Varandão - Isso Não É Uma Simulação

NOTA DO CRÍTICO
Nota do Público 5 (1 Votos)

Três anos após o lançamento de seu EP de estreia e quatro anos após sua concepção, o coletivo fluminense Varandão decidiu juntar singles anteriormente divulgados com uma faixa inédita na ebulição de Isso Não É Uma Simulação, seu segundo Extended Play e material mais recente.


A forma como a guitarra de Dan se movimenta, com sua silhueta swingada, traz frescor e uma contagiante mistura de pop e reggaeton. Dando base para o vocal de timbre agudo-metálico vindo de Guerra, ela imputa uma suavidade à cadência rappeada do lirismo. Trazendo uma ambiência praiana e repleta de uma brisa refrescante de fim de tarde, Pedra Do Sal ainda mistura o trap em meio aos versos ainda mais cadenciados comandados pela voz aveludada de Coutinho. Folgada, mole e cativante, a canção também é marcada pelo bojudo groove do baixo de Maneko que, além de dar corpo, imputa uma sensualidade extra nessa que é uma faixa jovial que traz um personagem em busca do rumo da vida, da sensação de pertencimento como artifício para fugir da solidão, da manutenção da essência mesmo perante o julgamento de terceiros. Pedra Do Sal, pincelada por subgraves e com uma ponte proclamada pela voz grave de Cof, é quase como uma metáfora tanto à fonte da juventude quanto à pedra filosofal. É o objeto que garante a ingenuidade e a pureza, características que dicotomizam com uma sociedade vazia e fria com foco no lucro.


Com um arranjo macio e aveludado que flerta com a sonoridade do Fender Rhodes, o novo amanhecer é calcado em um trap de energia melancólica mesmo com a cadência lírica acelerada no mesmo compasso da bateria de Alek. O instrumento, por sinal, consegue sonorizar bem o sofrimento e a feição cabisbaixa do personagem da canção. Aladim ainda consegue prevalecer a maciez da pronúncia do trio de cantores ao mesmo tempo em que relata tentativas de fugir da realidade, dos problemas. Misturando ares de irresponsabilidade, Aladim tem como ponto central um personagem que, por meio de suas atitudes impulsivas e dominadoras, esconde a verdade da necessidade do afeto como algo a dar vasão a toda e qualquer tipo de emoção represada por esse que, visivelmente, teve que aprender precocemente a se virar sozinho.


Falsetes voam como uma brisa pelo ambiente formando uma silhueta sincrônica com o rebolar da guitarra. Retomando parte da sensualidade presente em Pedra Do Sal, a canção é repleta de um swing romanceado e aconchegante ao mesmo tempo em que traz um lirismo nostálgico. Bye é balada amaciada construída sobre uma base 4x4 que contagia o ouvinte com seu enredo de entrega, de amor. De carinho. Curiosamente funcionando como a solução para o comportamento do personagem de Aladim, Bye apresenta um eu-lírico disposto a aprender a amar e a se entregar na relação.


Uma guitarra distorcida remete ao som indie rock ácido do Arctic Monkeys. Com uma atmosfera funkeada, o chimbal da bateria faz uma espécie de contagem regressiva até que a canção imerja em um ritmo preciso e grave engolido por um groove marcante que remete àquele executado pelo Dirty Honey em suas canções folk-hard rocks. Com um uníssono irresistível entre guitarra-baixo-bateria, o ouvinte é embebido por uma atmosfera que remonta, inclusive, as estéticas melódicas de nomes consagrados do rap nacional como Gabriel O Pensador e Marcelo D2. Com tal funk metalizado, Jimi é uma canção que acompanha seu personagem lírico no caminho da conquista de seus objetivos, de sua ganância pelo futuro e de sua maturidade contrastante com aquela de seu círculo de convívio. “Só vai atrás de seu ganho, nego”, sugere a própria canção.


Suave, swingada e fresca. Assim como Pedra Do Sal, a presente canção traz um amanhecer ameno, contagiante em sua maciez e ritmo lírico bem cadenciado. Com uma sensualidade melódica típica do R&B misturada com reggae, Chegando Agora é novamente a representação da relação com o tempo, da jovialidade e, também, da manutenção da essência. Com enredo penetrante pela sua leveza descompromissada, Chegando Agora é como o retorno ao lar depois de um tempo distante. Um retorno que possibilita reviver antigos amores e rever antigas companhias.


Unir swing, maciez, subgraves e grooves. Esse é um dos importantes legados de Isso Não É Uma Simulação, um EP leve e contagiante que possui um aroma irresistivelmente jovial, praiano e descompromissado. Um trabalho que une descontração e desabafos. Melodias urbanas e populares.


Falando de amor, relacionamento, solidão, pertencimento, autovalorização e amor-próprio, o EP convida o ouvinte a se deixar levar pelo swing ao mesmo tempo em que a letra o direciona para uma espécie de autorreflexão. Impulsividade, intensidade e, principalmente, para um pensar sobre a relação com o tempo.


Unindo trap, pop, reggae, funk, R&B, rap e indie rock, Isso Não É Uma Simulação, em suas intercalações de cantores, evidencia uma grande influência com a estética lírico-harmônica construída pelo Hollywood Undead. Afinal, a mescla de timbres não apenas coopera para a aquisição de um ambiente mais melódico, mas também auxilia na conquista da empatia do público.


Eis então que entra a sabedoria de Raphael Dieguez. Com tal mixagem, o profissional conseguiu manter uma base rítmica sólida, clean e que ainda assim demonstrasse frescor e swing sem denegrir a imagem do grupo. Afinal, com seu auxílio, a melodia se tornou tão contagiante quanto sensual.


Já quando se fala de produção, Isso Não É Uma Simulação contou com Felipe Rodarte na produção. O profissional conseguiu manter a linha urbana com a qual o Varandão se identifica ao mesmo tempo em que fundiu características mais neutras e populares que suavizaram a rispidez sonora.


Fechando o escopo técnico, vem a arte de capa. Assinada entre _narcosis e Guerra, ela traz uma fotografia de parte da cabine de gravação. Tirada em velocidade baixa, a imagem traz sobreposições de objetos presentes no cenário em clima de penumbra. Apesar da simplicidade estética, a composição funciona como uma provocação/constatação de que o que está contido no EP não é simulação. É orgânico e é real.


Lançado em 16 de setembro de 2022 via Toca Discos, Isso Não É Uma Simulação traz a nova leva da música brasileira. Plural, moderna e urbana. Mas também macia, contagiante e atraente. O perfeito equilíbrio entre o mainstream e o marginal. É a oxigenação da música pela criatividade.













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1 Comentários

Molecada manda muito!

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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.