Skillet - Dominion

NOTA DO CRÍTICO
Nota do Público 5 (1 Votos)

Pouco mais de quatro meses depois do anúncio de Victorious, o Skillet, assim como toda a comunidade musical global, se viu afetado pela pandemia do Coronavírus. Porém, mesmo em meio ao vaivém das taxas de contaminação do vírus, o grupo não parou de produzir. Afinal, entre as datas de turnês, seus quatro membros se uniram de maneira remota para elaborar um novo capítulo. Assim nasceu Dominion, o 11º disco de estúdio do quarteto.


Um ruído agudo, mas não estridente, se pronuncia de maneira precisa. Em seguida, um beat eletrônico se confunde entre o sonar agudo e sutilmente aveludado do teclado. Existe um suspense em meio a essa atmosfera em construção, um suspense que beira uma tensão quase angustiante que, de maneira curiosa, emerge de uma melodia que, por ora, nada tem de amedrontadora. É então que uma voz pronunciada através de um timbre digitalizado surge na camada mais superficial da faixa. É John Cooper proporcionando uma narrativa de inspiração bíblica em que ensina como sobreviver ao jogo da vida. Segundo ele, para ser um conquistador, é necessário aprender a gostar da dor. Eis que uma explosão ácida e estridente que mistura elementos do nu metal e do metal alternativo se firma na transição entre a introdução e o primeiro verso, momento em que Cooper assume uma cadência lírica rappeada e recebe a companhia de Jen Ledger nos vocais dando ênfase em alguns versos de efeito. Conforme o ápice vai mostrando sua forma, a canção vai ganhando uma estrutura cativantemente pop que é preenchida por trechos líricos de grande peso como “I’m fightin’, fightin’ for my focus, give the pain a purpose” e “victory’s for the brave ones who never bowed a knee” que vão jogando um curioso e intenso sentimento de empoderamento no ouvinte. Enfim, o refrão chega com uma melodia crescente e chiclete capaz de entreter, atrair e ficar na memória do ouvinte não apenas pela melodia, mas também pelas palavras usadas para desenhar um lirismo de extremo positivismo. Surviving The Game é uma faixa em que, nos momentos de duo entre Cooper e Jen, o Skillet reafirma sua capacidade de combinar elementos sonoros cujas texturas são destoantes entre si, mas simultaneamente complementares. Afinal, o grave e o rasgado se unem ao timbre metálico de notas aveludadas tal como um romance platônico. Dominion vê a luz do dia já com um single carregado de boas energias. Não à toa que Surviving The Game é uma faixa que lança sobre o ouvinte sentimentos esperança, êxtase, ânimo e empoderamento. Um hino de coragem.


Os sintetizadores de Korey Cooper trazem uma sonoridade aguda que imprimem nos primeiros sonares uma ambiência eletrônica latente. Dando passagem para um beat eletrônico que serve de base rítmica para a dinâmica de versos entre Cooper e Jen, ele serve como um suavizar, uma leveza que antecede o épico, o enérgico e o cativante. Tais características são logo percebidas no instrumental transitório entre a introdução e o primeiro verso, momento em que existe uma imersão híbrida no rap-pop a partir dos versos líricos que narram a experiência de um alguém enxergando a janela de acesso ao ambiente obscuro da desmotivação, da falta de propósito e da depressão. Porém, esse mesmo alguém está disposto a receber ajuda para se desvencilhar da negatividade. É como o próprio Cooper entoa em seus versos que simulam um diálogo com a figura suprema da fé: “tell me I’m still breathin’, tell me I’m still feelin’. Resistence makes me stronger”. Por meio de uma mistura rítmica rap-pop com pitadas de hard rock e metal alternativo, Standing In The Storm é, como seus próprios versos sugerem, uma canção de resistência. De empoderamento da alma. Uma alusão perfeita à capacidade de enfrentar as adversidades da vida sem se abalar com pensamentos depreciativos. Em tempos de crise socioeconômicas e sentimentais, o equilíbrio emocional é determinante para manter a cabeça erguida e atravessar o incêndio. Standing In The Storm é confiança. É resistência. Afinal, como o próprio Cooper entoa em seus primeiros versos: “I still got some life in me”.


A guitarra é o instrumento que se pronuncia na camada superficial. Diferente das introduções anteriores, existe uma crescente explosão e agressividade vindas dos acordes pronunciados por Seth Morrison, os quais ganham ainda mais pressão com os golpes firmes de Jen na bateria. Após o balbuciar silábico do nome da faixa feito por Cooper, a canção entra em uma atmosfera suja, grave e distorcida que permite a transição entre os terrenos do grunge e do metal alternativo. Necessário pontuar a notável capacidade de o Skillet conseguir fundir em sua zona de conforto metalizada uma base pop capaz de fornecer uma atmosfera contagiante e atraente que oferece à melodia um ápice de estrutura chiclete com a chegada do refrão. Versos repetitivos e rimados em meio a um ritmo macio e simples fazem com que o ouvinte guarde cada passagem sonora. Apesar de soar, até o momento, como a faixa mais comercial de Dominion, a faixa-título traz consigo uma letra forte que, além de mais uma vez promover o empoderamento social, aborda a enganação generalizada através das fake news e a crítica à cultura do ídolo, algo que está sendo atualmente vivenciada no Brasil a partir da promoção da figura de Jair Bolosonaro.


Doce, melódica, minimalista. Dramática. Assim se apresenta Valley Of Death através das notas singelas do piano e das lágrimas que escorrem por entre a sonoridade sofrida e grave do violino. Essa atmosfera reflexivo-melancólica serve como uma perfeita roupagem para um lirismo que carrega em suas entranhas o lamentar analítico da atual situação vivenciada pela sociedade global. Um momento preenchido por escuridão capaz de fazer com que os sonhos escapem ao primeiro piscar de cada individuo. Um momento em que, nas próprias palavras de Cooper, “love became a shadow”. No entanto, ao mesmo tempo em que existe uma forte tristeza e um duelo entre fé e descrença, existe uma interpretação reconfortante de que tudo o que está acontecendo está dentro de um plano divino. É por isso que o eu-lírico se entrega à vontade da figura máxima da divindade e se rende dizendo “you’re the light to guide me when I’m lost and can’t see”. Valley Of Death é certamente aquela faixa em que as lágrimas do ouvinte assumem liberdade para seguirem seu fluxo perante a face entorpecidamente emocionada do ouvinte. Uma composição que traz a fé como escudo e discute o desânimo como uma zona de conforto maleável.


Sintetizadores, subgraves e notas agudas de um teclado metalizado. Eis uma atmosfera sutilmente eletrônica. A melancolia continua em seu momento de brilho enquanto o eu-lírico apresentado duela, assim como em Valley Of Death, com sentimentos depreciativos e busca por um apoio, por um estímulo capaz o suficiente de fazê-lo levantar e enfrentar as emoções tristes que dominam suas entranhas. O refrão, por sua vez, assim como na faixa-título, vem imerso em uma base pop que refresca até mesmo a estrutura de Back From The Dead, outra faixa de autoria do Skillet e incluída no álbum Unleashed. Ao mesmo tempo, o sonar transitório entre o refrão e o início da segunda estrofe traz consigo um repentino parentesco com a base melódica de Generation, single do Simple Plan. Fora as assimilações melódicas, Beyond Incredible é aquela faixa que, tal como na faixa anterior, se apoia na fé como um tripé que proporciona a superação. 


Leveza. O vocal grave e áspero de Cooper é acompanhado, de maneira singela e tranquila, por uma guitarra que, apesar de distorcida, possui suas notas espaçadas, o que, por si só, transite um breve momento de paz e maciez. Apesar de nos primeiros versos o eu-lírico fazer um autoquestionamento se existe um local em que se possa se despir das memórias negativas e onde a escuridão não seja seu próprio destino, Jen se posiciona como a voz da consciência e, a plenos pulmões, responde à pergunta entoando “this is my destiny”. Eis então que a melodia assume o mesmo efeito eletrônico-áspero crescente utilizado em Back To Live, faixa do Skillet inclusa no álbum Victorious, e entra em uma atmosfera enérgica, grave, ríspida e densa que caminha livremente por entre os terrenos do nu metal, metal alternativo e do hard rock. Nesse momento, Cooper assume o papel da figura divina questionando as próprias vontades e desejos do eu-lírico. Enfático, o diálogo assume ares de uma seriedade latente que analisa as características mais intimas do personagem central da faixa. O pré-refrão é o momento em que ele, interpretado por Jen, se conscientiza de suas vontades e responde aos questionamentos e faz o autoquestionamento “how did I get so far from home?”. Assumindo uma melodia macia, intensa e contagiante, Destiny se prova uma faixa visceral, emotiva e propriamente penetrante que encanta por seu teor quase biográfico de uma sociedade aquém da esperança.


Macia, melancólica e de tons dramáticos. A faixa surge sob uma base rítmica que, imersa em intensa sutileza e delicadeza, pende para o indie rock de maneira a ser capaz de oferecer ao ouvinte uma mistura de sentimentos que vão desde proteção a aconchego. Refuge é uma canção que traz em seu lirismo um enaltecimento do poder da fé e da figura de Deus como um ser onipresente e protetor. É como um mantra que espanta o medo e estimula a recuperação da confiança, da força e da autoestima. Apesar de simples em melodia, Refuge tem o diferencial de conseguir capturar a emoção do ouvinte ao acessar os sentimentos mais íntimos que tangenciam o temor, a insegurança e a fragilidade.


Existe uma mistura de emoções que beiram o conforto e uma leve tensão. Em verdade, a sonoridade extraída do sintetizador é quase como observar a luz do Sol rompendo a barreira de uma conjuntura de nuvens densas e escuras. De repente, a guitarra distorcida em união com o beat da bateria traz consigo toques de swing revigorantes e levemente excitantes para um ambiente anteriormente repleto de melancolia. Não para menos, a canção vem acompanhada de um lirismo que estimula o ato de assumir as próprias características, a atitude de mostrar a verdadeira identidade. Indubitavelmente Shout Your Freedom é um single lado b enérgico que oferece um ânimo mais palpável diferente daqueles emaranhados por sentimentos melancólicos como aconteceu no quarteto de músicas sequenciais Valley Of Death, Beyond Incredible, Destiny e Refuge


Apesar dos primeiros instantes serem como mantra, uma abrupta mudança acontece na segunda metade da introdução, quando a canção assume uma melodia ríspida, grave e de intensa distorção que acaba tangenciando o escopo do doom metal por rápidos instantes. Preenchido por um groove sombrio estranhamente cativante,  Destroyer é até o momento a canção que foge completamente do viés de uma melodia sutil e delicada. Afinal, sua densidade traz consigo um caráter mais sombrio e metalizado que chega a surpreender pela ousadia. Essas constatações a fazem, inclusive, a assumir um caráter melódico semelhante àquele impresso pelo Disturbed em suas respectivas canções, em especial ao do single Are You Ready. Com forte e marcante presença do baixo na estrutura rítmica, Destroyer é uma faixa que foge inclusive dos temas e das perspectivas anteriormente adotadas em Dominion


Se em Destroyer existe uma agressividade sem precedentes, as rédeas da sutileza e do positivismo são reassumidas em Forever Or The End. Enquanto a guitarra solo assume a dianteira sob um riff doce, a guitarra base é ouvida ao fundo com uma distorção controlada e precisa. No desenho lírico interpretativo, Cooper vem com um tom narrativo que se complementa com o vocal delicado e de uma sensualidade curiosamente reconfortante de Jen. De melodia minimalista em elementos, mas grandiosa no cardápio de sensações que oferece ao ouvinte, Forever Or The End é uma faixa com força suficiente para ser inclusa, ao lado de títulos como Surviving The Game, a faixa-título, Refuge e Standing In The Storm, no time de singles oficiais de Dominion. Afinal, ela é emocionalmente encantadora e angelicalmente melódica que traz novamente o eu-lírico em um diálogo aberto com Deus na tentativa de entender como merecer o orgulho do Criador.


De volta para um ambiente metalizado, cheio de pressão, distorção e um leve swing, Ignite traz consigo uma continuação para a melodia de faixas como Destiny. No entanto, existe entre os ingredientes da sonoridade em ebulição uma mistura de elementos que vai do post-grunge ao rock alternativo e que se deleita sob uma base pop assim como acontece em Surviving The Game, a faixa-título e Beyond Incredible. Cativante e sedutora, Ignite tem em sua superfície melódica mais evidente o hard rock e vem preenchida de um lirismo enérgico que observa o ano de 2021 como um período conturbado devido à explosão da pandemia. Por outro lado, é uma letra que representa todos os anseios pela vida e pela libertação dos medos carregados pela sociedade. Como o próprio Cooper entoa, “I ignite all of the pain I take ‘cause I refuse to break”.


É como se estar marchando vendado. Não se sabe para onde ou para quê está sendo levado, mas a sonoridade indica algo tenso. Existe uma densidade e uma expectativa curiosamente masoquista na melodia introdutória, algo que mostra o caráter incógnito da canção em construção. Baseada em uma estética rap, White Horse é a perfeita metáfora da salvação, de uma figura salvadora que surge para auxiliar o povo ingênuo, instintivo e sensitivo a buscar a melhoria individual e comunitária. 


Difícil encontrar um disco repleto de hits. Porém, essa atividade encontra um alento quando o Skillet apresenta ao mundo Dominion. De suas 12 músicas, Forever Or The End, Surviving The Game, a faixa-título, Refuge, Ignite e Standing In The Storm são singles inquestionáveis. Enquanto isso, Shout Your Freedon garante o lugar de single lado b junto de Destroyer.


O feito dessa façanha se deve, primeiramente, ao perfeito equilíbrio de agressividade, leveza e doçura. Em seguida, se deve à evidente entrega dos músicos, mesmo os novatos Seth Morrison e Jen Ledger, os quais, com Dominion, completam quatro discos afrente do Skillet


Nesse aspecto, é interessante notar como a sincronia de timbres vocálicos existente entre Cooper e Jen proporcionou e continua proporcionando uma identidade rígida ao espectro sonoro do grupo. Constatação fica evidente desde faixas como Rise, Not Gonna Die, Salvation, What I Believe, Feel Invencible, I Want To Live e Stars às recentes Surviving The Game, Standing In The Storm, Beyond Incredible e Forever Or The End.


Do lado rítmico e melódico, o presente álbum possui um cardápio híbrido por atender aos anseios tanto dos apreciadores do hard rock quanto os adoradores de subgêneros como post-grunge, nu metal, metal alternativo e rock alternativo. 


Necessário salientar que, no quesito sonoro, ainda, o casal Cooper, ao lado de Jen e Morrison, fez o mesmo feito que Kurt Cobain, Krist Novoselic e Dave Grohl realizaram em Nevermind, álbum do Nirvana: sujou a sonoridade ao máximo para esconder a base pop existente em grande parte das canções. Ainda assim, o gênero fica evidente em faixas como Surviving The Game, Standing In The Storm, a faixa-título, Beyond Incredible e Ignite.


Sob o comando da produção de Kevin Churko, Dominion se mostra metalizado de maneira a ter uma sonoridade semelhante àquela exposta por bandas como Shinedown, Evanescence, The Pretty Reckless e Disturbed. Pelas mãos de Churko, essa aspereza se funde homogeneamente ao rock cristão, subgênero presente nas entranhas de cada verso melódico e que é responsável por desenhar a maciez e a serenidade típicas do som do Skillet.

 
Lançado em 14 de janeiro de 2022 via Atlantic Records, Dominion certamente reconquista o brilho alcançado pelo Skillet em Comatose, chegando a até mesmo ultrapassá-lo. Um disco que ensina a ter fé e a confiar na máxima de que tudo tem um motivo para ser e estar. Um disco que, simplesmente, celebra a liberdade em sua máxima significância.

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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.