NOTA DO CRÍTICO
Psicodelia, experimentação e Noruega. Dessa soma vem o músico norueguês Sturle Dagsland, que se lança no mercado fonográfico internacional com o álbum homônimo de estreia. O trabalho foi anunciado oficialmente após a divulgação prévia de cinco singles.
Uma agressividade incomum invade os horizontes com uma interpretação raivosa e explosiva. É assim que Dagland, com seu vocal rasgado, apresenta Kusanagi, a faixa de abertura do álbum de estreia. Curiosamente, enquanto a faixa caminha para algo que exala calmaria e até algo espiritual por conta da inserção da flauta em sua melodia, Dagsland continua com a mesma veia intensa acompanhada de uma bateria em cujo groove cria uma dicotomia harmônica que incomoda pela forte quebra rítmica, mas sugere um caos proposital.
Se em Kusanagi existe caos e agressividade, em Harajuku há o transcendental, o calmo, o tranquilo. Com forte influência na música indiana, a música tem uma melodia que a faz parecer um mantra não fosse trechos em que Dagsland, com sua voz editada e aguda, lança frases de aparente sofrimento e busca pela redenção.
O caos ganha outro significado em Blót. Até porque, em comparação com o caos apresentado em Kusanagi parece água com açúcar perto do que se tem na presente faixa. Afinal, o que pauta a canção é o thrash metal, algo que surge como um susto após um início tranquilo e ameno.
Depois de uma música amplamente enérgica e avassaladora, um banho de sossego. Tales of Mist, como o próprio nome sugere, é mística em sua melodia inebriantemente calma e transcendental. Talvez essa, até o momento, seja de fato a única música que pode receber o status de mantra.
Aqui em Waif parece haver uma luta entre o eu-lírico e sua má consciência. Afinal, inúmeras vozes surgem como obsessores soprando coisas que, aparentemente, o personagem central luta em não acatá-las. E é aí que mora o dilema, o contraste. A melodia regada em elementos sonoros do Oriente Médio é o artifício que informa o ouvinte qual o caminho escolhido pelo eu-lírico.
Nyckelharpa é, nada mais nada menos, que uma miscigenação rítmica. Afinal ela tem traços africanos ao mesmo tempo em que reutiliza elementos do Oriente Médio. Mas não só isso. A canção tem uma cadência diferenciada das demais. Ela estimula, atrai e instiga o ouvinte a se imergir em sua harmonia. Talvez por isso, a faixa seja aquela que mais atenda aos apelos comerciais.
Essa vertente de melodia harmônica segue com força em Hunter Smulter. uma música que tem toques dramáticos e uma singela influência da música grega, algo sentido pela inserção de instrumentos clássicos e pela batida desenhada pela bateria. Outro ponto importante é que, nessa canção, o conjunto instrumental fica evidente ao ouvinte, o que a torna um produto de degustação leve e de cores mais belas e atraentes.
Frenzy, por sua vez, já é uma música que retoma a agressividade. Mas essa agressividade é diferente, mais controlada. Além do quesito agressivo, há na música uma melodia imergida no rap, pois os versos cantados são falados e tem uma velocidade bastante característica desse estilo musical.
Visceral pode ser uma palavra apropriada para definir Wandering Minstrel. Até porque, a interpretação de Dagsland transmite ao ouvinte sentimentos de tranquilidade, algo fortemente trazido pela sonoridade da harpa, instrumento que banha, com seu som característico, a melodia da canção.
Como se os olhos se abrissem em outra dimensão. Como se o chão não fosse de concreto e o ar tão denso. Como se o céu não estivesse tão distante. Essa é a somatória de sensações e impressões oferecidas por Dreaming, uma música que é como o veludo caminhando pelo corpo nu do ouvinte, transmitindo conforto e, até, proteção.
Como último convite do álbum, Dagsland apresenta Noaidi ao ouvinte. A canção tem um caos, mas nada que se compare a Kusanagi ou Blót. É um caos agressivo que não chega a assustar ou incomodar. Aqui o caos é, puramente, experimental. Até porque a melodia transita entre o calmo, a agressão, o transcendental, o visceral.
É verdade que isso já foi levantado antes, mas visto as descrições, não é ruim repetir. Sturle Dagsland é um álbum pura e simplesmente experimental no sentido mais estrito da palavra, até porque, foi feito apenas por Sturle Dagsland e Sjur, seu irmão. Nele há instrumentos e influências musicais que caminham por toda a bagagem sonora do mundo, com elementos de diversos países e continentes.
E por conta disso, uma coisa que é latente no álbum é o despejar de emoções e sensações antagônicas ao ouvinte. Por isso o caos é uma característica tão presente em grande parte de suas composições.
Essa somatória de influências e sentimentos é como a água. Algo líquido cujo movimento é involuntário. Pode ir ou voltar, estar quente ou frio. Mas não só isso. Esses elementos todos transmitem até mesmo uma confusão interna. É essa ideia do líquido e do estar refém dos sentimentos que está presente na arte de capa.
Lançado em 08 de fevereiro de 2021 de forma independente, Sturle Dagsland é um disco no mínimo cheio. Cheio de elementos, cheio de emoções, cheio de influências. É só esperar a pandemia passar para que Sturle Dagsland possa apresentar o álbum ao mundo com sua turnê até então congelada.