Cheap Trick -In Another World

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Vindo de uma cidade interiorana de Illinois perto do auge dos anos 70, o Cheap Trick completa 47 anos de existência em 2021, ano em que lança In Another World, seu primeiro álbum desde 2017. O trabalho, que leva a produção de Julian Raymond, é o 20º disco de estúdio do grupo.


Numa vibe beatleniana, The Summer Looks Good On You se apresenta com um coro crescente em que Robin Zander, Rick Nielsen, Tom Petersson e Julian Raymond entoam “Here comes the summer”. Essa frase, cheia de sobreposições vocais numa estética tal qual foi adotada em Bohemian Rhapsody, dá passagem a uma frase de guitarra que encarna o puro hard rock setentista, subgênero esse que ganha mais peso quando a guitarra base e a bateria entram em uníssono criando um ritmo amplamente melódico e contagiante. A influência do blues também pode ser facilmente notada na melodia, um ambiente que é completado por uma letra sobre paixão a primeira vista, mas sem o típico teor sexual que caracteriza o hard rock. Um single de peso que abre o álbum com energia e excitação.


Do hard rock ao power pop. Quit Waking Me Up é uma canção que possui base no blues, fator que é perceptível através das linhas da bateria criadas por Daxx Nielsen, mas que tem forte inclinação ao campo pop graças à sua cadência e à tonalidade do teclado de Bennett Salvay empregada nela. De outro lado, é como se a canção possibilitasse ao ouvinte se encontrar em uma casa de campo olhando por uma janela de madeira o céu levemente ensolarado de um entardecer de verão. Afinal, a harmonia criada na canção emana um toque bucólico ao mesmo tempo em que possui caráter de trilha sonora. 


Um groove de bateria solitário. Lento. Em cadência 4x4. É isso o que abre Another World, uma música que logo evolui para algo de uma melodia resplandecente graças à construção de uma sonoridade em que todos os instrumentos nela presentes podem ser ouvidos em perfeita harmonia. É, de fato, uma faixa de teor acústico, uma balada sutilmente melancólica que ao mesmo tempo é romântica e contagiante em sua essência. Frases como “I’ll be there for you” e “I’ll stand by your side” não deixam dúvidas disso.


Assim como The Summer Looks Good On You, Boys & Girls & Rock N Roll recria a sonoridade do hard rock setentista graças aos riffs e à atuação da guitarra de R. Nielsen. Aqui, porém, elementos do bubblegum podem ser percebidos em sua estrutura sonora. Uma música estimulante, atraente e melodicamente sedutora.


Frases cativantes e contagiantes continuam com toda a força em The Party. A música é quase como um complemento da faixa anterior, afinal, sua estrutura melódica segue a mesma estética. O teor lírico coopera com essa constatação, afinal, o rock and roll trazido em Boys & Girls & Rock N Roll é uma festa, e essa festa está na letra de The Party, que diz “When the party is over, when you’ll be back again... Its not the same to hear the sound without you, my friend”. 


Final Days chega com o hard rock original. Forte presença do blues, frases cadenciadas e ritmo compassado. É um ambiente confortável e comum do Cheap Trick, banda contemporânea de outros grandes nomes da cena do hard rock, como Whitesnake, The Rolling Stones e outras mais. Na faixa, tem momentos em que a guitarra solo grita sem agressão ou raiva, mas com a intenção de ser ouvida e ter protagonismo melódico mesmo que momentaneamente. Mas não só isso. Quando se pensava que a canção já estaria caminhando para um fim e que tudo já havia sido mostrado, Jimmy Hall invade a melodia com uma sanfona que grita em meio à base rítmica blues. Refrões de estéticas épicas ainda se fazem presentes nessa que pode ser considerada, assim como The Summer Looks Good On You, um single de In Another World.


Robin Zander se apresenta com um vocal limpo, sem drive algum. Com a intenção de causar maior comoção ou não, o fato é que a interpretação lírica por ele feita em So It Goes joga uma energia melancólica superior àquela percebida em Another World. Afinal, aqui Zander toca em um assunto mais palpável e que causa a melancolia mais pura nas pessoas, que é o tempo e a velocidade com que ele passa.


Saindo do princípio de tristeza criado em So It Goes, Light Up The Fire oferece o oposto. Um ritmo mais acelerado, com a presença de guitarras distorcidas, um groove cadenciado e um vocal rasgado sugerem ânimo e renovação de energia. Com um pré-refrão estimulante e que oferece grandes expectativas, a canção ainda possui um refrão estimulante e frases de impacto como “Are you looking for heaven or one hell of a time?”. Uma música que facilmente poderia ser incluída no catálogo de canções do AC/DC.


A sonoridade possui protagonismo indiscutível do baixo de Tom Petersson, instrumento cujas linhas sobrevoam a melodia com uma delicadeza tal qual a brisa de verão. E por falar em brisa de verão, é uma sensação de frescor e tranquilidade o que Passing Through oferece ao ouvinte. Retomando a temática lírica romântica criada em faixas como Another World, a presente música é construída com base em um ritmo tranquilo, a tornando uma típica balada romântica que questiona “Did you love me or would your heart just passing through?” e busca por algo que possa oferecer um amor puro e verdadeiro.


Agitada e empolgante, Here’s Looking For You é aquela canção construída nos moldes de uma apresentação ao vivo, pois sua estrutura sugere a participação do público cantando em coro as frases enfáticas entoadas por Zander em meio a uma melodia acelerada e atraente. Com uma participação tímida, mas marcante, o teclado de Tim Lauer oferece ingredientes que proporcionam uma melodia abrangente e convidativa no refrão, momento que pede uma amplitude e uma entrega maior na melodia.


Another World – Reprise poderia ser apenas uma versão de Another World remixada. Porém, algo interessante nela acontece. Enquanto a segunda apresenta uma melodia mais melancólica, lenta e pausada, a primeira oferece o oposto. Apesar do groove da bateria ser o mesmo, sua velocidade foi ampliada em demasia, o que proporciona uma melodia mais rápida, o emprego de distorção nas guitarras e uma energia excitante que levanta o ouvinte. Uma roupagem inovadora para um lirismo que segue com a proposta reflexiva sobre o que está acontecendo com o mundo. 


Uma sonoridade profunda. Arrepiante e reflexiva. Essa é a proposta de I’ll See You Again, uma música que seu lirismo possui, em sua superfície, a ideia de abordar a saudade existente por outro alguém. Porém, um lado profundo sugere que a letra fala com relação ao planeta Terra, ao auge do seu bem-estar e de sua vivência harmônica com seus cidadãos. Esse peso reflexivo sobre a ação humana ganha um extra de dramaticidade através da sonoridade de violinos inseridos pelo pro-tool de Lars Fox.


Esse viés questionador continua em Gimme Some Truth, uma música que se utiliza de uma melodia mais atraente para questionar e pedir por, como o nome da faixa sugere, mais verdade e honestidade frente às ações e iniciativas políticas. O que mais chama a atenção é a necessidade nitidamente expressa, em tom de desespero, de esperança.


In Another World definitivamente não é apenas um trabalho para recolocar o Cheap Trick na lista de bandas de rock em exercício na atualidade. O trabalho sugere muito mais do que apenas um disco para ser ouvido em momentos de lazer. Sua essência é de algo reflexivo.


Com temática lírica madura e, como dito antes, reflexiva, o disco se utiliza da perfeita harmonia e química estruturada entre os músicos, a qual foi lindamente captada pela mixagem de Chris Lord-Alge, para oferecer algo questionador e que tira as pessoas da zona de conforto com a intenção de fazê-las pensar sobre como estão lidando com a vida e com o planeta.


Questões políticas, de relacionamento, e sobre o planeta podem ser facilmente percebidas em meio as 13 faixas do disco, que são preenchidas por subgêneros como o hard rock, o bubblegum e o blues, os quais permitem uma capacidade de atração e sedução amplas.


Outra coisa que chama a atenção para o lado da reflexão é a arte de capa. Feito por Dale Voelker ela sugere duas coisas: a corrida contra o tempo para salvar o planeta e uma ideia de hipnotismo frente à desinformação em alta por conta da pandemia do Coronavírus.


Lançado em 09 de abril de 2021 via BMG, In Another World é um disco que chama os ouvintes para suas responsabilidades como cidadãos do planeta e como responsáveis pela manutenção do bem-estar geral. As melodias adotadas no disco são apenas uma mera forma de conscientizar, de tentar mostrar a real paisagem que está sendo criada no mundo.


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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.