Low Levels Of Serotonin - In The Entrails Of My Mind

NOTA DO CRÍTICO
Nota do Público 5 (1 Votos)

Com cinco anos de vida, o Low Levels Of Serotonin, projeto idealizado pelo multi-instrumentista Wilian Gonçalves, alcança um novo capítulo em sua jornada musical. No meio do primeiro semestre, In The Entrails Of My Mind, o sucessor de Katharsis, foi oficialmente lançado.


Um alvorecer dramático evidencia uma paisagem triste, sofrida e repleta de arrependimentos calados. O horizonte traz ventos de uma lembrança sentimental há muito escondida entre torpores autoimpostos que constroem uma falsa noção de conforto. Esse é o cenário desenhado a partir das notas longas e gélidas do teclado acompanhadas por um sonar de um leve gutural trazido pelo sintetizador na coxia rítmica que, de súbito e de maneira drástica, como se tivesse dado certo erro na continuidade sonora, para. É então que, como um susto, a bateria entra trazendo mais peso e movimento amplificando a dramaturgia melódica. Criando um movimento macio, mas ao mesmo tempo preciso, a bateria consegue proporcionar, em Intro, uma ambiência amorfinada e de embriagante melancolia.


Uma melodia macia, chorosa e de forte melancolia surge no horizonte. Apesar de ser acompanhada por sobreposições de guitarras em riffs graves, existe na sonoridade algo que soa como um pedido de ajuda, uma ingenuidade que aproxima o ouvinte pela honestidade emocional que exala de cada esquina rítmica que preenche a introdução. Curioso, nesse aspecto, é ver a forma como o sentimentalismo vai sendo evidenciado de maneira a expurgar toda a tristeza acumulada a partir de uma guitarra solo melódica e lacrimosa que se sobressai perante uma base adensada em algo propriamente mais doloroso e palpável. É então que uma voz grave e com pitadas agudas entra no cenário e completa as linhas melódicas. É Tiago Tzepesch trazendo estridência e uma narrativa introspectiva sobre a vida de maneira a extravasar a desilusão abraçada por uma generosa dose de depressão. O Último Anseio é a descrição da perda de esperança e de energia suficiente para manter o corpo ereto e encarando o horizonte com olhares firmes.


Existe uma doçura imersa entre uma dramaturgia intensa que se propaga pela melodia que se inicia. Jorrando jatos de cores gélidas e até mesmo místicas, a sonoridade traz em si uma estranha noção de reenergização e motivação. De instrumental mais bem estruturado, regido por guitarras mais firmes e ásperas que dividem espaço com uma bateria de pedais duplos e regência ainda mais precisa, tal melodia serve de cama para um vocal áspero, rasgado e com raspas de um gutural dormente. É a partir dele que My Piece Of Shade ilustra um personagem lírico que se vê em intensos diálogos com os sofrimentos de um passado já vivido que o fazem perceber a brutalidade de sua essência. É quase como uma canção de autoconhecimento que leva à percepção de certo orgulho ferido, o qual promove pensamentos negativistas intensos.


Um explosivo uníssono sonar carrega consigo a melancolia, ingrediente que, a essa altura, se mostra ser algo típico e institucional da sonoridade do Low Levels Of Serotonin. Com direito a uivos vocálicos e um vocal limpo com raspas de um azedume adormecido trazido por Gonçalves que introduz o lirismo de maneira a amplificar a noção de torpor, Lost In Time tem seu devido despertar. Com direito a um piano que amplifica as noções dramáticas com suas notas intermediárias e gélidas que introduzem um movimento mais palpável, a faixa passa a ser guiada por uma interpretação lírica mais grave vinda de Gonçalves que induzem o ouvinte ao acesso do campo da reflexão. Tendo a precisão e a densa marcação do baixo na base rítmica como protagonista sonoro nos versos, Lost In Time recebe um grito rasgado e rouco. É Douglas Martins fazendo a ponte para um instrumental dramático, intenso, melancólico e de ambiência gutural que casa com o enredo lírico que reflete sobre a vida em seu estado fluído. De outro lado, Lost In Time oferece uma visão nostálgica e melancólica a respeito da rapidez do tempo e como o viver consegue acontecer depressa sem que nos deparemos com o passar do tempo. No fundo, a faixa é uma balada nostálgica que tenta educar o ouvinte a aproveitar o momento presente.


É como o a luz do Sol reavivante surgindo no horizonte após uma madrugada de tortuosa tempestade. É como um sorriso frouxo após longos períodos de temor e insegurança. É como a risada solta após um intenso momento de seriedade. Alegre e reenergizante, a melodia introdutória surpreende por apresentar uma energia de vida preenchida por cores quentes. Isso acontece graças à afinação e à valsa sincrônica desenhada entre as guitarras durante a introdução, que flui para um ambiente melódico, melancólico e nostálgico. Em meio a tal paisagem de beleza desenhada no despertar, se vê uma pessoa vindo com os olhares embriagados em lágrimas de emoção e com os braços largamente abertos. Eis que ele é recebido por abraços acalorados, beijos dissincronizados e sorrisos dos mais variados tamanhos. Com as lágrimas enfim tomando seu curso, o olhar do indivíduo assume postura de satisfação e de uma felicidade há muito sonhada. Coming Home é um instrumental melódico na mais pura essência da palavra cuja narrativa consegue desenhar um enredo nostálgico de retorno ao lar, às raízes, ou, ainda, ao acesso da própria essência do indivíduo. Tal roupagem sonora dá uma distanciada necessária das energias melancólicas e até mesmo mórbidas que foram oferecidas até o momento. Por isso, mais do que uma espécie de interlúdio, Coming Home é uma balada aconchegante que exerce a função de um importante single de In The Entrails Of My Mind.


Depois de uma atmosfera que permitiu um suspiro de alívio e certa limpeza emocional das sensações que feriam o interior do indivíduo, a melancolia retorna com uma sonoridade grave e, novamente, dramática. Com o auxílio do vocal igualmente grave e gutural de Guilherme Malosso, a canção vai evidenciando um lirismo trágico que parece narrar o período de inseguranças, incertezas e impotência fornecido pela pandemia do Coronavírus, com especial menção ao recorte temporal do isolamento social. Oferecendo uma quebra rítmica ao ouvinte, Hazy Days traz um refrão de andamento sutilmente mais acelerado que, com um urro gutural, da passagem para um instrumental puxado por golpes sequenciais no bumbo, o que deu à melodia uma pressão trotante.


Uma melodia de alegria entorpecida começa a ser desenhada entre guitarras e bateria. Promovendo uma excitação constante e insaciável, sensação nova a ser promovida em In The Entrails Of My Mind, melancolia se mistura com torpor. A nostalgia se mistura com esperança e a tristeza, com o ânimo. Essa dicotomia emocional permeia uma introdução tão melódica quanto o instrumental penetrante de Coming Home, uma espécie de miragem que se dissipa rapidamente a partir do emprego de pedais duplos que informam uma divisão estética. É aí que um ambiente mais sombrio surge guiado pelo vocal bruto e gutural de Malosso que fica em evidência perante uma base rítmica com menos dramaticidade e mais punch graças aos compassos bem marcados pelo emprego sequencial de pedal duplo. Inner Blast é uma canção que mistura o vazio e uma espécie de transformação e amadurecimento pessoal sob uma roupagem rítmica que flerta, ainda, com o death metal. Outro importante single do álbum.


A melancolia e o drama atingem seu ápice através de uma melodia em cadência demasiadamente lenta e de sonoridade grave. A tristeza, inclusive, é outro sentimento que insurge a partir das esquinas sonoras junto de momentos de profunda nostalgia entorpecida. Ajudando a dar peso a essa dramaturgia está Gonçalves, que retorna com seu vocal limpo para dar uma introdução quase fabulesca ao enredo lírico em processo de despertar. Contudo, a sobreposição com o vocal rasgado e azedo de Martins dá uma noção curiosamente fantasmagórica que preenche o ambiente. Silent Rhymes Of Sorrow é uma canção que dialoga sobre arrependimentos, sobre memórias de coisas não feitas e de um lento processo de ausência de empatia e compaixão. É o som de uma alma triste presa em profundos remorsos.


É o drama sonorizado. É a melancolia em essência. É o torpor como chamariz. É a tristeza como zona de conforto. É a nostalgia como conforto. In The Entrails Of My Mind é um álbum introspectivo que se perde em meio a ambientes de plena morbidez que dialoga, principalmente, sobre emoções angustiantes de um aconchegante mergulho depressivo.


Trazendo uma mistura de brutalidade e azedume a partir do misto entre doom metal e death metal, o álbum é marcado por andamentos lentos e bases rítmicas que exalam grandes doses de drama. Funcionando como dialogo introspectivo entre eu-lírico e os devaneios emocionais de sua própria mente caoticamente perdida entre dicotomias sentimentais, o disco ainda traz, entre músicas em português e um inglês bem pronunciável, surpresas ao ouvinte.


Tais surpresas recaem sobre ambientes que misturam alegria e excitação, sentimentos amplamente esquecidos no decorrer de In The Entrails Of My Mind. Encontradas principalmente no instrumental de bela e enérgica melodia Coming Home, tais emoções podem também ser percebidas durante a introdução de Inner Blast e na reflexivo-nostálgica ​Lost In Time.


Importante notar que todo o escopo sonoro entra em mérito de Wilian Gonçalves, responsável por transpor os vários sentimentos conflitantes em seu interior em melodias que falassem por si mesmas. E o resultado foi possível por que Gonçalves, além do único músico em todo álbum, foi também aquele que executou tanto a mixagem quanto a produção do disco.


No quesito mixagem de In The Entrails Of My Mind, poucas coisas ficaram a desejar, as quais são notadas a partir de um som mais opaco e uma aparente falta de lapidação nos encaixes sonoros em Intro. No quesito produção, porém, não há o que dizer. Afinal, todas as músicas seguem o conceito de introspecção e dialogo sobre os ambientes internos do indivíduo.


Fechando o escopo técnico do álbum vem a arte de capa. Assinada por Pro_tayyabah, ela traduz perfeitamente o título do álbum, como se fosse o reflexo no espelho. Com uma paisagem sombria e densa como plano de fundo, ela traz, em destaque, o contorno do perfil de uma mulher sendo consumido por ligeiras faíscas espalhadas pelo corpo. Porém, é na cabeça que mora o destaque. Com o crânio aberto, se percebe um vazio estrutural e existencial, lar de um grupo de corvos, pássaro popularmente interpretado como sinal místico de maus pressentimentos. Tal contexto casa bem com todos os enredos líricos que permeiam o álbum.


Lançado em 28 de abril de 2022 via Heavy Metal Rock, In The Entrails Of My Mind é um disco bruto em sua análise emocional. Dramático em suas melodias. Triste em sua essência e nostalgicamente reconfortante. É a morbidez de uma mente sentimentalmente conflitante.

Compartilhe:

Cadastre-se e recebe as novidades!

* campo obrigatório
Seja o primeiro a comentar
Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.