EVEHIVE - PISA PISA

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Outro material chega no universo musical brasileiro nesse fim de terceiro trimestre. De autoria de EVEHIVE, PISA PISA, o terceiro EP do DJ e produtor musical natural de São Gonçalo (RJ), traz como ponto de foco a dualidade entre aquilo que é bruto e o que é delicado.


A textura ambiente se mistura entre o ácido e o sombrio. Curiosamente, os sons de sutil agudez que sobressaem fazem com que o ouvinte recicle em sua memória a estética adotada nas canções do Bonde do Tigrão. Curiosamente, porém, o sonar dos batuques traz uma essência ao mesmo tempo latina e africana com suas singelezas de afrobeat e axé. Bela Solta é uma faixa repetitiva, mas, de forma interessante, não se apoia no uso de subgraves, mesmo estando imersa no campo do pancadão. 


Despropositadamente ou não, o ritmo criado no novo horizonte surge com a mesma cadência daquela da canção anterior. Com a inserção de versos líricos repetitivos em que EVEHIVE pronuncia “vô socar”, uma frase homônima ao título da canção, e seu próprio nome, Vô Socar tem protagonismo do som oco do bumbo evidenciando a batida rítmica. Com subgraves criando uma curiosa textura estridente, a canção ainda tem curiosos sons tilintantes de grandes sinos permeando o raso contexto melódico. Ainda assim, é inegável a qualidade de Vô Socar no que tange o convite à dança. A canção tem um instrumental contagiante que sugere, quase instintivamente, que o ouvinte comece a dançar onde quer que esteja.


Entre o sonar de um tilintar quase estridente, a batida padrão do pancadão se inicia, dando passagem para um primeiro verso completo e verdadeiramente verbalizado. É assim que um timbre levemente grave e com raspas púberes se apresenta ao ouvinte. Afrente dele está EVEHIVE, que, sem demora, coloca sobre a mesa a história de Fazer Fumaça. Entre versos de uma interpretação lírica sensual e ejaculante, a cantora transforma a faixa, com auxílio do timbre grave de Zaila e o agridoce de PAMKA, em uma verdadeira orgia com base na arte do fumo da erva. Cheia de coloquialismos e no apoio sem exagero do subgrave, Fazer Fumaça é, indiscutivelmente, a faixa mais forte e comercialmente underground de PISA PISA.


Ele é curto e majoritariamente instrumental. Seu caminhar, apesar de sua estética, não convida o ouvinte a caminhar pelo chão dos bailes de favela. Afinal, PISA PISA tem um intuito diferente. Ele sai da zona de conforto da favela, mas ainda assim, não foge da origem do seu gênero-mãe do pancadão.


Entre texturas ácidas, estridentes e tilintantes, o que EVEHIVE propõe com o trabalho é o convite para a dança e um atordoante hipnotismo para a experimentação do psicodélico por meio de seus sonares ecoantes e esganiçados. Sem dúvida, porém, que não são as faixas instrumentais que ficarão grudadas na memória do ouvinte.


Apesar de Bela Solta, com seu sonar digitalizado proporcionando a mistura de ritmos afro-brasileiros, como o axé e o afrobeat, é Fazer Fumaça, com seu featuring duplo, que penetra facilmente na mente do ouvinte. Quase promovendo o chamado funk proibidão, a faixa, além de promover uma cultura comportamental marginalizada, escancara a realidade dos grandes centros, especialmente o Rio de Janeiro.


Com esses pontos em destaque, PISA PISA, sustentado pela engenharia de mixagem de DJ Bout, surtiu em um EP que misturou o latino com o africano. O carioca com o global. A partir dessa base de receita, o trabalho exalou desde o tradicional pancadão a gêneros como axé, afrobeat e o funk proibidão.


Fechando o escopo técnico, vem a arte de capa. Assinada por Tatá Barreto e Kakubo, ela traz EVEHIVE em evidência, mas sob contornos caricaturescos, quase como se tivessem sidos retirados de gibis. Evidenciando sua vestimenta e adornado por um fundo preto com traços vermelhos, ela traz a marginalidade, a cultura de rua e o urbano. Todos os ambientes por onde o EP transita livremente.


Lançado em 22 de setembro de 2023 via MAMBArec, PISA PISA é um EP que destaca o marginal e aquilo que é negado pela massa conservadora. Um trabalho que agrada às periferias, mas também os tolerantes. Um compilado de canções que vai além da fronteira da favela com sua necessidade de provação a partir do choque de realidade. É o bruto se sobressaindo perante o delicado.

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Sobre o crítico musical

Diego Pinheiro

Quase que despretensiosamente, começou a escrever críticas sobre músicas. 


Apaixonado e estudioso do Rock, transita pelos diversos gêneros musicais com muita versatilidade.


Requisitado por grandes gravadoras como Warner Music, Som Livre e Sony Music, Diego Pinheiro também iniciou carreira internacional escrevendo sobre bandas estrangeiras.