Fernando Motta - Ensaio Pra Destruir

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Depois de um ano de caos, um de esperança. É nesse momento, um período em que o caos se mistura com a esperança, que Fernando Motta escolheu para divulgar seu novo trabalho. Intitulado Ensaio Pra Destruir, o álbum é o terceiro da carreira do cantor e possui produção de Vitor Brauer.


Uma tranquilidade contagiante se forma. Com frases macias, a guitarra molda uma atmosfera de completo conforto, cuja aparição de uma sonoridade astral a partir do sintetizador de Mafius apenas coopera para esse feito. Eis então Insetos Rondam a Luz Acesa, uma música tranquila que conforta e transcende.


A guitarra é, novamente, quem puxa o instrumental introdutório. Porém, em Essa Cidade Não Existe ela ganha distorção e linhas lentas de teor melancólico. Para dar soma a essa melancolia, a bateria surge com frases sujas, mas igualmente pausadas que são acompanhadas por um baixo triste, tal como é a energia da canção. Com a entrada do vocal, oferecido na forma de eco, quase na estrutura de coro de igrejas góticas, existe um tom de confissão de atitudes feitas pelo eu-lírico.


Não, não é O Amanhã, single do Detonautas Roque Clube. Em verdade, a introdução de Tridimensional pouco se parece com ele, mas existe um detalhe no movimento vocal das primeiras palavras entoadas por Motta que remetem à melodia do refrão de tal canção. Passada essa impressão, outras considerações surgem. A estrutura adotada em Tridimensional impressiona pela ousadia, afinal, ela não possui uma construção tradicional, sendo o refrão colocado logo no despertar da faixa, levantando a energia e encantando o ouvinte com uma melodia mais alegre e despojada. Uma ode à vida e à vontade pela experimentação, o lirismo acompanha esse alto astral da harmonia e auxilia no processo de classificação da música em single de Ensaio Pra Destruir.


Com influências na estética post-grunge, Valsa de Outono se apresenta ao ouvinte com uma introdução longa, tal como acontece com as canções progressivas. Cheia de frases quebradas de bateria, a música possui uma quebra rítmica notável com a entrada do verso de ar, momento em que a melodia se transforma, como o próprio nome sugere, em uma valsa. Porém, acontecem coisas infelizes nesse momento. A mixagem feita na música deixou o instrumental em tal equalização que dificilmente se consegue perceber aquilo que está sendo cantado, mas a interpretação e a forma como Motta se apresenta também não facilitam esse processo.


Animado e contagiante, o riff introdutório da guitarra cria uma expectativa positiva por parte do ouvinte em querer acompanhar a canção e descobrir o próximo estágio sonoro. Eis que ocorre a entrada de notas aveludadas do piano de Apeles, as quais, curiosamente, não estimulam a sensação de melancolia, mas alimentam aquela percepção de ânimo reconfortante. Salvo Engano é uma canção que, liricamente, coloca em voga a dependência e a fragilidade humana, tendo como resultado, o apoio mutuo do relacionamento e da socialização.


Com um ar de atividade espiritual, Paranormal foge de toda a temática melódica apresentada em Ensaio Pra Destruir. Agressiva, suja e com forte presença da guitarra distorcida, a música possui uma melodia que transita entre o grunge e o rock alternativo em cujas frases da bateria oferecem um ar popular à harmonia. 


De melodia contagiante, Elogio à Destruição desde seu despertar demonstra um forte apelo radiofônico. Assim como aconteceu em Tridimensional, a presente faixa é outra forte candidata a single de Ensaio Pra Destruir. Afinal, sua melodia é, apesar de acelerada, alegre, enérgica, confortável aos ouvidos e de tons macios.


Minimalista é a principal característica de Perfeição. Calcada na estrutura voz e piano, que aqui ganha interpretação de João Viegas, ela possui uma harmonia que recria sons ambientes na tentativa de reforçar a mensagem lírica da perfeição da natureza e da beleza como a vida funciona.


Macia e sensual, a melodia que se constrói em Verde-Água flerta com aquela estruturada em Put Your Records On, single de Corinne Bailey Rae por conter, mesmo que extremamente tímidos, traços do soul. Porém, ela possui uma originalidade latente causada pela interpretação lírica de Motta.


Alegre e estimulante, Contraditória 2 começa com um instrumental crescente que chama o ouvinte para desvendar os próximos passos da melodia. Em verdade, essa impressão de crescente instrumental toma a forma de uma estrutura linear que acompanha um lirismo que aborda a observação do cuidado aspiracional.


A guitarra surge em riff tranquilo. Junto a ela, um ruído se torna latente e parte da harmonia, dando a impressão de ser uma gravação ao vivo. Oslo, 31 é aquela canção cujo conteúdo lírico é o mais claro de todos os presentes nas faixas do disco. Afinal, ele não dá voz a dupla interpretação. Relacionamento platônico, sarcasmo e prazer pelo fracasso alheio são os temas centrais do conteúdo da faixa. Parece que, com ela, Motta faz uma dura crítica à sociedade atual, que parece ter se tornado fria e se alimentar da derrota alheia para se sentir bem consigo mesma.


Com sonoridade majoritariamente macia e tranquila, é possível dizer que a estrutura harmônica criada em Ensaio Pra Destruir se assemelha demasiadamente à melodia característica das canções compostas pelo Los Hermanos. Até porque, em ambos os casos existe toques melancólicos em todos os conteúdos líricos.


Por isso, talvez, o título do álbum. Ao mesmo tempo em que nele possuem músicas em que existe devoção à vida, há também aquelas faixas que informam o contrário. Dessa forma, o que se vende é uma incerteza. E toda a incerteza é um ensaio para uma futura tomada de decisão.


É exatamente esse o cenário criado na arte de capa. Feita entre Arthur Lahoz e Gabriel Rolim, ela apresenta um homem apreciando um céu crepuscular em uma clara alusão no ato de refletir e na busca por respostas. Ou seja, é a mensagem geral do álbum na estrutura visual.


Lançado em 23 de março de 2021 de forma independente, Ensaio Pra Destruir convida o ouvinte para enfrentar a melancolia momentânea, acessar seu ser interior e refletir sobre a vida.

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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.