Jukebox The Ghost - Cheers

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Depois de um hiato de quatro anos sem o lançamento de um material inédito, o power trio de Washington DC Jukebox The Ghost enfim anuncia novo trabalho. Intitulado Cheers, o álbum é o sucessor de Off To The Races e assume o posto de sexto disco de estúdio do trio.


A voz de timbre adocicado de Ben Thornewill entra em cena sem delongas. Sua essência já conota uma textura melódica indie assim como acontece com nomes como Alex Turner, Luke Pritchard e Brandon Flowers. O interessante é que, para a construção melódica, o Jukebox The Ghost não se utilizou de instrumentos musicais. Em Century In The Making (Intro) é o backing vocal uníssono de Thornewill e Tommy Siegel que se responsabiliza pela sonoridade, resultando em uma ambiência cinquentista cativante. Mesmo com a entrada adocicada do teclado e do violino que traz uma pitada dramática, a grandiosidade da harmonia recai sobre o backing vocal. Century In The Making (Intro) é definitivamente uma introdução que provoca o ouvinte a querer saber mais sobre o que Cheers oferece.


Um som agudo e floral de flauta surge quase como se estivesse criando uma trilha sonora para contos de fadas. Sob uma atmosfera flutuante, Thornewill surge como um narrador em primeira pessoa de palavras suaves que, de súbito, assumem mais pronúncias mais precisas. Ao som dos golpes uníssonos da bateria de Jesse Kristin e da guitarra de Siegel, a melodia engata uma cenografia indie dramática que persiste até o refrão. Hey Maude se apresenta como uma canção de amor não convencional, pois ela traz o homem como o personagem a se ver perdido de amor e a mulher como aquele que engana e não corresponde por tal sentimento, ou, ao menos, não na mesma intensidade.


O piano vem com leveza, mas precisão. Suas notas transitórias entre o grave e o agudo sugerem uma narrativa penetrante e floral, o que é reforçado com a entrada do som do violino de maneira crescente na coxia sonora. Fluindo para uma roupagem pop, a canção é abraçada por uma sonoridade linear, mas curiosamente com diferentes texturas de um dulçor não tão açucarado. De refrão chiclete, Wasted dialoga sobre amadurecimento, crescimento interno e, ao mesmo tempo, funciona como um enredo de profunda nostalgia da juventude cuja segunda metade é descrita pela voz agridoce e nasal de Andrew McMahon.


O baixo serve de cama. O pandeiro, de guia. É assim que a melodia se apresenta: com um minimalismo que já proporciona uma ambiência atraente e cativante que, logo de início, apresenta seu personagem central. De cadência melódica ondulante, a canção tem cores pops que se misturam com o indie rock de maneira a trazer aromas frescos à sua conjuntura. Penetrante, Ramona é uma música que descreve um personagem refém da insegurança, de uma nascente depressão e de medo do mundo. É interessante notar que a trajetória lírica não possui dramaticidade ou melancolia. O que ela faz é apresentar os dois lados do íntimo do indivíduo, pois em dado momento ele está confortável em se sentir reprimido, mas de outro, ele deixa a luz do dia entrar e assume uma guinada positivista. Ramona é uma canção contagiante sobre a superação dos próprios medos.


O piano surge em um conjunto de notas uníssonas e compassadas criando uma melodia trotante. “Million dollar bills”, repete um coro de três vozes formado pelos integrantes do Jukebox The Ghost. Eis que, enquanto o piano segue sua insistente linearidade, basta unicamente à bateria a função de criar o compasso rítmico da canção durante os versos de ar. É interessante notar que, em Million Dollar Bills, o trio de Washington traz um enredo que funciona como se o dinheiro fosse o personagem central e estivesse falando com todas as pessoas. Como uma música que aborda o capitalismo como indireto tópico vindo do consumismo e da futilidade, ela é como uma resposta à famosa frase ‘dinheiro não traz felicidade’. Contudo, de maneira crítica e irônica, Million Dollar Bills apresenta, sob um terreno indie pop de refrães de sonoridade ácida, uma realidade como se sim, o dinheiro trouxesse felicidade. Por conta de sua melodia simples conseguir ser marcante, a canção certamente alcança o posto de single de Cheers.


Sons eletrônicos uníssonos surgem na companhia de um agudo e pontual sonar no meio de suas execuções. Enquanto em Million Dollar Bills a bateria é um importante ingrediente na criação da cadência rítmica, em Us Against The World essa função recai sobre o baixo, mesmo que sua participação seja pontual entre os versos de ar. De aroma juvenil e fresco, a faixa se apresenta como uma perfeita composição pop cujo lirismo exalta a vontade de mudar o futuro, de planos, de fantasias, de desejos. De despreocupação.


Rápidas e cavalgantes, as notas do piano surgem graves assumindo uma cadência enérgica. Na mesma sincronia rítmica, Thornewill entra em cena puxando uma bateria de groove sincopado e de pausas dramáticas em meio a uma atmosfera cativante. A surpresa vem no refrão, quando o ouvinte é surpreendido por sopros gordos e graves vindos do trompete de Luke Weber em pontuais e precisos momentos entregando dramaticidade à conjuntura melódica de Brass Band. Liricamente, a faixa dialoga sobre o tédio e sobre como os celulares funcionam como uma droga viciante que paralisa a noção do tempo, um tema bem abordado inclusive em In Stride, single de Myles Kennedy. É verdade que a faixa é a com teor mais dramático de Cheers até o momento, mas esse efeito é apenas para chamar a atenção para a mensagem lírica de buscar algo que anime, que excite. Algo que tire do eixo do marasmo e traga energias reavivantes. De resto, os versos de Brass Brand são por si só elementos de melodia marcante.


Sons enigmáticos crescem e eclodem em um cenário que soa como um conto imaginário, uma fábula infantil para prender a atenção de seus ouvintes com palavras que dão asas às ideias e conclusões sem limites. Como uma canção que discute sobre evolução, The Machine (Intro) possui um minimalismo sonoro calcado em uma roupagem eletrônica que incita o devaneio imagético enquanto dialoga, inclusive e de maneira superficial, sobre a heterogeneidade das pessoas.


O som do mellotrom, ao lado da bateria de groove linear e do grave e sombrio riff do baixo, imputa certa dramaticidade e tensão na melodia nascente. Sobrevoos de uma aflição entorpecida são percebidos através do bailar do som grave do violino enquanto a voz de Thornewill rompe a insegurança e vai introduzindo um lirismo de narrativa igualmente imagética que a de The Machine (Intro). Sob um refrão puxado apenas pela dupla voz e violão, Everybody Panic dialoga sobre a individualidade em meio à multidão, mas ao mesmo tempo discute a pressa, o imediatismo e a forma como a rotina faz com que as pessoas se comportem como máquinas de cordas dadas cuja bateria acaba somente no anoitecer.


O piano se divide entre notas graves e agudas em um compasso contagiante. O pandeiro dá uma repentina textura ondulante enquanto um súbito sopro de trompete imputa uma coloração mais viva ao ambiente de contornos ainda nascentes. Curiosamente, a melodia que vai sendo construída pela voz de Thornewill traz singelas semelhanças com aquela elaborada por Katy Perry em seu respectivo single Wide Awake. Tendo o baixo como um encorpado agregador de swing, Move Along acaba dialogando sobre a sensação de decepção por não concretizar sonhos e de ver todo o seu ciclo social alçando altos voos enquanto se mantém no mesmo lugar, imutável. 


Graças ao som angelical e doce da harpa, o nascer melódico traz uma ambiência imagética tal como The Machine (Intro) e Everybody Panic e que soa como conto de fadas igualmente a Hey Maude. Raise A Glass (Interlude) é, sob a companhia do som de um violino melancólico ao lado de um coro vocálico que constrói uma ambiência cinquentista, como um brinde a novos começos, novas oportunidades de amanhecer. É sobre esperança e o gosto pela vida. O sol banha sempre o horizonte de um novo dia.


A guitarra de riff agudo e alegre é seguida de elementos percussivos que criam uma interessante textura acelerada. Interessante notar que, mesmo tendo outros elementos compondo a melodia, são os sons pontuais da guitarra que capturam a atenção do ouvinte e criam uma identidade ao ritmo. Com o som agudo e ácido do mellotron fazendo a sonoridade da ponte entre verso e refrão, How The World Began fala da fluidez da vida, da maleabilidade evolutiva e uma vontade inebriante e inquietante de um mundo regido pelo senso de igualdade, seja ele econômico ou social. Tudo com base no gênero indie.


O piano se pronuncia com um doce tilintar de suas agudas notas promovendo um ambiente como se fosse parte de um conto. Guiado por notas pausadas e sequenciais, ingrediente que mostra ser uma marca rítmica de Cheers, a composição possui uma cadência levemente acelerada, mas de contágio irresistível. Cheers! É uma faixa que funciona como um brinde à vida, uma música que, ao contrário do sonho por um mundo igualitário trazido em How The World Began, coloca tal visão em realidade. É uma ode ao dia-a-dia e uma inclusão daqueles que vivem às margens da sociedade. 


Cativante, atraente e penetrante. É muito agradável ouvir um trabalho que seja leve, que entretenha e que ao mesmo tempo traga mensagens que estimulem a reflexão. Isso é o que Cheers faz. Mas não só isso. Ele é repleto de enredos líricos que dão asas à imaginação enquanto transita por roupagens retros e atuais com versatilidade.


Falando de relacionamento, igualdade, depressão e consumismo, o álbum é repleto de dramaticidade, alegria, leveza e tensão distribuídos por entre melodias guiadas por ritmos como indie rock, indie pop e pop. Entre suas nuances, é possível que o ouvinte perceba pitadas nostálgico-melancólicas, mas elas fazem parte da comoção do enredo de determinadas músicas.


O que de fato chama a atenção é a forma como o Jukebox The Ghost construiu as melodias de músicas como The Machine (Intro), Everybody Panic, Hey Maude e Raise A Glass (Interlude). Afinal, elas atiçam a imaginação ao mesmo tempo em que trazem uma estética retro atraente e penetrante.


Contudo, Cheers possui uma série de músicas de melodias contagiantes, mas é inegável que as principais são Ramona, Move Along, Million Dollar Bills, Brass Band e Wasted. Afinal, suas sonoridades são marcantes e capturam fácil a atenção do ouvinte a partir de suas linhas rítmicas grudentas.


Fazendo isso acontecer estão nomes como Harry Burr e Brian Phillips. Dividindo a função de engenheiro de mixagem, os profissionais conseguiram criar uma melodia limpa que soe cativante e penetrante. Convidativa, inclusive. Claro que isso se deve também à inserção de sons de instrumentos vindos de programação, mas tal atestado não tira o respectivo mérito.


Sintetizando tal contexto está Phillips ao lado de Keith Varon, Chris Wallace, Jeremy Silver, Tim Myers e do próprio Jukebox The Ghost. A produção mista proporcionou a Cheers uma abrangente liberdade criativa em que diversas texturas, sonoridades e referências foram experimentadas. Isso ajuda para que o álbum seja interessante.


Lançado em 27 de maio de 2022 via BMG, Cheers é um álbum que celebra a vida e a igualdade de forma que os sonhos nunca se apaguem. É um álbum de melodia contagiante e leve que entretém e ao mesmo tempo critica. Um trabalho cuja melodia apenas agrega. 

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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.