The Twist Connection - Is That Real?

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Desde 2016 quando se lançou oficialmente no mercado de música global com Stranded Downtown, seu álbum de estreia, o power trio coimbrão The Twist Connection divulgou uma série de singles e outro compacto até a chegada de seu novo trabalho cheio. Intitulado Is That Real?, o disco dá sequência ao trabalho autointitulado.


O vento uiva em meio ao ambiente inóspito. A poeira sobe e desce ao chão enquanto o silêncio se torna uma companhia reconfortante em meio à insegurança da solidão. Esse clima de suspense é o que norteia a introdução da faixa-título, uma canção puxada por uma bateria mansa e minimalista, uma guitarra distorcida em seu riff provocativo e com um baixo que, sob domínio de Sérgio Cardoso, age como o guia melódico de postura cínica, autoconfiante e irrequieta. Quando uma voz de timbre intermediário e com pinceladas graves entra em cena por meio de Carlos Mendes, a atmosfera densa e de ares investigativos ganha contornos mais palpáveis. Crescendo para um ritmo que mistura indie rock com folk e pitadas de hard rock, a faixa-título é um material que dialoga sobre destino, sobre futuro. A perseverança e a autoconfiança em dominar a vida são outros pontos importantes ressaltados na construção da música, que comunica uma mistura de influências que transita entre The Doors e The Smiths enquanto ganha uma amplitude harmônica e psicodélica com a entrada do órgão ondulante e hipnótico de Francisco Dias Pereira.


Uma levada contagiante que mistura elementos do indie com o pop punk imerge logo nos primeiros sonares de um novo cenário. Tendo na bateria de Mendes o ingrediente que imprime a cadência melódica, a canção continua com um cardápio que oferece ao ouvinte suspense e calafrios principalmente pela forma como Mendes interpreta o lirismo, uma maneira que traz à tona a influência de Dave Byrne e mesmo de Mick Jagger. Crua, You Must Go Now traz um ambiente de embriaguez que se diverte com o fato de que todos possuem segredos e enigmas que precisam ser mantidos em silêncio, mas que entram em conflito quando em companhia de uma personalidade falante e expansiva que pode estragar todo o cuidado em manter certas informações trancadas na memória.


O indie rock fundido entre The Killers e The Black Keys que tanto marca a sonoridade do The Twist Connection retorna com maturidade em Bring Me The Storm graças principalmente à forma como a guitarra de Samuel Silva se pronuncia. Conforme a música vai crescendo em presença, uma voz aguda e feminina é percebida acompanhando Mendes. Ela é de posse de Raquel Ralha, quem dá um contraponto interessante ao timbre gélido e nauseante do vocalista. Suja e com pitadas embrionárias de stoner, Bring Me The Storm acompanha um personagem cansado de um estado paralítico e entorpecido social perante os momentos que antecedem as mudanças e quer ver logo a transformação acontecendo. É como um desabafo que, pelas entrelinhas, critica o senso comum e a conformidade em se sentir acomodado na zona de conforto, um comportamento que não apresenta gana nem mesmo vontade de mudar simples detalhes do cotidiano.


Com singela semelhança com a sonoridade de Fortune Faded, single do Red Hot Chilli Peppers, a introdução traz protagonismo da guitarra enquanto a bateria vai desenhando uma base maleável e repicada. É então que um duo introduz, em uníssono, uivos que perambulam pela superfície melódica. Surpreendentemente, após esse súbito, quem se apresenta como dominante no campo lírico é Raquel, que aqui dá ao ouvinte a possibilidade de degustar mais facilmente de suas características. De timbre semelhante ao de Giovanna Moraes, ela encarna uma postura rock and roll que traz referências de Joan Jett e Courtney Love. Não à toa que One Shot tem, quando maturada, uma melodia que comunica influências do The Runnaways. Nesse terreno é que a canção evidencia seu enredo romântico, que traz uma personagem em busca de romance, mas que não dá duas chances. 


Mais introspectiva que as demais, mas ainda com swing e contágio, a canção traz novamente as linhas de baixo de forma marcante na base melódica e a guitarra funcionando como um importante cartão de visita, mesmo que de forma sutil. De influência presente, mas quase imperceptível de Chuck Berry, Fake é, assim como Bring Me The Storm, uma canção de cunho sócio-analítico que critica um comportamento baseado em mentiras, falsidades e insegurança, o que a faz precisar de atenção por muito tempo. Ainda assim, Fake traz uma melodia de curiosa alegria durante o refrão que traz semelhanças com a melodia de Happy Together, single do The Turtles.


Provocativa e com pitadas de swing graças ao emprego do cowbell e do pandeiro, Trapped & Tired já de início se mostra a canção de levada mais rasgada de Is That Real? por conta, principalmente, da sobreposição de guitarras. Assim como One Shot, a faixa traz Raquel no protagonismo lírico que traz a dualidade da liberdade e da prisão. A vontade de se ver solta, leve e livre em uma autoestrada entra em conflito com a realidade de se sentir presa e acorrentada a um relacionamento ou a algum tipo de memória. É uma canção que exorta o cansaço, mas que também funciona como uma espécie de pedido de socorro para a reconquista de um senso de independência que pode levar à alforria.


A bateria é quem puxa a melodia introdutória com golpes que se dividem entre a estridência da caixa e o oco do bumbo. Trazendo seu indie folkeado, o The Twist Connection oferece novamente ao ouvinte o formato de repentinos duetos entre Mendes e Raquel que tanto funcionou em Bring Me The Storm. Com semelhanças melódicas com Strutter, single do Kiss, Won’t Make Me Fall parece narrar uma mistura de culpa e remorso com a raiva de se desapontar em um relacionamento de entrega unilateral.


Guitarra e bateria se dividem na criação de uma melodia enérgica e levemente swingada. Com Raquel no comando do microfone acompanhada por um baixo encorpado e uma bateria dando saliências no verso de sonoridade mais minimalista, Stuck In Quicksand é uma canção que, curiosamente, funciona como uma continuação de Bring Me The Storm por trazer a descrição de alguém acomodado sob a metáfora de, como o próprio nome da canção sugere, preso na areia movediça. Ao mesmo tempo, a canção também tenta, com um desespero controlado, estimular o ouvinte a ouvir o seu grito interior para conseguir extravasar as emoções e conquistar seus objetivos.


Assim como Trapped & Tired, Dust Devil já se mostra outra importante faixa no repertório de Is That Real? no que se refere à presença e a um ritmo mais rasgado em meio à base contagiante. Macia e swingada, a faixa traz pitadas marcantes de hard rock enquanto dialoga sobre o controle dos ímpetos ao mesmo tempo que metaforiza os atos políticos como movimentos de assombro. É quase como a representação do sentimento generalizado de incredulidade perante os acontecimentos da atualidade.


Apesar de vir do país colonizador, a colônia pouco conhece dos nomes que integram o time musical de Portugal. Contudo, o que o The Twist Connection trouxe em Is That Real? foi um material repleto de swing, leveza e aspereza em uma receita equilibrada até mesmo na combinação de timbres vocais.


Com uma assinatura sonora evidente que se vende por uma espécie de indie rock folkeado, as melodias do álbum trazem também o hard rock e o pop punk como norteadores. Entre suas nove faixas, o álbum mostrou maturidade, sincronia e até mesmo linearidade perante seus enredos líricos.


Tratando de autoconfiança, sede por transformação, relacionamentos e trazendo até mesmo críticas sociais que permeiam os campos comportamentais da falsidade e do comodismo, Is That Real? apresenta Raquel Ralha como uma espécie de quarto elemento que auxilia na propagação de determinadas mensagens. Aqui vale especial menções às faixas One Shot e Stuck In Quicksand.


Cheio de influências que vão de Chuck Berry a The Killers, o The Twist Connection teve o auxílio de nomes como Francisco Dias Pereira e Boz Boorer na mixagem e produção das faixas, o que possibilitou um som autêntico e que mostra muito da essência musical do trio de Coimbra.


Encerrando o contexto técnico de Is That Real? vem a arte de capa. Feita entre Sérgio Cardoso e Bruno Pìres, ela traz uma estética que mistura barroco e renascimento pelo emprego do contraste entre luz e sombra que adorna os três integrantes. Ao mesmo tempo, uma mancha vermelha que circunda o nome do álbum e da banda parece em processo de se espalhar pelo cenário como se estivesse levando vida e comunicando certo tom de crescente excitação.


Lançado em 27 de março de 2020 de maneira independente, Is That Real? é um álbum indie folk marcado por melodias swingadas e contagiantes. É um trabalho que mostra que o The Twist Connection tem vontade e capacidade de ser tanto conhecido quanto reconhecido além dos limites lusos.

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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.