Evanescence - The Bitter Truth

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Quatro anos após o anúncio de um álbum de releituras. 10 anos após o lançamento do último álbum de inéditas. Seis anos após a contratação de outro guitarrista base. O quinto álbum de estúdio do Evanescence é o resultado de um período de experimentação e mudanças. The Bitter Truth finalmente chegou ao público.


Uma ambientação astral se forma com um som macio e aveludado. Na forma de sussurro, o vocal de Amy Lee adquire espaço na melodia reforçando a sensação astral em cujo conforto parece se tornar algo palpável. É verdade que Artifact/The Turn carrega uma energia sinistra em sua harmonia, um suspense que parece gelar a pele momentaneamente. Cheia de frases de impacto e enigmáticas, tais como “Underneath golden skys you’ll always be there” e “In the mirror, in my eyes, you’ll always be there”, o lirismo oferece uma menção clara ao medo, ao perigo, mas também é uma alusão nítida ao presente momento vivido pelo planeta, o qual enfrenta a pandemia do Coronavírus.


Contagem regressiva. Quando se atinge o número zero, vem o resultado. Versos pesados, regados em tons graves, agressivos e raivoso tomam conta da harmonia e dão, frequentemente, passagem à típica estética do Evanescence, a qual, mesmo que notada em pequenos instantes, faz crescer a melodia com a sua mudança de estrutura. Broken Pieces Shine possui, ainda, um refrão de sonoridade crescente e extremamente melódica resultado da química já estruturada entre os músicos.


Grooves repicados da bateria de Will Hunt puxam a introdução sombria e sinistra de The Game is Over. Junto com a inserção do tilintar de um sino de igreja, essa mesma linha de bateria faz criar um cenário sugerindo um caminhar para a morte, uma marcha mórbida. De repente, Tim McCord se apresenta com um baixo de estrutura firme, precisa e grave desenhando o ecossistema melódico que dá passagem para a presença lírica. E é aqui que o assunto se assemelha com aquele presente nas canções anteriores. Abordando o isolamento, a solidão e os sentimentos correlatos às essas situações, Amy reflete sobre a possibilidade de as pessoas transformarem suas formas de ser ao se questionar “Are we all te same?”.


Mudando completamente de ambientação e proposta melódica vem Yeah Right e sua sonoridade arco-íris e calcada na temática eletrônica. A verdade por trás daquilo que parece belo como propaganda de margarina é completamente outra. Junto a essa melodia alegre existe a descrição de um cenário funesto e mórbido. Trazendo realidades como a de uma viúva no ápice de sua depressão e da adoção de uma felicidade inexistente, a música coloca, no refrão, uma harmonia a altura de tal situação. Áspera e distorcida, ela é completa por um lirismo em tom de conformação imposta que se convence de que “Yeah right, that sounds nice”.


Em meio a sons variados, é o riff do baixo que desperta a atenção do ouvinte devido à sua gravidade, potencia e groove. No segundo verso de Feeding the Dark, porém, a mesma estrutura melódica outrora assumida pelo baixo agora é dominada pela distorção da guitarra de Jen Majura. No caminho para o refrão há uma ponte instrumental raivosa, agressiva e de groove acentuado que somatizam sintomas que se destacam desde o pré-refrão até o ápice da canção. Em meio a uma melodia sinistra que faz os pelos do corpo eriçarem de um pavor sobrenatural, o lirismo sugerido por Amy já no pré-refrão coloca para discussão novamente a tristeza e a depressão por tristes eventualidades vividas. Claro que, assim como nas canções anteriores, a letra é repleta de frases de impacto, tais como “Do you remember What made the scar? How deep will you cut?”.


As frases perambulam pelo ar. A melodia é calcada no blues. A estrutura é minimalista. Eis as impressões obtidas com a introdução de Wasten On You. Construída na voz de Amy Lee, a personagem da canção está entorpecida. Sem reação. Perdida e imersa em uma situação fora de controle. É fato que o lirismo tem seu peso e sua crítica, mas assim como aconteceu em Yeah Right, a sonoridade construída na presente faixa transmite uma ideia antagônica. Amena, aveludada e minimalista, ela passa a ideia de conforto e proteção, sentimentos e características que são oficialmente distorcidos e revelados como drama, domínio e complexidade na última execução do refrão, trecho de explosão sonora.


A sensação é como estar no berço olhando para o alto. Mas essa calmaria se vai como num suspiro. Afinal, um uníssono de força, gravidade e agressividade se faz em frases pontuais que dramatizam a introdução de Better Without You. De forma inteligente, a música possui uma estrutura com dois despertares. No segundo, ao contrário do primeiro, todos os instrumentos se conversam desde o início em uma frase de peso, precisão e de groove acentuado em que o destaque vai para o baixo, cujo som se sobressai dos demais.


Com ar sofrido e cansado, o vocal é quem puxa a introdução de Use My Voice, um dos primeiros singles divulgados de The Bitter Truth. Retratando o poder da voz, da postura e do enfrentamento, a proposta lírica é, como o próprio nome sugere, estimular para que, usando a voz, se possa protestar contra falsidades, corrupção e mentiras. Por ser single, a música precisa de características comerciais e elas se encontram no refrão. Os “ooohs” prometem o contágio e a participação do público em shows ao vivo, e a melodia, apesar de soar mais harmônica, possui o peso característico do Evanescence.


Parece que a introdução de Take Cover tem um flerte no maracatu, pois uma onda percussiva invade a melodia. Curiosamente, o quesito melodia se mostra, na canção, menos metalizado, mas com um groove mais contagiante. Liricamente falando, a canção é um complemento de Use My Voice, afinal, reforça a questão da subordinação e dos consequentes efeitos dessa atitude nas pessoas.


É apenas o piano. Mas é tão curioso notar como um único instrumento pode ser tão completo em oferecer atmosferas e sentimentos diversos. No caso de Far From Heaven, ele transmite tristeza, melancolia e sofrimento, questões intrínsecas no personagem da canção, o qual se mostra com depressão latente.


Peso e groove, dois ingredientes marcantes tanto do Evanescence como de The Bitter Truth. Eles se mostram desde os instantes primários de Part Of Me, uma música que recupera a sonoridade metalizada e de flerte com o sombrio. E nessa questão, os grooves da bateria em união com a aspereza dianteira do riff da guitarra de Troy McLawhorn são influenciadores inegáveis.


Com o piano, suspense. Mas um punch sonoro surge repentinamente com uma sonoridade dramática que ganha um ar visceral com os gritos de Amy Lee, quase como se estivesse se libertando de algo. Mas definitivamente não é isso o que acontece. Com um ritmo contagiante, o que ocorre liricamente em Blind Belief é uma somatória de questionamentos acerca da crença cega da sociedade frente ao período de ocorrência da pandemia. Apesar disso, é com as frases “We hold the key to redemption” e “Love over all”, que o álbum se encerra entregando faíscas de esperança.


O tempo foi longo. 10 anos é um tempo considerável que pode fazer passar ideias como encerramento da banda ou um hiato causado por fatores variados. Mantendo a legião de fãs aquecida, o Evanescence lançou Synthesis, cheio de releituras. Mas definitivamente é The Bitter Truth que causa um alívio.


O retorno do grupo no campo de lançamentos inéditos é um retorno também para a sonoridade que definitivamente lançou o Evanescence no mercado fonográfico mundial. Revisitando o nu metal, o álbum é também um produto que exala uma melodia metalizada, grave.


Além de ser o primeiro de inéditas do Evanescence em 10 anos, o disco é também o primeiro que conta com a participação de Jen Majura na composição das faixas e na assinatura das linhas da guitarra base. Mas curiosamente, apesar de ser considerado sua estreia oficial na banda, The Bitter Truth mostra que os seis anos de sua estada no grupo já proporcionaram uma química sólida entre os integrantes. Afinal, o que se vê em questão de harmonia é que existe entrosamento entre os participantes.


Sintetizando esse entrosamento e canalizando a sonoridade mista entre o nu metal e o metal gótico está Nick Raskulinecz. Repetindo a dose do álbum autointitulado do Evanescence, Raskulinecz assume novamente a posição de produtor e captura, em The Bitter Truth, a ampliação da consciência e o amadurecimento tanto lírico quanto melódico do grupo.


Majoritariamente conceitual, o disco aborda demasiadamente as questões relacionadas à pandemia do Coronavírus. Aborda também, os diversos questionamentos frente à solução para problemas da sociedade. E é justamente essa a ideia por trás da arte de capa, em que a boca de Amy Lee está prestes a engolir uma pílula.


Lançado em 26 de março de 2021 via BMG, The Bitter Truth é um disco maduro, potente, questionador e explosivo. É como se o disco autointitulado de 2011 ganhasse ainda mais competência e conhecimento. Uma volta realmente triunfal do Evanescence ao mercado.

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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.