Billy Brandão - O Bicho Tá Pegando

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Faz parte da trajetória de músicas querer enveredar em carreiras solos. A exemplo dessa realidade estão nomes consagrados como Slash, Mark Morton e Mark Tremonti. No âmbito nacional, empreitada também foi assumida por Martin Mendonça, Fernando Deluqui e Alex Meister. Agora chegou a vez de Billy Brandão entrar para esse time, afinal, o guitarrista acaba de lançar O Bicho Tá Pegando, seu primeiro disco solo.


Aqui não há swing porque o som é brasileiro. Os repiques da bateria de Eduardo Lyra servem como condução inicial para um ritmo gingado com imersões na atmosfera funk. Com a entrada de instrumentos como trompete, trombone e sax tenor por Diogo Gomes, Marlon Sette e Zé Carlos “Bigorna”, respectivamente, Acesso ao Camarim ganha uma elevação harmônica notável que explode em um ambiente jazz que remonta a estrutura de Whiplash, faixa de Hank Levy. Cheia de groove empregado pelo baixo de Alexandre “Katatau” e com um timbre de guitarra que muito recria as ambiências de canções do Barão Vermelho e Frejat por conter influências também no blues. Com clima de jam session, Acesso ao Camarim é uma perfeita fusão rítmica entre os gêneros estadunidenses.


O requebrado da faixa anterior segue afiado em Par ou Ímpar. Afinal, o riff da guitarra de Brandão prossegue com uma imersão no funk de maneira a absorver as influências de nomes como Jimi Hendrix, James Brown e até mesmo Tom Morello. E os sopros continuam bailando na atmosfera empregando uma maciez swingada contagiante. Aqui, porém, além do jazz e do funk, existe pitadas de uma sensualidade praiana resultado da migração do hard rock para a região da Califórnia, onde foram inseridos nesse subgênero do rock pitadas de frescor e veludo. De ritmo mais acelerado que em Acesso ao Camarim, Par ou Impar tem um trecho melódico calcado em um duelo entre riff e groove, guitarra e baixo.


Cadência e groove são ingredientes que moldam perfeitamente o despertar de Pé de Chumbo, uma música que tem sua melodia puxada pela base rítmica, ou seja, baixo e bateria. Com sobressalto debochado do sax tenor, a canção acaba tendo o trombone e o trompete assumindo a camada intermediária da base e do solo ampliando a harmonia. Passado o refrão, o ouvinte se surpreende ao notar que Pé de Chumbo tropeça e fica caída sobre o terreno do samba ao estilo Carmen Miranda de maneira a extravasar um ar tropical graças aos elementos percussivos.


Uma descida de escalas no baixo dá passagem para uma sinfonia de sopros nostálgica, mas ao mesmo tempo macia e reconfortante. Baseado no blues, o ritmo de Se Ela Quiser possui um teor romântico e encantadoramente aconchegante. Não há discórdia em afirmar que a presente faixa possui a caracterização de um forte single de O Bicho Tá Pegando. Com direito a um solo de trompete galanteador, a canção propõe um enredo de conquista, de atração e de química. É como o encontro do amor entre duas pessoas belamente sonorizado.


Com sons ambientes e uma repentina rebeldia da guitarra que faz com que o ouvinte recrie mentalmente a introdução de Highway Tune, single do Greta Van Fleet, Bends And Friends é um interlúdio que divide O Bicho Tá Pegando em duas metades. Daqui para frente, restam outras cinco viagens com tickets comprados pelo espectador.


A primeira delas já denota inovação. Afinal, enquanto elementos percussivos dão uma cadência singular, é um som eletrônico que surpreende e convida o ouvinte para caminhar por entre o terreno da faixa-título. Eis então que o chimbal surge com uma contagem de tempo acelerada e lançando adrenalina no sangue do espectador. Quando se pensava que a canção teria base no maracatu, a bateria executa um rápido repique e inicia uma levada jazz acelerada enquanto a guitarra sobressai por entre solos distorcidos e com toques de malandragem. Aqui, Brandão definitivamente não consegue esconder sua afinidade e, pode-se dizer, um gosto diferenciado pelo hard rock.


É interessante como apenas a partir dos primeiros sonares, Mnemônica traga em sua essência um blend entre Jota Quest e Tim Maia. Afinal, assim como também fez o Red Hot Chilli Peppers, a canção traz uma fusão de funk rock. Mas não só isso. Existe na melodia uma pincelada de pimenta proporcionada pelo soul e pelo R&B. Com batida da bateria bastante cadenciada, Mnemônica é a sonorização ao nível de dicionário no que se refere ao atributo ‘swing’.


O baixo de groove saliente e sensual é ouvido ao fundo enquanto a percussão vai se revelando. Eis então que a guitarra emite um som macio e hipnotizante que parece sobrevoar a atmosfera como um personagem onipresente na estrutura melódica de Silente. Com malemolência e um ar tropical encantador, a canção ainda traz um uníssono e debochado solo grave de sopros que é acompanhado por uma base rítmica no mínimo familiar. Ela muito faz lembrar à também base melódica da The Pink Panther Theme, faixa do compositor estadunidense Henry Mancini. Sedutora e com imersão no campo do jazz, Silente é outra forte candidata de single de O Bicho Tá Pegando. Até porque, existe uma maciez extra empregada pelo pedal steel introduzido por Guilherme Schwab.


Uma desafinação proposital surpreende o ouvinte no despertar de Invisível Costura. De energia melancólica, a canção traz como item sonoro o vibrar da esteira da caixa da bateria a partir do estímulo do riff da guitarra. Esse elemento, inclusive, faz com que o ouvinte se veja a frente de um tear.  Assim que a melodia evolui, contornos macios vão se formando ao passo que influências na música árabe também podem ser notadas a partir da forma como Brandão executa os riffs da guitarra.


Não existe areia branca, mar de um azul-turquesa ou uma praia rodeada de coqueiros carregados de cocos. Apesar de ter uma cadência suave, a releitura feita por Brandão de She’s Leaving Home, single dos Beatles, possui notas ásperas sobrevoando a maciez melódica. Ao mesmo tempo, porém, ela consegue ser mais emocional do que a versão original e garante ao ouvinte o tema da próxima dança de casal, afinal, sua harmonia evolui para uma estrutura encantadoramente romantizada. 


Como despertar de uma empreitada solo, O Bicho Tá Pegando mostra muito do potencial de composição, de elaboração de melodia por parte de Billy Brandão. Com capacidade de unir funk, jazz, samba, blues, hard rock, soul e R&B em uma mesma estrutura de forma harmônica.


Desenvolto e com um time competente de músicos ao seu lado, Brandão criou texturas e uniu elementos na criação de um produto unicamente instrumental que oferece diversas viagens tanto sensoriais quanto territoriais ao ouvinte. Afinal, o desenrolar de cada uma das 10 composições leva o espectador do Brasil aos Estados Unidos, dos Estados Unidos à Inglaterra e da Inglaterra à Arábia Saudita.


Esse ambiente cosmopolita e com grande admiração pelos anos 70 teve grande lapidação e trabalho minucioso por parte da gravação conjunta entre Renato Muñoz, Rodrigo Lopes, Rodrigo Duarte e Jr. Tostoi. Essa cooperação captou, inclusive, a química existente entre todos os músicos participantes de O Bicho Tá Pegando.


Do ponto de vista visual, o que chama a atenção é a foto empregada na arte de capa. Trazendo dois cachorros se atracando, ela emana o sentido literal do título ‘O Bicho Tá Pegando’. De outro ângulo, funciona até como uma dupla provocação para que o ouvinte se sinta instigado a conferir o que o disco pode oferecer.


Lançado em 03 de setembro de 2021 de maneira independente, O Bicho Tá Pegando é um instrumental amplo em texturas, cheio de swing e malandragem e com notas de classicismo. Um trabalho que mostra muito da proficiência musical do guitarrista batizado Alexandre Augusto Brandão.

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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.