Skills - Different Worlds

NOTA DO CRÍTICO
Nota do Público 0.00 (0 Votos)

O Queen optou por voltar à ativa com o auxílio de um vocal fresco e jovem vindo diretamente de um reality show de música. O supergrupo Skills, por outro lado, já dá seu primeiro passo contando com um ex-integrante de reality show musical no comando do microfone. Contando com nomes de peso, o quarteto anuncia seu disco de estreia Different Worlds


Como o Sol surgindo em tom avermelhado por de trás das colinas, o rompante do som da distorção aparece banhando o solo melódico ainda em processo de despertar. Enquanto a guitarra solo se pronuncia por meio de uma valsa chorosa, a guitarra base se posiciona mais centrada, séria e racional em seu riff, o qual é rompido momentaneamente pelos ventos promovidos pelo prato da bateria que, com um golpe, introduz enfim o primeiro verso da canção. É então que um timbre suave, mas cuja doçura é vencida pelo rasgado do vocal, surge completando o escopo sonoro. Eis Renan Zonta introduzindo uma dramaticidade de tensão bastante presente graças ao sobrevoo entorpecido das notas quase transcendentais do teclado de Alessandro Del Vecchio. Escape Machine é uma canção que enaltece a liberdade e possui base hard rock que explode em um refrão cativante cuja estrutura recria a sonoridade inicial do Whitesnake.


As guitarras de Brad Gillis surgem em uma valsa uníssona e provocante cuja atmosfera sensual é enaltecida pelos crescentes golpes na caixa. Silêncio brusco. A guitarra  base então encarna o feeling provocador em seu riff levemente folkeado enquanto o baixo de Billy Sheehan surge em grooves pontuais e graves que entregam mais corpo à melodia em formação. Quando Zonta solta um grito rasgado, mas que visivelmente tinha a intenção de atingir notas mais altas, a sonoridade engata em uma aceleração swingada acompanhada do som quase gutural do hammond posicionado na superfície sonora como um instrumento onipresente. Intrigante é a sincronia de precisão e potência existente entre Sheehan e Gillis, afinal, são eles que dão sensualidade ante a psicodelia pincelada pelo órgão. Como uma faixa que trata sobre desejo, instinto e, principalmente luxúria, Blame It On The Night é a perfeita mistura de swing, acidez e psicodelia de maneira a criar uma melodia unificada pela consistência e pelas frases chiclete.


A guitarra grita com estridência dando a impressão de um mergulho em um ambiente explosivo, mas quando o ouvinte se percebe já imerso, o que ele observa é uma melodia macia, de flertes nostálgicos e suaves que são acompanhados, na base rítmica, pela precisão grave do baixo. Não contente, a guitarra começa a querer readquirir seu protagonismo e inicia uma valsa de caráter melancólico. Apesar dessa pisada no acelerador, a faixa-título é acompanhada de um refrão cativante e pontualidades explosivas que levantam a energia dessa que é uma canção romântica sobre pessoas vivendo em mundos diferentes. 


Como uma fina camada de chuva banhando o gramado em uma tarde de verão, David Huff golpeia a cúpula do prato de condução promovendo um embrionário ambiente aveludado que é reforçado pelas notas adocicadas, mas melancólicas, do teclado. Ao seu lado, sons lineares de violinos imputam certo tom de dramaticidade que deixam a canção mais sensível. Losing The Track se enraíza como uma faixa de fato sensível e emotiva na qual apresenta Zonta trazendo um lirismo quase introspectivo sobre a esperança e a busca por dias melhores. De refrão dramático-épico, a faixa é nomeada com um título que soa como uma metáfora para a perda de esperança. Não à toa que, em seus auges melódicos, Losing The Track assume melodias chorosas e lamentosas curiosamente contagiantes. Sem dúvida a primeira balada de Different Worlds.


No mesmo caminho de Losing The Track está Writing On The Wall. Já se mostrando, com seus primeiros sonares, outra forte candidata para balada do álbum, a presente faixa tem a diferença de ser banhada somente pela melancolia. Afinal, ela exala uma beleza emocional a partir da melodia da segunda parte da introdução que chega a marejar os olhos do ouvinte. Macia e contagiante, ela traz a guitarra sonorizada pelo efeito wah-wah e com um riff de caráter emocional. Novamente tendo a consistência do baixo como principal elemento de guia rítmico, Writing On The Wall dialoga com as memórias e com arrependimentos de maneira a trazer a dramaticidade como elemento secundário à melancolia e aos remorsos propriamente ditos. De refrão marcante, Writing On The Wall acaba por assumir a primeira posição no ranking de baladas de Different Wolrds e deixando então Losing The Track com a segunda posição.


É como o observar o céu poente sentado em uma pedra rente ao mar. O visual crepuscular visto em um horizonte litorâneo guarda diversas sensações, mas é inegável que a nostalgia é a principal delas. E é justamente essa mesma nostalgia que é trazida pelo violão introdutório. Após a entrada rasgada de Zonta, a canção imerge para um verso regido por gritos amaciados da guitarra, que traz uma levada folk-hard rock comovente. Com uma levada mais popular e uma narrativa quase cinematográfica, Show Me The Way tem capacidade suficiente de ser considerada um single lado b do álbum. Com um lirismo quase construtivista e esperançoso que exalta a possibilidade de mudar o ontem para se ver livre no amanhã e ter um horizonte melhor, a faixa traz uma estrutura que comunica forte influência da sonoridade de Bon Jovi


A guitarra vem em notas crescentes que, de súbito, desaceleram e recebem a companhia de um teclado ácido. A maciez que se forma é estonteante, mas a melancolia e a brisa curiosamente nostálgica são ingredientes difíceis de desvencilhar. Enquanto o vocal se pronuncia mais introspectivo, como se estivesse rememorando certos rostos e momentos, a guitarra solo vem com lampejos que soam como a cenografia de um raiar de Sol amornado rompendo as nuvens densas de um entardecer de inverno. Just When I Needed You é uma canção em que o eu-lírico se mostra falando com o vento, como se estivesse conversando com um personagem onipresente. Suas falas, recheadas de lamúria nostálgica, são formadas por questionamentos emocionais que suplicam por respostas que nunca são obtidas. Preenchida por um refrão intenso, emocional e dramático, Just When I Needed You se firma como uma canção sobre saudade, sobre o conviver com as memórias de alguém que se foi, mas também é sobre a não aceitação da perda e a dor da ausência. Como a melodicamente mais simples, mas também a de caráter emocional mais profundo, a faixa, além de ter uma estrutura que se assemelha a canções como I Remember You, do Skid Row, e Remember It’s Me, do Gotthard, entra na lista de baladas de Different Worlds ao lado de Losing The Track e Writing On The Wall.


A guitarra vem aguda e cuja solidão é rompida por explosões pontuais entre bateria e uma guitarra solo áspera. Tal cenário, mesmo que ainda embrionário, retira o ouvinte da mistura dramático-melancólico-nostálgica instaurada em Just When I Needed You. Eclodindo em uma segunda etapa introdutória cativante, com direito ao hammond trazendo psicodelia ácida em meio à base hard rock, Need To Fall vai proporcionando pequenos goles de excitação ao espectador. Fluindo para um primeiro verso mais minimalista em poder sonoro, a canção vai ganhando ares leves quase transcendentais enquanto as guitarras jogam texturas que levantam a energia melódica de maneira a obter a devida atenção até a chegada do pré-refrão melódico e contagiante. Com fundo romântico, Need To Fall é uma canção tanto sobre a vida quanto ser forte para seguir o destino que é detentora de um solo encantadoramente simples. Tal como Show Me The Way, Need To Fall tem potencial para ser inserida no time de singles lado b de Different Wolrds.


Em clima de suspense de deixar a pupila dilatada e ao pelos eriçados ao serem apossados pela adrenalina da atenção, a guitarra base surge quase como em efeito fade in. Acompanhada pelo primeiro plano protagonizado pela tênue valsa da guitarra solo, ela se mantêm na base rítmica. Consciente. Atenta. Racional. Linear. Com um golpe certeiro e preciso, a bateria forma uma fresta na rocha que deixa fluir uma melodia repleta de torpor entregue pelo teclado, mas cujo alicerce é swingado e cativante. É então que Zonta vai inserindo o conteúdo lírico, uma temática sócio-analítica que vende a ideia de ser a mais questionadora e atual do álbum. Afinal, em meio ao puro hard rock, a música questiona a falta de empatia e o enfraquecimento do amor como estrutura social. Discutindo inclusive sobre o conceito de igualdade, Stop The World é uma canção de mensagem reflexiva e válida para os tempos atuais em que guerras acontecem simultaneamente em diversas partes do mundo, políticos rompem o caminho rumo ao progresso social e o progresso econômico é posto sempre antes do bem-estar comunitário. Um inquestionável, poderoso, reflexivo, melódico e swingado single de Different Wolrds.


Seguindo a base rítmica de Stop The World, Hearts Of Stone vem com uma base hard rock e com grande influência psicodélica vinda do hammond ao mesmo tempo em que é possível de perceber forte influência do Kansas na sonoridade. A energia é altiva, excitante e contagiante. De estrutura provocante, existem trechos impregnados de um embriagar quase melancólico que preenchem tanto o pré-refrão quanto o refrão. Uma coisa que chama atenção em Hearts Of Stone é a força precisa e potente do baixo na base rítmica, o qual por muitas vezes consegue romper as sensações de embriagante torpor.


Perigosa, provocante e sexy. Don’t Break My Heart é amanhecida por uma guitarra distorcida, áspera e que encarna muito da essência do hard rock oitentista. Golpes sequenciais no surdo vão promovendo uma excitação espontânea, uma expectativa crescente que é saciada quando a melodia é surpreendida por um grito bem sustentado por Zonta. Para introduzir o primeiro verso, a guitarra dá uma grande abaixada na explosão e assume um caráter introspectivo de maneira a quase promover uma tensão sustentada pelo suspense sombrio. Ganhando contornos bluesados com uma levada em cadência 4x4, Don’t Break My Heart é uma canção majoritariamente explosiva sobre a busca pelo paraíso, pela paz e com um eu-lírico que almeja o fortalecimento interior.


Não é fácil entrar no mercado do entretenimento musical e muito menos conseguir, já com um primeiro material, trazer um conteúdo lírico-melódico consistente e que contagie as massas. Contudo, tal feito foi conquistado pelo Skills em Different Worlds, um álbum hard rock psicodélico repleto de baladas e canções explosivamente swingadas.


Apesar do título não apresentar tanto acordo com os temas líricos, ele remete aos diferentes campos do rock experienciados entre as 11 faixas. Afinal, além do hard rock, do rock progressivo e do rock psicodélico, o disco também é agraciado pela estrutura padrão do blues. Contudo, a nomeação ‘different worlds’ casa perfeitamente com os integrantes do supergrupo.


No âmbito territorial, Skills tem em sua formação Zonta, o mais jovem do quarteto, que vem do Brasil após uma temporada no reality show The Voice Brasil. Além dele, o grupo conta com Del Vecchio, que vem da Itália. Já no que tange a questão musical, o supergrupo traz Huff, baterista com grande bagagem no terreno do rock cristão, tendo sido o baterista original do White Heart.


Essa união de diferentes ingredientes e essências é o que torna Skills uma banda diferenciada. Afinal, existe o tropicalismo e o ensolarado de Zonta, a sensibilidade de Huff e a consistência de Del Vecchio. 


O line up é completado por Sheehan, cujo extenso currículo lhe agrega coerência e sabedoria em subgêneros como hard rock, rock progressivo e rock psicodélico graças às suas passagens por bandas como Mr. Big, The Winery Dogs e Sons Of Apollo, e por Gillis, que foi o substituto do lendário Randy Rhoads no álbum ao vivo Speak Of The Devil, de Ozzy Osbourne.


É assim que Different Worlds soa fresco, leve, cativante e original. É fato que traz bastante da leveza californiana, mas seu flerte com o progressivo e o psicodélico lhe confere um grande diferencial perante as bandas jovens de hard rock da região. Apesar disso, o timbre de Zonta é o mais padrão e comum de ser encontrado no subgênero.


Se apoiando na técnica do drive, Zonta possui um timbre agudo muito semelhante ao de cantores como Bon Jovi, Nic Maeder, Steve Lee, Sebastian Bach, Marc LaBelle e até mesmo Joel O'Keeffe, mas ainda carece de consistência. Apesar disso, o recifense não deixa de exalar vontade de crescer e se desenvolver ainda mais na arte do canto.


Com produção assinada também por Del Vecchio, Different Worlds acaba trazendo um resultado cuja sonoridade não foge à estrutura melódica de Sunstorm, banda com a qual também atua. Ainda assim, o disco consegue imprimir muito da experiência dos músicos, tendo como pontos fortes indiscutíveis a potência e precisão do baixo e a acidez do teclado.


Lançado em 13 de maio de 2022 via Frontiers Records, Different Worlds é um álbum que visa atualizar a família hard rock global. Mesmo sendo um movimento já trilhado por nomes como Land Of Gypsies, Dirty Honey e Sunroad, o Skills certamente mostra grande competência para produzir materiais populares sem perder o peso, o swing e a consistência. E Different Worlds é a prova disso.

Compartilhe:

Cadastre-se e recebe as novidades!

* campo obrigatório
Seja o primeiro a comentar
Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.