Sofia Oliver - Afeto

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A música sempre esteve presente e foi motivo de desejo em sua vida desde a fase mais tenra. Um dos primeiros ápices de sua vida aconteceu quando pôde, aos 18 anos, iniciar a vida profissional no meio musical. Porém, é agora, no fim de 2023, que Sofia Oliver deu um salto satisfatório: o lançamento de Afeto, seu EP de estreia.


É como estar em um ápice de felicidade e plenitude tomando um banho de chuva em uma tarde de verão. Macia, fresca, contagiante e com delicadas e adocicadas notas de nostalgia, a melodia introdutória proporciona uma mistura de descompromisso, leveza, saudade e um estado puro de êxtase. Na forma de um pop rock com flertes e inclinações tanto para o soft rock quanto a MPB, a sonoridade flui para um primeiro verso em que o protagonista é o violão de Ricardo Rodrigues com seu sutil swingar que rememora a melodia criada por Ashlee Simpson na introdução de Pieces Of Me. Ainda que o violão surja como instrumento propriamente dito, a voz de Sofia Oliver, com seu timbre aveludado, rouba a cena por conter generosas pitadas de afabilidade e refrescar, na mente do ouvinte, a característica vocal de Tati Porttella. Exalando uma tímida e despropositada sensualidade reggaera, Aquarela ainda oferece uma base ácida por meio da reprodução das teclas do hammond e uma sincronia amaciada proveniente da união entre o groove encorpado do baixo de Zé Henrique e a levada da bateria de Heitor Lima. É assim que Aquarela transborda sutileza e um clima amplamente ameno enquanto faz da praia, da areia, do mar e da estrada cenários de um romance nascido a partir de uma grande ajuda do destino. Com cheiro de adolescência e personalidade ainda imatura e ingênua, Aquarela é a narrativa daquele amor primeiro, que deixa a mão suar e o coração acelerar, mas também aquele tipo de amor que faz toda a dor do mundo desaparecer.


É como estar apoiado no batente da janela observando o adormecer do Sol no horizonte preenchido por uma energia bucólica. Entre o violão que segue com o mesmo delicado frescor criado em Aquarela, o chacoalhar singelo do caxixi amplifica a noção de conforto e delicadeza tal como um espreguiçar sentindo, vagarosamente, a textura do lençol roçando a pele recém despertada. É essa textura proporcionada pelo instrumento percussivo que incita a percepção de uma base xote, algo que se confirma na chegada do refrão com o tilintar do triângulo desenhando tal ritmo nordestino. Doce, simples e adoravelmente contagiante, o ápice de Bagunçar evidencia influências de Thiago Iorc e Maria Gadú no estilo de canto de Sofia e, inclusive, destacam a continuação do romantismo no enredo lírico. Continuando também com o aroma púbere da canção anterior, Bagunçar traz aquele amor com cara de verão, aquele despreocupado, leve, mas que também construiu uma paixão inquebrantável. É a descrição de como uma pessoa pode transfigurar o emocional do outro até que se sinta e se torne, também, parte frequente daquele ambiente emotivo.


Junto com o violão, a bateria eletrônica é quem, agora, desenha o compasso rítmico com uma singela mistura entre os campos do pop e do rap. Contagiante e com uma alegria presente, mas curiosamente inferior à das canções anteriores, Camisa é uma faixa que relata a realidade de uma relação não mais existente, mas cujos ímpetos de saudade libidinosa causam fraquezas que vencem qualquer tipo de controle e consciência. O mínimo ato para começar a reconstrução da vida emocional pode ser uma oportunidade para, muito mais que relembrar, reviver sensações e emoções que escancaram não apenas a insegurança, mas também a incerteza e uma brisa de dependência sentimental. 


Ele é um material rápido, é verdade, mas o que ele apresenta já basta para compreender, digerir e experimentar o que Sofia Oliver tem a oferecer. Representante da nova onda do pop brasileiro, a cantora ofertou, com Afeto, um enredo linear que conta uma história romântica e apaixonada. Uma história tão fresca, ingênua e imatura como a troca de olhares nos intervalos do ensino médio.


Cheio de frescor, abraçado por grandes doses de maciez, verbalizado por tímidos falsetes e uma delicadeza vocal quase transcendental, o EP tem gosto de férias, proporciona ao ouvinte sentir desde a brisa do mar à textura da areia úmida nos pés. Ou, ainda, o aroma bucólico em um anoitecer campineiro em que o Sol vai adormecendo atrás das silhuetas das árvores nativas.


Pode até ser que, com Afeto, Sofia Oliver tenha entrado no mesmo rol de nomes como Anavitória, Melim, Vitor Kley, Chimarruts e Lagum, mas a base transcendental e extrassensorialmente jovial que construiu no EP proporcionou, com a adesão de sua pronúncia macia e carinhosa, a fusão de gêneros que só causam a sensação de conforto. 


Do pop, houve caminhares pelo soft rock, pela MPB, pelo reggae, pelo xote e tímidas inserções do rap, as quais deram uma textura mais lúcida e pé-no-chão à paixão hipnótica dos lirismos. E graças a Rodrigues, todos os ritmos e todos os instrumentos puderam ser facilmente sentidos, degustados e apreciados a tal ponto que o ouvinte foi capaz de criar cenários imagético-sensoriais a partir das melodias propostas, indo da praia ao campo em frações de segundo.


Fechando o escopo técnico do EP vem a arte de capa. Assinada por Alice Guedes e Alex Bezerra, a obra, ao trazer a cantora semi-deitada rente a um plano de fundo praiano, traz as noções de frescor, despreocupação e leveza tão difundidas em ambas as canções, incluindo até mesmo a dependente-melancólica Camisa.


Lançado em 28 de novembro de 2023 de maneira independente, Afeto é um EP romântico e libidinosamente púbere que transpira ingenuidade, honestidade e pureza. Carinhoso e extremamente delicado, o material apresenta um nome que, certamente, ainda será muito ouvido pelos consumidores da nova leva da MPB. Afinal, Sofia Oliver provou saber unir delicadeza, contágio e a sensualidade jovem tanto trazida pelas novas composições do gênero.

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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.