NOTA DO CRÍTICO
A banda é do sul, região consagrada por receber a primeira franquia do Hard Rock Café. Coincidência ou não, o ritmo que ela explora é o rock e suas variantes. Lançada no mercado com o EP No More Fear, em 2020, agora a Evil Politicians anuncia seu primeiro álbum, o intitulado Indignation Army.
É como se estivesse em um filme sci-fi. Como se o ouvinte pudesse se ver em uma cidade dominada pela noite, pelas máquinas, e pela fumaça. Um suspense amplamente sedutor cuja estética sonora remete àquela exalada pelo Disturbed. Como um grito calado, vem o silêncio. Um silêncio inusitado que logo é quebrado com um punch metalizado, grave e ruidoso. Sua velocidade transitando entre o médio e o acelerado cria uma cadência rítmica inconstante e cheia de groove. A agressividade aqui não assume postura ensurdecedora ou mimada. Assume, sim, um tom de rebeldia, de revolução. Quando Bruno Martins assume o microfone com seu timbre limpo e afinado, uma interessante mescla de doçura e revolta é pincelada em Burnout. Porém, conforme a melodia vai sendo tomada por um desespero desenfreado, essa doçura some como um sopro e dá passagem para um vocal gutural calcado no screamo e com toques de drive. No conjunto, muito se enxerga do Alter Bridge como influência na construção das linhas instrumentais da faixa, tendo uma inclinação para a roupagem construída no álbum Fortress, em especial no que tange o single Peace Is Broken.
O som está longe, abafado. Mas logo assume, com efeito fade in, uma crescente nitidez e volume. A dupla de guitarras formada por Martins e Leandro dos Santos cria um baile de aspereza e melodia. Brutalidade e veludo. Raiva e consciência. Quando ocorre a união sonora entre todos os elementos, o que acontece é um vislumbrar de influências. A forma e o tom em que o vocal se apresenta, além da cadência rítmica formulada no refrão, remetem ao Disturbed. Já a aspereza de uma das guitarras traz traços claros do Avenged Sevenfold. Por outro lado, a dinâmica entre Martins e Santos é como Mark Tremonti e Myles Kennedy. Afinal, enquanto um traz riffs que se inclinam para o lado thrash, o outro traz linhas mais melódicas, mas, diferente de Kennedy, não pendem para o blues. Saindo da questão melódica propriamente dita, Your Truth, Not Mine é uma canção cujo lirismo forte e enfático critica veementemente o extremismo político e a utilização de fake news para montar um clã de seguidores.
Rudez, brutalidade e velocidade. O que o ouvinte vivencia em Prometheus é um mergulho insano no campo do death metal. Rápida, áspera e transpirando raiva, a melodia da canção serve como roupagem para um conteúdo lírico que funciona como continuação daquele construído em Your Trut, Not Mine. Afinal, aqui o eu-lírico clama por ajuda, por auxílio para encontrar a verdade sobre as coisas. Em cada pedido feito, o personagem transmite desamparo, desesperança e angústia. Encontrar explicações acalentaria seu desespero, mas ainda lhe faltaria a interpretação das mesmas. Essa é a dicotomia existencial do protagonista de Prometheus.
Neblina. A fumaça vai se dissipando enquanto paredes rochosas surgem à frente. É um cenário que mistura breu com frestas de luz. Musicalmente isso é expresso a partir de um groove áspero, compassado e imerso na roupagem do stoner. Aqui, apesar de a bateria de Lucas Lorenzetti ter grande participação, não é ela quem dita as regras. O responsável por isso é o baixo de Lucas Marrero que, com seu riff asperamente grave, é também aquele que imputa o caráter stoner à canção. Dramática, quando Prior Crime atinge o primeiro verso ela assume uma caracterização rítmica cuja estrutura pende para um rap rock sincopado que traz um vocal cuja cadência do canto e o estilo de pronúncia muito se assemelham àquele de James Hetfield. É fato que a faixa segue com o poderio já tão característico do Evil Politicians, mas, em comparação às outras faixas de Indignation Army, ela agressividade que a acompanha não é tão extrema e voraz.
É curioso, pois ao mesmo tempo que a introdução se assemelha à estética de Wake, faixa de abertura de Minutes to Midnight, álbum do Linkin Park, ela recria a paisagem exotérica já tão característica da sonoridade do Greta Van Fleet. É verdade, porém, que a base do som é mais dramática, sombria, o que cria certa expectativa desafiadora no ouvinte. Ember é um instrumental unilateral e minimalista de característica puramente dramática que serve como uma pausa da selvageria e oferece voz à reflexão enrijecida.
Segundos após o último sopro de uma calmaria passageira, a agressão, a brutalidade e o áspero voltam a assumir seus postos retomando o peso iniciado em Burnout. Entre os ingredientes já perceptíveis estão o metal, o death metal, traços de thrash e singelos vestígios de hard rock. Essa soma faz com que a faixa-título seja rápida, groovada e altamente enérgica, com direito a pedal duplo, diferentes vocais e divisões bem definidas. É possível, inclusive, notar pequenas, mas perceptíveis influências da sonoridade criada em One Day Remains, álbum de estreia do Alter Bridge, na conjuntura total da presente música.
Começando direto no refrão, Signs Of Evil, Pt.1 já oferece rapidez e energia ao ouvinte. Nela, é facilmente possível notar melodia e harmonia através das paredes do peso sonoro criado a partir da sincronia entre guitarras e bateria, uma paisagem que serve como roupagem para um lirismo que narra um cenário apocalíptico, quase como um mundo zumbi, por contar a história de um personagem em busca do medo e do sofrimento. Metaforicamente, o que o quarteto paranaense descreve é o cenário caótico de dor, luto, medo e sofrimento vivido pelas pessoas durante a pandemia.
Metalizada e groovada. Essas são definições que melhor descrevem a introdução. Cheia de guitarras com sobe e desce de escalas, pedal sequencial, riffs ásperos e graves e uma cadência mais lenta do que a de costume, A New Kind of Horizon, assim como Prior Crime, consegue criar uma roupagem de peso, mas ao mesmo tempo atraente e acessível aos ouvidos de maneira geral. Aqui, existe um ponto interessante. O solo, combinando as expertises dos dois guitarristas, possui, a partir da afinação das notas, uma influência estética com os solares de canções do Avenged Sevenfold, os quais misturam elementos do power metal e do hard rock. Esses detalhes fazem da presente música um potente single de Indignation Army.
Riffs graves e rasgados. Repiques rápidos e auxílio de pedal duplo. Explosões dos pratos que funcionam como chuvas ácidas. A única subdivisão presente divide cenários puramente explosivos de outros em que o suspense é o fator reinante. É justamente quando entra esse detalhe que Your Nightmare segura as mãos de Aerials, single do System Of A Down, afinal, os versos possuem roupagens semelhantes.
Melancólica, Pisces é uma música que, indiscutivelmente, possui os versos de ar definidos pelo sentido mais estrito da palavra melodia. Porém, na passagem para o refrão, vem o punch e a pancadaria. Mesmo assim, da mesma forma como fez Ember, Pisces tem como máxima o torpor, o inebriante e a imersão absoluta em uma roupagem que, com exceção do primeiro instrumental, não foi experimentada com profundidade em Indignation Army.
No More Fear inicia uma série de três canções retiradas do primeiro EP do Evil Politicians. Com melodia amplificada e repaginada, a primeira faixa da trinca se mostra ainda mais potente que a original e, assim como aconteceu no início do presente disco, deixa clara a influência que o Disturbed exerceu na construção da sonoridade do grupo.
Enquanto No More Fear exala Disturbed, The 3rd War exala Avenged Sevenfold. Afinal, as guitarras se dividem entre riffs agudos e graves, o que acaba por, como mencionado em A New Kind of Horizon, criar uma estética mista entre power metal e hard rock. No entanto, a base rítmica possui como guia o metal e o seu peso característico.
Dramática, Dreams Can Be apresenta um Bruno Martins com vocal mais interno e grave, se assemelhando com aquele entoado por Eduardo Parras no Armored Dawn. Na métrica 4x4 e com trechos de singelo parentesco com a sonoridade de All Those Wasted Years, single de Pink Cream 69, a canção possui um lirismo que engana pela carapaça de música romântica. Afinal, o que ela traz é uma letra-analítica sobre autoaceitação, insegurança e desproteção. É verdade que a faixa é uma espécie de self-remix, mas ela possui a estética mais melódica dentre todas as faixas originais do álbum.
Indignation Army é indiscutivelmente um disco que sintetiza a sonoridade de três bandas: Alter Bridge, Avenged Sevenfold e Disturbed são ingredientes notáveis dentro do caldeirão que é o disco mais recente do Evil Politicians. E o mérito está justamente nesse quesito, na capacidade de o quarteto incorporar essas três influências na criação de um som próprio.
Afinal, não há apenas metal, heavy metal e hard rock. O disco traz ainda o stoner, o power metal e o death metal. Isso no que diz respeito à melodia, pois no âmbito vocal, Bruno Martins possui um timbre que se pronuncia com a técnica belting, a mesma entoada por Myles Kennedy. Mas ao mesmo tempo, Martins tem o toque rasgado e gutural que são muito usados por ele a partir do screamo, outra técnica que divide espaço com a belting entre as canções de Indignation Army.
Com todas as canções proferidas em um idioma ingês bem pronunciado, o disco surpreende também pela equalização e nitidez da conjuntura instrumental. Afinal, não há chiado ou momentos em que o volume está desarmonioso. Esse é mérito de Vitor Gorga, quem também foi responsável pela produção do disco.
Lançado em 11 de junho de 2021 de maneira independente, Indignation Army é um disco bem lapidado, enérgico, excitante e bruto. Um mergulho profundo em questões políticas e sociais a partir dos olhares de diversas vertentes do rock.