e o chiptune, Pac-Man tem, como de costume, um baixo muito presente que desenha a melodia da canção, que ainda conta com uma guitarra que, em suas notas, flerta com o reggae. Mas é no segundo ato que a música se transforma. Com a entrada de ScHoolby Q, mesmo envolto em uma sonoridade leve, a faixa se torna um rap de lirismo pouco acelerado e nítido.


Um synthpop alegre e contente se apresenta em Chalk Tablet Towers. Com bastante presença do teclado entregando uma suavidade a mais, a canção ainda recebe a voz harmônica e afinada de St. Vincent como um acompanhamento onipresente de 2D. É como se a faixa tivesse sido feita nos moldes para ser usada em uma trilha sonora de filmes juvenis, pois auxiliaria a enaltecer o teor jovial e inocente.


Mais tranquila e guiada pelas notas precisas do piano, The Pink Phanton apresenta um cantar lamentoso de 2D, quase como se estivesse se lembrando de algo com pesar. Outras cores são entregues ao conteúdo vocal, no entanto. A voz eletrônica de 6LACK aumentam a inclinação rítmica da faixa para o eletrônico, mas essa é uma impressão passageira que vai para o clímax da música. Os ouvidos dos espectadores se surpreendem por notar uma voz grave de bons alcances vocais. É Elton John também entregando seu tom à composição.


Noodle surge, em Aries, com uma guitarra distorcida passando a impressão de ter sido algo acidental, pois a sonoridade logo se dissipa e ganha ares eletrônicos com um beat de bumbo preciso e um teclado de notas transcendentais. De compasso envolvente e cativante, a faixa ainda conta com a participação de Peter Hook e Georgia nos vocais.


Mudando a estrutura de lírica e confundindo o ouvinte por instantes, em Friday 13th 2D se apresenta com uma voz quase computadorizado. Entregando um movimento extra à canção, o vocalista caminha em um ritmo suavemente mais acelerado do que o de costume até a chegada do refrão onde passa o microfone para Octavian. De voz rouca, o rapper dá um tom mais opaco à canção.


Com dedilhados rápidos em notas medianas do piano, Dead Butterflies traz um canto fundo como se estivesse sido ouvido a partir de um rádio. O baixo e a marcação acelerada pelo chimbau da bateria de Russel Hobbs enaltecem a imersão canção em uma temática eletrônica. No entanto, a canção ainda possi turning points interessantes causados pela entrada da voz carinhosa e sensual de Roxani Arias e pela brusca entrada do rapper Kano.


De groove padrão, a bateria cria um compasso 4x4 que vai sendo acompanhado pelo baixo fazendo com que o ouvinte comesse a movimentar a cabeça pra frente e pra trás involuntariamente. A guitarra tímida e com riffs curtos em eco dão tonalidades mais coloridas enquanto a introdução de Désolé caminha para a finalização e dá passagem para que 2D entre em companhia da voz firme, grave e harmônica de Fatoumata
Diawara
.


A melodia de energia cômica e de estrutura fora do usual, Momentary Bliss não traz 2D puxando a canção, confundindo os ouvintes por instantes. Na dianteira está o rapper Slowthai, que entrega, com sua voz opaca, movimento e cadência à canção que tem uma estética que mistura eletrônico, rap e rock alternativo.


Produzido por um time de produtores que vai desde Remi Kabaka Jr.James Ford, Mike WILL Made-It, Marzeratti, Prince Paul e Robert Smith, Song Machine: Season One – Strange Timez é um disco indiscutivelmente experimental e ousado.


O número extenso de produtores presentes para realizar o disco explica as transições nada comuns feitas entre as canções do sétimo álbum do Gorillaz. Eletrônico, rap, rock alternativo e chiptune são apenas alguns gêneros musicais pelos quais as estruturas rítmicas das canções caminham.


Essa ousadia naturalmente atrairá diversos públicos que não somente o já consolidado pelo grupo inglês. A voz inconfundível de 2D está lá para confortar os fãs das antigas e as experimentações estão para agradar aos novatos. Mas uma coisa pode unir ambas as camadas de adoradores do grupo virtual, a arte de capa.


Fora a voz do vocalista, a arte de capa feita por Jamie Hewlett é extremamente interessante. Cores vivas e pastéis dividem harmonicamente os espaços preenchidos por elementos que parecem ter sido colocados ali por acaso. Diversas escaletas dividem o ambiente com um palhaço mal-humorado, bolas de gude, autofalante, adesivo da Playboy e outros objetos bizarros.


A verdade em tudo isso é que Song Machine: Season One – Strange Timez, disco lançado em 23 de outubro de 2020 via Warner Music Records, fez jus ao êxtase criado pela espera da sua chegada. Descompromissado e alternativo, ele é o que a música está buscando hoje: romper as nomenclaturas rítmicas e, simplesmente, se deixar levar.


​*Crítica originalmente publicada no Allmanaque.


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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.