Siso - S2

NOTA DO CRÍTICO
Nota do Público 4 (1 Votos)

Três anos. Esse foi o tempo necessário para que Siso transitasse de Saturno Casa 4 para um novo trabalho. Produzido pelo próprio músico, S2 foi gravado em São Paulo (SP) e pré-produzido entre a capital paulista e Belo Horizonte (MG) durante os meses de dezembro de 2019 e março de 2020.


Uma batida eletrônica é percebida no despertar de Pop Antigo. Na presença de um vocal de viés sufocado e timbre abafado, a música tem ritmo linear com forte participação do synth de Fábio Lamounier e um lirismo repleto de rimas pobres. Apesar disso, o refrão consegue conquistar o ouvinte com seu ritmo envolvente em união a um vocal de velocidade sutilmente acelerada.


Com maior cadência que em Pop Antigo, Quando o Amor de 1 Homem é 1 Revólver apresenta Siso em uma performance mais coloquial. Interessante aqui é notar que a ambivalência de um ambiente agressivo por conta do som distorcido da guitarra com um calmo inebriante se encontram com um conjunto de sonoridades provindas de elementos percussivos que dão cores e engrandecem a qualidade rítmica da canção.


Trazendo um beat ao estilo street dance em união às notas concisas e precisas do piano, Corpo Pra Amar mantém o movimento mais envolvente apresentado em Pop Antigo. Sonoramente crescente e de energia que flerta com a new wave, a música vem com a promessa de ser o primeiro single apresentado em Siso por conta de sua estrutura calcada em um refrão repetitivo e melodia-chiclete.


Sons agudos e curtos são ouvidos. A ideia de calmaria, porém, é abalada com a entrada de um beat acelerado que dá entrada a uma batida de levada cadenciada que entrega movimento a Não Me Venha Com Essa de Amor. De pré-refrão sutilmente mais estimulante que o próprio refrão, a música vem acompanhada de um lirismo cuja história relata um relacionamento passageiro e uma sede de viver. Curiosamente, a música refresca na cabeça do ouvinte, mesmo que por curtos momentos, estruturas rítmicas empregadas em canções da Rita Lee.


Um rap agressivo em melodia é o que é apresentado no início de Boas Maneiras. A batida criando um efeito quase de suspiro se une à guitarra de riff distorcido que estimula no ouvinte o movimento involuntário do headbanging. Com picos vocais, a música traz versos cantados de estética comercial que pouco se atrapalham com o tom amplamente melancólico de S2. Melodicamente e harmonicamente, a canção é a mais diferente do disco, razão suficiente por merecer atenção extra por parte do ouvinte. Do começo ao fim, um produto estimulante.


Um eletrônico de extrema cadência toma a frente em 2h (O Baile). Confirmando ainda mais a competência de criar melodias atraentes e envolventes, Siso chega com ritmos de velocidades homogêneos entre vocal e instrumental que envolvem, abraçam e instigam o ouvinte a ouvir a canção sem pensar e se deixar levar pela linha rítmica. 


Um clima de suspense se faz presente na introdução de 10 Mil Pedaços. De letra cujo tom é melancólico e sinistro, o ouvinte se encontra em uma dicotomia de sentimentos. Afinal, enquanto o lirismo transmite sensações de uma estranha tristeza, o ritmo vem com um flerte que mistura o reggae com pitadas de sertanejo universitário.


Assim como em Quando o Amor de 1 Homem é 1 Revólver, A Onda também apresenta sonoridades de elementos percussivos que imprimem cadência e malemolência à canção. Com altos alcances vocais em momentos específicos, Siso recebe a participação, logo a partir do segundo verso, de uma voz encorpada, firme e aguda. É Julia Branco que coloca cores vivas em meio aos tons pastéis tão incansavelmente apresentados pelo timbre vocal de Siso. Na faixa, ainda, o refrão de melodia-chiclete aproxima o ouvinte e o conquista.


De olhos fechados, é como se a sonoridade do início de Our Time libertasse o ouvinte para uma viagem transcendental, algo possível a partir do synth de Luccones Nascimento. Primeira música de lirismo inglês, a faixa apresenta uma tentativa arriscada de Siso em ir subindo gradativamente o tom. No final, a última nota dessa empreitada pareceu desafinada e com traços leves de falta de fôlego. Porém, o ritmo new wave faz o ouvinte esquecer o ocorrido e mergulhar na cadência do beat.


Surpreendentemente, aquela que deveria ser apenas um rito de finalização de Siso se torna um grande produto sonoro. Calcada majoritariamente na estética voz e violão, Depois do Fim da Guerra traz uma estrutura em que o timbre de Siso se encaixa perfeitamente com a melodia de pontos crescentes e arrepiantes. Seu lirismo construtivista e cheio de metáforas ainda tem toques de melismas que enriquecem ainda mais a canção.


Por entre as 10 faixas de S2, o ouvinte presencia o street dance, o eletrônico, traços do rock e do sertanejo universitário. É fato que, à primeira vista, o vocal de timbre melancólico do cantor incomode um pouco o ouvinte, mas conforme as melodias caminham, vai se percebendo uma coesão de tonalidades.


Abrangendo alguns importantes trunfos como Corpo Pra Amar, Boas Maneiras, 2h (O Baile) e Depois do Fim da Guerra, S2 é um produto que consegue se dividir de forma harmônica entre os campos experimental e comercial. Nesse aspecto, tudo depende do ritmo e da melodia, pouco importando a letra.


Versátil até mesmo no idioma, Siso mostrou ter uma boa pronúncia da língua inglesa, o que lhe acrescenta mais pontos. Afinal, de nada adianta cantar em inglês se a dicção não for boa, pois se assim fosse, o ouvinte ficaria confuso e, com grandes chances, pularia para a próxima faixa.


Produzido pelo próprio Siso, o álbum homônimo traz uma arte de capa que apresenta o cantor como personagem central. Feita por Lamounier, Rodrigo Madeira e Nicole Leite, a capa apresenta o vocalista cuja pose remete a elementos egípcios, impressão que cresce por conta da roupa e das cores presentes no ambiente. Apesar disso, de nada a capa parece informar o ouvinte. Afinal, a impressão causada pela arte de capa não prossegue com o título das músicas ou com seus conteúdos líricos.


Lançado em 23 de novembro de 2020 de forma independente, S2 é um disco versátil, mas de digestão um pouco lenta. Sim, ele tem melodia. Sim, ele tem harmonia. Mas é incontestável que o timbre de Siso não agrada às multidões. Por isso mesmo, o produto apresenta uma veia artística maior do que a comercial propriamente dita.


*​Crítica publicada originalmente no Allmanaque.

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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.