Semisonic - Little Bit Of Sun

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Parecia não haver retorno, mas o público foi surpreendido. Depois de 22 anos de hiato, o Semisonic anuncia seu retorno com o primeiro material de inéditas desde All About Chemistry, seu terceiro e até então último disco de estúdio. Intitulado Little Bit Of Sun, material foi gravado em Minneapolis, cidade natal do grupo.


O violão surge, macio e doce, mas com um curioso e contagiante perfume bucólico. Sem demora, e entre a linearidade ondulante da melodia, Dan Wilson surge com sua voz iconicamente rouca com notas adocicadas. Tomando silhuetas de uma paisagem ensolarada conforme os tilintares do pandeiro vão sendo percebidos introduzindo o tempo rítmico, a faixa-título se completa quando a bateria de Jacob Slichter entra em cena dando um norte ao maturado folk que se evidencia na sonoridade. Com rompantes de uma maciez amornadamente solar, a guitarra dá à canção um ar esperançoso e estimulante enquanto, da faixa, se extrai a narrativa de um personagem imerso em depressão e que luta para conseguir superar suas particulares dores. No anseio por ajuda para superar seu êxtase deprimente, o indivíduo tem consciência de sua condição e admite que consegue enxergar filetes de esperança vindos do horizonte.


Fresca, macia e contagiante. Logo de início, aquele Sol de meio de tarde invade a janela e convida o ouvinte para sair e sentir a brisa a partir de uma melodia estimulante estruturada entre guitarra e bateria. Capaz de incitar a nostalgia no ouvinte por meio de sua sonoridade, a canção se torna marcante pela sua doçura e estrutura jovial que, entre os tilintares sincopados do sonar do piano vindo do teclado de John Munson, apresenta pitadas felizes de boogie-woogie. Com direito a backing vocals adocicados e sonares de trompete aprimorando a melodia do refrão, The Rope surge como uma música alegremente chiclete que consegue tirar facilmente sorrisos dos rostos dos espectadores. Enquanto isso, a faixa os convida para mergulhar em um enredo que, inicialmente, soa como um banho de culpas, arrependimentos e memórias após o fim do relacionamento. Porém, ela é, na verdade, uma nostálgica ode à cidade de Los Angeles. E é aí que o Semisonic surpreende. Afinal, ele se utiliza de uma narrativa saudosa da cidade dos anjos como uma metáfora à própria realidade da banda, que permaneceu separada por um longo período, mas quando reativada, pareceu como se o tempo não tivesse passado, e a química, o entrosamento e a sincronia permaneceram intactos. The Rope é uma doce e emotiva representação melódica de um forte abraço de reencontro.


Amaciada e com um corpo naturalmente sensual graças à evidência robusta, mas delicada, do baixo, a melodia oferece ao ouvinte um contagiante sabor açucarado que transita entre o folk e um embrionário hard rock oitentista. Apesar da sonoridade convidativa de seu despertar, Grow Your Own acaba tomando um curso melancólico e nostálgico enquanto parece relembrar os primeiros anos do grupo. A ânsia de fazer música, de encontrar seu caminho, sua motivação, seu propósito e de saber que o showbiz pode ser um sonho possível, fez com que o conjunto nascesse, se estruturasse e atingisse certo grau de fama. Soando, portanto, como um material autobiográfico, Grow Your Own, com seu refrão chiclete, também traz um viés de amadurecimento e de perseverança. Simplesmente, uma música motivacional que incita e ensina a lutar e a não desistir de seus sonhos.


É como estar andando de carro em uma estrada de terra em um entardecer primaveiresco. Enquanto a velocidade segue seu curso, o vento que invade o interior do automóvel é banhado por reconfortantes frescor e aromas florais. A tranquilidade é o que rege o momento a partir de um violão de riff delicado e generosamente reconfortante. Por meio de sobreposições vocais tão singelas que chegam a soar como um duplo sussurro, Don’t Fade Away apresenta ao ouvinte um folk esteticamente minimalista, mas cuja simplicidade recria a mesma energia disposta tanto na trilha sonora de Into The Wild quanto na canção To Leave Something Behind, single de Sean Rowe. Crescendo em harmonia a partir da entrada do ukulele e do chocalho delineando o compasso rítmico, Don’t Fade Away possui adoráveis toques bucólicos em sua narrativa sobre a reconexão com o simples e a consequente fuga das grandes cidades, sua rotina acelerada e governada pelo relógio.


Contagiantemente serena e com uma fluidez reconfortante, macia e amorosamente convidativa. A nova canção é como estar no topo de uma colina em um anoitecer, ao lado da pessoa amada, fazendo juras e reverências ao amor. Romântica, All The Time, conforme vai atingindo seu ápice, oferece, também, a partir da delicadeza do piano, uma harmonia tocante cuja estética se assemelha àquela de Rocket Man, single do Elton John. All The Time é uma canção em que o personagem se vê na tentativa de se satisfazer ao lado da pessoa por quem nutre uma paixão, mesmo com as imperfeições comportamentais que apresenta.


Mantendo o frescor como ingrediente base de sua melodia, o novo horizonte traz protagonismo do baixo e sua base grave e groovada já durante a introdução. Floral pelo riff melódico emanado pela guitarra na superfície sonora, Keep Me In Motion aposta apenas na união da bateria e do baixo como elemento a entregar ritmo durante os versos de ar. Com um clima de entardecer de verão, a faixa apresenta um indivíduo percebendo sua ausência de vivacidade e, a partir disso, assume a necessidade de auxílio para recuperar o gosto pela vida. “I just need a spark. Keep me in motion, don't let me go”, pede ele com densa honestidade sofrida.


Ele traz uma maciez curiosamente nauseante. A fusão entre os tilintares vindos das teclas da celesta com o riff de teor azedo da guitarra sugere uma delicadeza sonoramente desconfortante pelo seu suave azedume. Construindo uma melodia semelhante àquela de Immitation Of Life, single do R.E.M., If You Say So, com sua energia acústica, parece ser uma espécie de reflexão, uma súbita percepção pelas vivências ocorridas durante os áureos tempos do Semisonic. Os sucessos, as viagens, os shows, os lugares visitados, as brigas, as reuniões de composição. If You Say So soa como a saída de uma hipnose e a assimilação de várias experiências vivenciadas. Não à toa que o personagem diz “could it all have really happened? It feels so long ago. Could it all have really happened? I guess it did if you say so”.


Um swing contagiante é oferecido através de um amanhecer alegre calcado na sincronia entre piano, bateria e a guitarra solo de Jason Isbell. A melodia que deles se constrói bebe de uma curiosa fusão entre blues, folk e raspas de jazz. Com um vocal mais estridente, Wislon logo começa a desenhar as linhas líricas de Out Of The Dirt, enquanto a sonoridade mais se mantendo em um sonar linear. Ainda assim, sua estrutura contagiante faz com que o ouvinte siga atento ao seu lirismo reflexivo de que a vida é cíclica a tal ponto que parafraseia Eclesiastes em sua fala do pó viemos e ao pó retornaremos. Ainda, Out Of The Dirt se apresenta como a saída do universo da fantasia, da ilha dos sonhos, para um mundo racional e realista.


Sua textura é macia e sua paisagem, praiana. Porém, a melodia introdutória oferece uma entorpecente sensação hipnótica, como se a mente estivesse sendo dominada por outra pessoa. Graças ao assobio ecoante, essa impressão segue viva até o momento em que a caixa da bateria é golpeada duas vezes seguidas, proporcionando uma dupla estridência e um chamado de volta à realidade. Perante sua levada 4x4, It Wasn’t Like We Hoped It Would Be traz uma sinergia marcante entre ukulele, bateria e baixo, sendo que este, tal como foi em Keep Me In Motion, possui superior destaque. Despropositadamente nauseante, a faixa é uma exortação e um alívio perante a reaquisição do senso de liberdade após um período global e pandemicamente conturbado.


Serena e com toques adocicados, a canção nasce branda, mas, rapidamente, cresce e apresenta seu ápice. Mantendo a maciez, o dulçor e inserindo mais notas de frescor, So Amazed é uma canção de estrutura rítmico-melódica e lírica simples, mas capaz de contagiar o ouvinte. Surpreendentemente, a canção é a primeira de Little Bit Of Sun a oferecer um enredo propriamente motivacional. Afinal, aqui o Semisonic, além de empoderar, propõe um novo olhar sobre o indivíduo. Um olhar de satisfação, de orgulho, de responsabilidade. Assumir suas querências e valorizar a vida que se tem são outros importantes trunfos encontrados em So Amazed.


Amaciadamente contagiante em sua serenidade educada, a canção vem com uma fluidez inquestionavelmente atraente em que o baixo se torna o elemento a inserir uma textura mais racional à densa suavidade sonora. Only Empathy se torna tocante a partir do momento em que um backing vocal feminino cuidadoso surge nas sombras de Munson. Lori McKenna entra em cena inserindo, com sua interpretação vocal, extrema delicadeza e compaixão, deixando a canção transcendentalmente reconfortante. Com direito a singelas valsas de violino, Only Empathy é uma canção cheia de dulçor e cujo lirismo é repleto por interpretações baseadas em serenidade. Afinal, como o próprio nome sugere, a música vem com a tarefa de mostrar ao espectador que a empatia é um sentimento, uma qualidade que pode suavizar o coração por fazer entender que nem sempre se pode resolver tudo sozinho. A empatia, aqui, é um personagem onipresente sedento por invadir a essência do protagonista, alguém que, apesar de se vender benevolente, é regido por impulsos que contradizem a capacidade de se identificar com o outro.


Com um riff linearmente ondulante, a guitarra vem solitária por breves momentos da introdução até ser acompanhada pelo vocal. Formando uma melodia curiosamente valsante, cujo movimento rememora aquele presente na sonoridade de No One, singe de Alicia Keys, Beautiful Sky traz uma delicadeza diferenciada em relação às outras canções. Desenhada sob uma base blues, ela cresce em harmonia a partir da segunda estrofe, momento em que a bateria, o violino, o fender rhodes e uma conjuntura de instrumentos de sopro se unem, formando uma sonoridade tocante e delicadamente dramática. Explodindo em um refrão generoso, educado e sereno em sua melodia respeitosa, Beautiful Sky, mais do que Keep Me In Motion, propõe uma motivação pela vida, enquanto ensina o ouvinte a ver a beleza do viver e a entender que os momentos ruins são passageiros. Trazendo um indivíduo imerso em escuridão, Beautiful Sky lhe mostra como ter perseverança suficiente para se manter erguido no rumo da existência com auxílio do backing vocal de Jim James.


Seria muito dizer que esse foi um retorno triunfal. Contudo, o Semisonic propôs uma reunião em um momento em que o mundo precisa de calmaria, conforto, paz e suavidade para tentar se reconectar consigo mesmo e com a simplicidade. Little Bit Of Sun chega, então, não apenas oferecendo um horizonte transcendentalmente relaxante, mas um frescor capaz de reequilibrar as energias e uma generosidade suficiente para amaciar os corações.


Baseado em melodias simples, mas densamente delicadas, doces e frescas, o álbum não comunica, em suas canções, apenas enredos líricos baseados em uma espécie de egocentrismo a partir da reconexão entre Wilson e Munson. É verdade que essa reverência também está presente no material, mas como uma pequena parte de sua narrativa, estando presente apenas em The Rope e em If You Say So.


Por isso, os destaques recaem sobre propostas motivacionais, como aquelas de Grow Your Own,  Keep Me In Motion, So Amazed e Beautiful Sky; românticas como em All The Time e Gentis como Only Empathy, apenas para ofertar alguns exemplos. Assim, o álbum se torna múltiplo em suas intensões, mas não variado em sua energia melódica.


Com esse viés motivacional e sereno, o Semisonic fez com que Little Bit Of Sun trouxesse uma extensa sensação de calmaria através de suas melodias. Assim, com auxílio da produção de Wilson, o álbum chega a representar aquilo que tem de mais tranquilo no mundo a partir de melodias indie rock, pop rock, power pop, boogie-woogie, blues, jazz e folk.


Lançado em 03 de novembro de 2023 via Pleasuresonic Recordings, Little Bit Of Sun é, acima de tudo, um álbum leve e fresco. Charmoso em suas estruturas adocicadas, florais e bucólicas, o material tem gosto de reencontro e oferece extensas sensações de bem-estar e estímulo. Um álbum feito para equalizar os sentidos e lembrar que a vida é bela nas suas nuances simplistas.

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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.