Gypsy Tears - Carcará

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Rompendo o silêncio inebriante, a guitarra solo surge sob uma postura aparentemente debochada e libidinosamente provocativa. Se tornando ardente através de seus movimentos rebolantes, o instrumento vai experimentando uma sensualidade acentuada que dá, ao ouvinte, a capacidade de perceber a imersão estética da introdução no campo de um hard rock bluesado.


O interessante é perceber que, sozinha, a guitarra ainda consegue, além de transpirar uma essência swingada, conferir à atmosfera notas de um suspense marcante que chama a atenção do ouvinte e o deixa minimamente inseguro. É como uma espécie de prazer sadomasoquista, ao passo que, imerso em um senso de vulnerabilidade, o espectador se percebe na ânsia de descobrir os próximos passos do enredo sonoro.


Assim que a bateria e a guitarra solo entram em cena, a canção vai sendo dominada por punchs ocos que lhe dão uma estrutura de rito de ordem. Adornada por uivos ecoantes fornecidos pelo reverberar da distorção, a faixa, através de um rompante trovejante de protagonismo do groove grave acentuado do baixo rasgando os espaços livres da base melódica, escorrega para uma paisagem de base rítmica curiosamente folkeada que lhe confere uma cadência trotante e fluida.


Quando entra, finalmente, em seu primeiro verso, a faixa é agraciada pelo preenchimento das linhas líricas feito por uma voz masculina de timbre afinado em seu tom agridoce. É nesse instante que ela adquire um formato fabulesco que, pela sua forma narrativa, vai gradativamente prendendo a atenção do ouvinte.


Atingindo o refrão sob uma paisagem densa, mas sem perder a sensualidade, Carcará consegue explorar, no ouvinte, o senso de vulnerabilidade e insegurança a tal ponto que, assim como o conto da Cuca, é capaz de transformar a fantasia em algo real. Esse é, portanto, um dos grandes trunfos da composição. O outro é o fato de que o enredo lírico é cantado na língua original do grupo, o português.


Porém, o principal marco da obra é a história abordada na letra. Enaltecendo a cultura regional de Minas Gerais, a faixa explora a figura do carcará e o mito que a rodeia. Em terras mineiras, essa ave de rapina morde a nuca de todos aqueles que contam mentiras ou boatos. Aqui, o Gypsy Tears acaba, também, criticando a futilidade e a falta de limites de algumas pessoas perante seu ímpeto de chamar atenção pela disseminação de histórias falsas.

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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.